Limitação da responsabilidade da indústria hoteleira em caso de atraso de obra

O STJ enfrentou recentemente a questão da responsabilidade da rede hoteleira pelo atraso na construção de empreendimentos que incluem "apart-hotéis"

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Síntese

A indústria hoteleira é foco de investimento imobiliário de particulares, que adquirem unidades imobiliárias, administradas pelos hotéis, para locação a terceiros. Na maior parte das vezes, as compras de tais unidades acontece na planta e a rede hoteleira participa da contratação. E quando a entrega do imóvel atrasa? A rede hoteleira pode ser obrigada a indenizar o particular? O STJ diz que não.

Comentário

Há anos, a indústria hoteleira deixou de estar voltada apenas à prestação de serviços e passou a ser, também, foco de investimentos por particulares, que buscam por rendas passivas decorrentes da aquisição de imóveis dentro da rede hoteleira. É o caso dos “apart-hotéis” ou “condo-hotéis”, unidades imobiliárias adquiridas por particulares dentro de hotéis, por eles administradas, e cujos lucros decorrentes são divididos entre o particular – dono da unidade – e a administradora do hotel – rede hoteleira. 

Nesses casos, a relação jurídica e comercial é composta por diversos atores: o adquirente da unidade, a rede hoteleira (que participa como administradora do imóvel após sua construção) e, nas vendas que ocorrem na planta, a construtora/incorporadora do empreendimento. A questão que ganhou notoriedade nos últimos tempos se dava quanto aos limites da responsabilidade da rede hoteleira por esses empreendimentos em construção – se a construção do empreendimento atrasasse, a rede hoteleira também respondia perante o particular pelo atraso?

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça enfrentou essa questão (EDcl no AgInt no AREsp 2.440.237-RJ): a resposta é não. A rede hoteleira, apesar da sua participação nos contratos de venda dos imóveis dentro do empreendimento que irá administrar, apenas tem responsabilidade após a finalização da construção. 

São três as principais razões que levaram o STJ a essa conclusão. 

A primeira delas é quanto à ausência absoluta de ingerência da rede hoteleira sobre a construção do empreendimento. Essa constatação leva à conclusão de que a rede hoteleira não integra a cadeia de fornecimento relacionada à incorporação imobiliária – requisito para a responsabilização pelo atraso na incorporação, já há anos consolidado pela jurisprudência do STJ. Esse fato, por si, afasta a responsabilização da rede hoteleira com base no CDC. 

A segunda das razões, aferível caso a caso, tem fundamento no Código Civil: a rede hoteleira apenas poderia ser responsabilizada pelos danos decorrentes caso houvesse disciplina contratual que a obrigasse. Inexistindo disposição no contrato nesse sentido, na medida em que também não há normativa legal, a responsabilização da rede hoteleira fica impossibilitada. 

Essas duas razões já seriam suficientes a impedir a responsabilização da rede hoteleira. Mas o STJ foi além. Nos casos em que a rede hoteleira não participa da incorporação, a verdade é que também é prejudicada pelos atrasos na construção. Isso ocorre porque sua atividade apenas tem início quando da entrega do empreendimento, iniciando sua administração. Havendo atraso, tal qual o particular adquirente da unidade imobiliária, a rede hoteleira fica igualmente impossibilitada “de gerar renda com a locação das unidades imobiliárias correspondentes”.

Em virtude dessas circunstâncias, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a afiliação de marcas entre a rede hoteleira e a construtora/incorporadora do empreendimento para sua execução não confere à primeira responsabilidade solidária pela sua execução. A rede hoteleira fica responsável pelo funcionamento do empreendimento após sua finalização, porquanto é exclusiva da incorporadora/construtora a responsabilidade pela execução do empreendimento – e, por consequência, de eventual atraso na entrega. 

A solução encontrada pelo Superior Tribunal de Justiça no impasse foi reconhecer a ilegitimidade passiva da rede hoteleira incluída na ação proposta pelo consumidor, que visava a reparação dos danos decorrentes do atraso significativo na construção do empreendimento em que se localizava o “apart-hotel” por ele adquirido. O descumprimento do contrato de construção do imóvel se deu exclusivamente pela incorporadora, não havendo fundamento legal para responsabilizar a rede hoteleira pela responsabilidade na entrega do imóvel, que não foi por ela assumida. 

O entendimento adotado, que vem se consolidando no curso dos anos, traz maior segurança jurídica à indústria hoteleira para investimentos neste tipo de Empreendimento, ao dissociá-la da incorporação/construção, e, com isso, mitigar os riscos decorrentes da filiação de marcas.

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