Síntese
A Terceira Turma do STJ entendeu que a indenização legal prevista no artigo 603 do Código Civil se aplica também aos contratos de prestação de serviço firmados entre pessoas jurídicas, mesmo quando não houver cláusula expressa estipulando a penalidade.
Comentário
Ao julgar o Recurso Especial nº 2.206.604/SP, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que, mesmo sem previsão expressa no contrato, a indenização prevista no artigo 603 do Código Civil é aplicável aos contratos de prestação de serviços entre pessoas jurídicas, nos casos de rescisão unilateral.
O dispositivo legal estabelece que, se o contrato firmado por prazo determinado for encerrado sem justa causa, o prestador de serviços terá direito ao recebimento da retribuição vencida e metade da que lhe seria devida até o término do contrato. Tradicionalmente, a doutrina e a jurisprudência restringiam a aplicação do art. 603 do Código Civil a contratos celebrados com pessoas físicas, sobretudo profissionais autônomos.
Entretanto, a decisão recente do Superior Tribunal de Justiça reconheceu a possibilidade de aplicação da indenização legal também em contratos firmados entre pessoas jurídicas para prestação de serviços, representando um marco importante para a segurança jurídica nas relações empresariais.
A controvérsia envolveu uma empresa de gestão condominial, que foi contratada por um condomínio para a prestação de serviços. O contrato estabelecido entre as partes previa a execução dos serviços por tempo determinado. Contudo, foi encerrado antes do término de seu prazo, de forma unilateral e imotivada pelo condomínio.
Em virtude da rescisão sofrida, a empresa ajuizou ação indenizatória com fundamento no artigo 603 do Código Civil, sob o argumento de que a disposição legal assegura ao prestador o direito de receber a retribuição vencida e metade da que lhe seria devida até o término do contrato.
O Tribunal de Justiça de São Paulo afastou a aplicação do dispositivo legal, fundamentando que sua aplicação à relação entre pessoas jurídicas estaria condicionada à existência de cláusula contratual expressa e, na ausência desta, se destinaria exclusivamente a contratos com prestadores de serviço autônomos.
A empresa apresentou recurso à instância superior, e o STJ reformou a decisão, reconhecendo que fazia jus à indenização.
A interpretação do artigo 603 do Código Civil, conforme a decisão do Superior Tribunal de Justiça, traz implicações significativas para os contratos de prestação de serviços, especialmente aqueles firmados entre pessoas jurídicas.
Para o relator, Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, o dispositivo legal não faz distinção entre pessoas físicas e jurídicas, e a finalidade da norma é garantir previsibilidade e evitar o uso abusivo da rescisão unilateral, protegendo a expectativa legítima do prestador, a boa-fé objetiva e a lealdade contratual. Consignou ainda ser desnecessária previsão contratual expressa acerca da indenização.
O ministro afirmou que “doutrina e jurisprudência evoluíram, mesmo sob a égide da antiga legislação, para ampliar o escopo da prestação de serviço, adaptando-se às novas formas de contratação e modelos de negócios“. Segundo ele, o STJ, ainda na vigência do CC de 1916, passou a admitir a aplicação do dispositivo em discussão nos contratos firmados entre pessoas jurídicas.
Asseverou também que “é provável que a maior proporção desses contratos, na atualidade, envolva exatamente contratantes pessoas jurídicas, em especial diante do fenômeno atualmente conhecido como pejotização”.
Atualmente, grande parte dos contratos de prestação de serviços envolve diretamente pessoas jurídicas, justamente em razão desse movimento de pejotização, o que demonstra que o mercado já não se estrutura apenas na lógica de pessoas físicas prestando serviços. Empresas especializadas e até microempresas individuais passaram a dominar diversos ramos. A realidade do mercado, marcada pela pejotização, exige uma leitura atualizada e abrangente da norma.
Para o STJ, não importa se o prestador é pessoa natural ou jurídica; o que importa é proteger a expectativa legítima do contrato e evitar que a parte que investiu tempo e recursos seja prejudicada por uma rescisão antecipada sem justa causa.
Com isso, a decisão alinha-se à tendência contemporânea de valorizar a função social do contrato e a proteção da legítima expectativa dos contratantes, garantindo equilíbrio e previsibilidade na execução de contratos empresariais.