STJ divulga 14 teses sobre crimes da Lei de Licitações

Saiba mais sobre os principais entendimentos do STJ sobre os crimes da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/1993)
Henrique-Dumsch-Plocharski

Henrique Plocharski

Advogado da área penal empresarial

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Em outubro de 2019, o Superior Tribunal de Justiça – STJ divulgou nova edição da “Jurisprudência em Teses”, sob o nº 134, fixando entendimentos a serem seguidos em decisões que versem sobre crimes da Lei de Licitações (Lei nº 8.666/93).

A primeira tese divulgada trata dos elementos necessários para configuração do primeiro delito previsto na Lei de Licitações, conhecido como dispensa irregular de licitação (art. 89 – dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em Lei – com pena de detenção de 03 a 05 anos).

Tanto a Quinta quanto a Sexta Turma têm entendido ser indispensável a comprovação do dolo específico (vontade especial do agente dirigida a tal fim) em causar dano ao erário, bem como prova do prejuízo à administração pública para se caracterizar o delito de dispensa irregular de licitação (tese 01). Neste crime, a condição de ser o sujeito agente político (prefeito) não pode ser considerada como circunstância judicial desfavorável, por se tratar de elementar do tipo penal (tese 03).

Quanto ao segundo delito, de fraude à licitação (frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório), por se tratar de crime comum –– que pode ser praticado por qualquer pessoa que participe do certame –– a condição de agente público pode ensejar a incidência da agravante genérica, sendo circunstância que não integra o tipo penal, elevando então a pena mínima, que é de dois anos (teses 05 e 06).

Ainda sobre este crime, o entendimento é de que o termo inicial para contagem do prazo prescricional deve ser a data em que o contrato administrativo foi assinado, visto que o mero ajuste informal da fraude entre os acusados não possui o condão de frustrar o caráter competitivo da licitação (tese 08).

Ademais, vem sendo consolidada, principalmente na Quinta Turma, a ideia de que é possível o concurso de crimes –– circunstância que pode gerar o somatório das penas –– , entre o delito de fraude ao caráter competitivo da licitação (art. 90) com o crime de fraudar a licitação mediante elevação arbitraria dos preços (art. 96, inciso I) –– este, exclusivo para aquisição ou venda de bens e mercadorias, não abrangendo eventuais fraudes para fins de contratação de serviço, conforme o princípio da taxatividade (tese 11).

Assim, restaria afastada a aplicabilidade do princípio da consunção (hipótese em que o acusado responde por somente uma infração, havendo a absorção do crime fim, pelo crime meio, quando este é etapa ou modo de executar o outro) por serem tipos que tutelam objetos distintos, já que o primeiro protege o caráter competitivo do procedimento e o segundo o erário público.

A consunção (ou absorção) também tem sido afastada nas duas turmas quando do concurso de crimes da Lei de Licitações com os crimes praticados por prefeitos, pela compreensão de que as infrações penais tipificadas na Lei 8.666/93 não são meio necessário, fase preparatória ou de execução para a prática de crimes de responsabilidade –– estes tutelados no art. 1º do Decreto-Lei nº 201/67.

A título de exemplo, caso ocorra uma fraude em licitação com o objetivo de desviar verbas públicas (peculato), na visão atual da Corte ocorreria a condenação por ambos os crimes de maneira individualizada (entendimento 12), não sendo absorvido o “crime meio” (fraude à licitação) pelo “crime fim” (peculato – desvio de verbas).

Ainda que a maioria das teses se refiram aos crimes de Licitações, também houve um destaque especial para a discussão processual da aplicabilidade da regra geral contida no art. 400 do Código de Processo Penal, que prevê a ordem de tomada de declarações na instrução criminal, sendo o interrogatório do réu o último ato a ser praticado. Isto porque, de acordo com o procedimento previsto no art. 104 da Lei Especial, o interrogatório do acusado ocorreria ainda no início da instrução, em total afronta ao contraditório e a ampla defesa, bem como ao sistema acusatório.

Entretanto, ano após ano a jurisprudência do STJ vem confirmando o entendimento do Ministro Dias Toffoli que, no julgamento do HC nº 127.900/AM, concluiu que “a realização do interrogatório ao final da instrução criminal, conforme o artigo 400 do CPP, é aplicável no âmbito dos procedimentos especiais, preponderando o princípio da ampla defesa sobre o princípio interpretativo da especialidade” (tese 13).

Por fim, também foi divulgada a limitação de que o crime do art. 93 (impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório), só pode ter lugar quando as condutas forem praticadas no curso do procedimento licitatório; logo, eventuais fraudes após o término do procedimento não poderiam caracterizar o tipo em questão (tese 10).

Em conclusão, mesmo após mais de 25 anos de vigência da Lei de Licitações ainda existem divergências sobre a sua correta aplicação legal. Por outro lado, o STJ vem progredindo, com sucesso, na consolidação do entendimento jurisprudencial sobre os crimes de licitação, que ganharam popularidade em meio ao cenário de combate à corrupção.

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