2023 é o ano dos projetos municipais de saneamento básico

Ignorando modelos de prestação regionalizada, municípios “põem na praça” projetos de saneamento que com o novo decreto poderão contar com recursos federais.
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Pedro Lucena

Advogado egresso

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Incluída como princípio fundamental do (nem tão) Novo Marco Legal do Saneamento Básico, a prestação regionalizada traduz modelos que pretendem gerar ganhos de escala, além de garantir a universalização e a viabilidade técnica e econômico-financeira dos serviços. O objetivo, nos termos da própria lei, é alcançar metas de atendimento, garantindo água potável a 99% da população, bem como coleta e tratamento de esgotos a 90% dos brasileiros até 31 de dezembro de 2033.

Ainda que subscreva, no âmbito do interesse local, a titularidade dos municípios para serviços de saneamento, a lei estabelece um enérgico enforcement em favor da prestação regionalizada, isto é, condiciona a alocação de recursos públicos federais, além de financiamentos com recursos da União ou geridos por suas entidades, à adoção de um dos modelos prestacionais de regionalização.

Em outras palavras, aqueles municípios que não quiserem adotar modos de prestação regionalizada, em última instância, não contarão com aportes financeiros oriundos da União para o desenvolvimento de seus projetos.

Pelo menos era assim até a publicação, em 05.04.2023, do Decreto n.º 11.467 do Governo Federal, que relativizou a dita condicionante de transferência de recursos, abrindo exceções para alguns casos específicos.

Trata-se de um cenário normativo que pode ocasionar grandes mudanças na dinâmica do setor, porque se extrai do referido decreto três blocos de exceções que acabam por indicar conjunturas em que o condicionamento aos repasses para entes não regionalizados será descartado.

 A primeira exceção se aplica aos municípios com prestação delegada por meio de contratos de programa regulares em vigor, firmados em momento anterior à data de publicação do decreto, desde que comprovada a capacidade econômico-financeira do prestador.

A segunda excepcionalidade se volta para os municípios com prestação delegada por meio de contratos de concessão ou de parcerias público-privadas precedidos de licitação, cujos instrumentos tenham sido assinados antes da data de publicação do decreto.

A terceira, por sua vez, engloba os municípios cujas concessões ou parcerias público-privadas tenham sido efetivamente licitadas, estendendo-se, ainda, aos casos em que consultas públicas já tenham ocorrido ou, no mínimo, tenham sido objeto de estudos contratados por instituições financeiras federais.

Direcionando um olhar mais atento às situações elencadas nos parágrafos anteriores, constata-se que a norma regulamentar pode ter efeito decisivo perante o contexto nacional, principalmente quando se leva em consideração que o Brasil é um país formado por 5.668 municípios.

Decorridos quase três anos desde a vigência do Novo Marco Legal do Saneamento Básico, não se deve ignorar o crescimento de decisões políticas municipais apoiadas em premissas de organização e implementação de modelos alheios às prestações regionalizadas.

Em 30.03.2023, por exemplo, Araricá foi o primeiro Município do Estado do Rio Grande do Sul — com menos de 30.000 habitantes — a assinar um contrato de concessão de serviços de saneamento com a iniciativa privada.

No tocante às concorrências em curso, o ano de 2023 também despontou com projetos que foram “postos na praça” e apresentados ao mercado mediante estruturações complexas e com grande relevância econômica.

Elucidativamente é possível citar o Município de Olímpia (SP), que pretende conceder à iniciativa privada a totalidade da administração da infraestrutura e instalações necessárias ao abastecimento de água potável em sua área _ desde a captação até as ligações prediais, passando também pelos instrumentos de mediação. Quanto ao esgotamento sanitário, a concessão irá abarcar toda a infraestrutura e instalações operacionais de coleta, transporte, tratamento e disposição final adequada dos esgotos sanitários.

Trata-se de uma concorrência cujo valor estimado do contrato é superior a R$ 1 bilhão.

A grosso modo, e sem adentrar nas especificidades de cada um dos casos comentados, se antes de 05.04.2023 tais projetos não vislumbravam em seus horizontes aportes financeiros oriundos do Governo Federal, com a vigência do novo decreto tais projetos podem passar a cogitá-los.

É de se aguardar, portanto, os próximos movimentos municipais, principalmente sob a ótica das novas regras de regulamentação que se apresentam ao setor de saneamento, sinônimo de saúde e desenvolvimento tão caro à população brasileira.

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