Exploração parasitária dos ativos empresariais

O chamado "lucro de intervenção" é aquele auferido pela empresa parasita e, nos termos da legislação, deve ser restituído à empresa vitimada.

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Que o direito veda o enriquecimento ilícito já se sabe. O que muitos não sabem – embora já não seja mais novidade – é que a utilização desautorizada da imagem de pessoas, ainda que indiretamente, para obtenção de lucros é também entendida como enriquecimento ilícito e, por isso, sujeita à restituição. 

A isso dá-se o nome técnico de “lucro de intervenção” (ou da intervenção, a depender da referência utilizada) e pode ser demandado por aquele que se sente prejudicado pelo uso indevido, ou até parasitário, da sua imagem por terceiro não autorizado. Nesse caso, é dado àquele que se sente prejudicado obter a “restituição” do lucro auferido pela exploração da sua imagem. Tecnicamente, não se está a tratar de uma indenização, mas justamente do redirecionamento do lucro que foi, por via ilícita, obtido.  

O Superior Tribunal de Justiça validou essa tese em caso envolvendo a atriz Giovanna Antonelli, que teve sua imagem associada, sem autorização, a medicamentos para emagrecimento. Nessa oportunidade, o STJ estabeleceu a necessidade de que se apurassem os lucros das empresas beneficiadas no período de utilização da imagem para que, após, esse fosse redirecionado à atriz. O intuito é, justamente, de afastar o enriquecimento obtido pelo terceiro às custas de direito alheio. 

O mesmo instituto aplica-se também às pessoas jurídicas, que se deparam com empresas parasitárias apropriando-se de sua marca ou nome para criar engajamento, se autopromover e criar clientela às custas da já estabelecida pela empresa explorada. Na medida em que esses se tratam de ativos valiosos para seus titulares, se mostram igualmente valiosos para aqueles que encontram brechas ilegítimas para vincular-se a esses ativos – especialmente na sociedade do espetáculo, em que cada clique possui um valor agregado. 

Até por isso, diga-se de passagem, atualmente se estuda a possibilidade (e necessidade, inclusive) de que as empresas tenham seus nomes e marcas protegidos dos famigerados clickbaits – manchetes/links anzóis, criados para despertar a curiosidade do leitor, ainda que a marca/nome utilizados não tenham relação com a publicação. 

O fundamento protetivo das empresas é o mesmo adotado para as pessoas físicas: não é dado a terceiros, sem autorização, a exploração de direitos alheios. Da mesma forma, os lucros auferidos pela exploração indevida afiguram-se como enriquecimento indevido. 

Em casos como tais, as empresas encontram proteção na Lei de Propriedade Intelectual (Lei 9.279/99), especificamente nos artigos 208 e 210. 

No primeiro, estabelece-se que aquele que tiver sua propriedade intelectual – dentre a qual, a marca – explorada indevidamente, tem direito a ser indenizado pelos benefícios que teria auferido caso a violação não tivesse ocorrido. A respeito, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu que “a legislação pressupõe que o uso indevido de marca gera enriquecimento sem causa por intervenção. Gera, portanto, lucro de intervenção” (REsp 1810860).

No segundo, estão estabelecidos os critérios dessa indenização. Em que pese chamado de lucros cessantes, o art. 210 estabelece que a indenização em favor da empresa explorada se paute nos “benefícios que foram auferidos pelo autor da violação do direito” de marca ou, alternativamente, nos “benefícios que o prejudicado teria auferido se a violação não tivesse ocorrido” e, ainda, na “remuneração que o autor da violação teria pago ao titular do direito violado pela concessão de uma licença que lhe permitisse legalmente explorar o bem”.

Os critérios adotados pela legislação mostram-se em consonância com aquilo que a teoria do lucro da intervenção pretende proteger: o direito da pessoa (física ou jurídica) em explorar, de modo exclusivo, os seus próprios atributos. Aqueles que têm por objetivo enriquecer-se às custas das criações de outros são e continuarão sendo responsabilizados. 

Aqui, importa uma última nota: o reconhecimento do enriquecimento ilícito e do lucro da intervenção não mitiga o direito indenizatório do ofendido. É possível cumular o pedido de indenização com o de restituição dos lucros, embora esse último, sim, possa ser limitado apenas ao valor que exceder à indenização obtida. Aqui, a ideia de parte da jurisprudência é que o valor a ser auferido pelo ofendido, quando somadas a indenização e a restituição, corresponda ao lucro, por sua vez, obtido pelo violador. O entendimento, claro, deixa de lado o caráter punitivo e mesmo reparador da indenização – sendo essa uma discussão para outro momento.  

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