Penhorabilidade de bem de família de fiador em contrato de locação comercial

É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial.
Luciana-Carneiro-de-Lara

Luciana Carneiro de Lara

Advogada egressa

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Síntese

Em recentíssimo julgamento, o STF decidiu que locadores de imóveis comerciais podem penhorar bem de família do fiador para garantir o recebimento de valores em caso de descumprimento contratual pelo locatário. No caso, prevaleceu o entendimento de que o fiador tem ciência de que todos os seus bens responderão pelo inadimplemento do locatário, inclusive o bem de família, em conformidade com o pleno exercício de seu direito de propriedade.

Comentário

Em recentíssimo julgamento, o Supremo Tribunal Federal decidiu que locadores de imóveis comerciais podem penhorar bem de família do fiador para garantir o recebimento de valores, em caso de descumprimento contratual pelo locatário.

Com efeito, a Lei n. 8.009/90, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família, prevê em seu artigo 3º, as hipóteses nas quais o bem de família admite penhora. Dentre elas, o inciso VII estabelece que “a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”.

  Decorre daí que os fiadores de contratos de locação podem responder com o seu bem de família pela dívida do locatário.

  No ano de 2010, o STF publicou a tese para fins de repercussão geral (tema 295), no seguinte sentido: “É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, em virtude da compatibilidade da exceção prevista no art. 3°, VII, da lei 8.009/90 com o direito à moradia consagrado no art. 6° da CF, com redação da EC 26/20”.

  No entanto, a referida tese não especificava a que tipo de locação o entendimento alcançava: se residencial ou comercial.

  Na sequência, em 2018, o STF julgou outro caso envolvendo o tema, no qual foi assentada a impossibilidade da penhora do único bem de família do fiador no caso de locação comercial.

Porém, no último julgamento, prevaleceu o entendimento de que o fiador – ao assinar, por livre e espontânea vontade o contrato de fiança em locação de bem imóvel – tem ciência de que todos os seus bens responderão pelo inadimplemento do locatário, inclusive o bem de família, em conformidade com o pleno exercício de seu direito de propriedade.

De acordo com o entendimento do Ministro Relator, Alexandre de Moraes, a Lei n. 8.009/90 não fez distinção entre locação residencial e comercial para fins de penhorabilidade do bem de família do fiador. No seu voto, consigna que “se a intenção do legislador fosse a de restringir a possibilidade de penhora do imóvel do fiador ao contrato de locação residencial, teria feito expressamente essa ressalva.”

A decisão, todavia, não foi unânime. O Ministro Edson Fachin apresentou voto no sentido diverso, defendendo o direito de moradia do fiador no caso de locação comercial.

Segundo o Ministro, “no caso de contrato de locação residencial, é possível contrapor o direito à moradia de fiadores ao igualmente relevante direito à moradia dos locatários, o mesmo não se verifica na hipótese de fiança em contrato de locação de imóvel comercial”.

A Procuradoria Geral da República se pronunciou no mesmo sentido, defendendo o direito à moradia e consignando que o Estado é obrigado a assegurar medidas adequadas à proteção de um patrimônio mínimo.

Instaurou-se, então, um conflito entre a possibilidade de penhora do único imóvel residencial familiar (bem de família) do fiador de contrato de locação comercial e a liberdade de contratar, assegurada pelos princípios da autonomia contratual e da livre iniciativa.

Para os defensores da corrente mais conservadora, a penhora esvaziaria o conteúdo do direito à moradia e atingiria o seu núcleo essencial, tendo em conta a prevalência do direito à moradia, devendo o credor buscar outros mecanismos razoáveis e menos gravosos para obter a satisfação do seu crédito.

Ao final, com um placar de 7 votos a 4, prevaleceu a tese do Relator favorável à penhora também em contratos de locação comercial: “É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial”.

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