Síntese
Em complemento às mudanças apresentadas pela Resolução CVM 175, o Ofício-Circular n.° 1/2024/CVM/SIN trouxe novo entendimento, pelo qual se permitiu que classes de cotas destinadas ao público em geral excedessem o limite de 20% nas aplicações em ativos no exterior, sem a necessidade de utilização de um fundo ou veículo de investimento. Tal entendimento é favorável, uma vez que viabiliza o acesso aos investidores de varejo a novas oportunidades de investimento.
Comentário
A Instrução CVM n.° 555, de 17.12.2014 (ICVM 555/14), revogada pela nova Resolução CVM n.° 175, de 23.12.2022 (RCVM 175), tinha a exposição ao risco como fundamento para determinação do limite de concentração dos ativos aplicados no exterior, o qual era definido de acordo com o público-alvo ao que o fundo se destinava. Além disso, investidores qualificados (respeitados os requisitos dispostos no Art. 101, § 1° da ICVM 555) e investidores profissionais (respeitados os requisitos dispostos no Art. 101, I, b da ICVM 555) poderiam ultrapassar os limites de concentração indicados pela norma.
A RCVM 175, por sua vez, trouxe diversas inovações como, por exemplo, a possibilidade de as classes de cotas, destinadas aos investidores enquadrados como público em geral, extrapolarem os limites de concentração em ativos financeiros no exterior, de forma ilimitada, como já era permitido aos investidores profissionais e qualificados. Contudo, para que os limites possam ser ultrapassados, faz-se necessário o cumprimento de alguns requisitos, os quais estão previstos no Art. 43 do Anexo Normativo I da RCVM 175.
Sendo assim, a RCVM 175 não só aumentou as possibilidades de investimento dos investidores, bem como descaracterizou o investimento no exterior como um fator específico de risco, entendendo que tal exposição se adequa mais a uma modalidade de investimento. Para mais, vale ressaltar que o investimento no exterior foi objeto de ofícios-circulares, os quais abordaram temas como (i) a retirada do sufixo “Investimento no Exterior”; (ii) a responsabilidade do gestor no controle para extrapolação dos limites de concentração; e (iii) a possibilidade de exposição acima de 20% em ativos no exterior para classes destinadas a investidores de varejo – tema central do Ofício n.° 1/2024/CVM/SIN (Ofício 1/2024).
O Ofício 1/2024 teve como fundamento a Decisão do Colegiado da CVM sobre Pedido de Dispensa de Requisito Normativo, objeto do Processo CVM n.° 19957.008640/2023-91 (Pedido de Dispensa), ratificando os argumentos apresentados pela área técnica no Ofício Interno n.° 47/2024/CVM/SIN/GIFI (Ofício Interno).
Em síntese, foi observada, no Ofício Interno, a hipótese em que o veículo domiciliado no Brasil cumpra com todos os requisitos dispostos no referido Art. 43 da RCVM 175, incluindo aqueles destinados ao fundo ou veículo no exterior, o que, nas razões da área técnica, já atenderia aos fins visados pela regulação brasileira. Ou seja, a exigência de um veículo ou fundo domiciliado no exterior, a princípio, não apresentaria qualquer benefício ao investidor brasileiro; pelo contrário, poderia encarecer a estrutura de investimento.
Visando evitar custos adicionais às estruturas de investimento, o Ofício 1/2024 trouxe não só esclarecimentos, mas um novo entendimento acerca da viabilidade na aplicação em ativos financeiros no exterior para investidores em geral. O entendimento apresentado pela Superintendência de Supervisão Investidores Institucionais (SIN) é baseado em dois elementos fundamentais, quais sejam:
- O afastamento da interpretação literal disposta no § 2° do Art. 43 da RCVM 175, de modo que a classe de cotas destinada ao público em geral não se limite à realização de aplicações no exterior somente por meio de um fundo ou veículo de investimento; e
- A possibilidade de a classe de cotas, destinada ao público em geral, investir diretamente em ativos no exterior, excedendo o limite de 20%, observado que tais ativos no exterior sejam, obrigatoriamente, ações ou possuam o mesmo risco e liquidez dos ativos permitidos para a referida classe, atendendo, ainda, todos os incisos constantes dos §§ 1° e 2° do Art. 43.
Assim, depreende-se do Ofício 1/2024 uma atuação proativa do Regulador, na medida em que as normas são adaptadas às situações fáticas que envolvem os regulados e demais entes participantes do mercado, sem, contudo, perder o objetivo principal de proteger os investidores, garantir o bom funcionamento do mercado e ampliar as possibilidades de investimento na indústria de fundos.