A dispensa coletiva e os parâmetros da Jurisprudência Trabalhista e do Direito Comparado

Aspectos da dispensa coletiva e sua conceituação pela análise da Lei Estrangeira – reiteradamente invocada pelo TST
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Pedro Campana Neme

Advogado egresso

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Em tempos de crise econômica, a atividade empresarial é afetada negativamente em todos os campos da economia do País. Fica mais usual a notícia de decretações de falência, de empresas fechando as portas e de demissões massivas de trabalhadores.

Para que se atinja a recomposição da economia de maneira mais célere, renova-se a clássica discussão sobre a flexibilização de direitos trabalhistas, como forma de alívio financeiro ao empregador – o que, em última análise, pode ser o ponto de convergência para a manutenção da relação empregatícia.

É fato que a jurisprudência trabalhista tem visto com certo olhar refratário a flexibilização de direitos do trabalho, ante a indisponibilidade que permeia grande parte dos institutos que o compõem.

A depender da seriedade da condição econômica que assola determinada empresa, resta-lhe a opção da demissão em massa – layoff.

Para o início da exposição do tema jurídico, é interessante destacar que o poder de demitir ínsito ao empregador é, por natureza, um direito potestativo. É dizer, trata-se de um direito exercível a qualquer tempo, de forma unilateral, contra o qual a outra parte nada pode opor, restando-lhe apenas se curvar (à exceção das causas estabilitárias, em regra).

Todavia, em se tratando de demissões que ostentem caráter coletivo, a jurisprudência trabalhista passou a tratar do tema com maior rigor, efetivamente, retirando a natureza potestativa (ainda que em parte) do direito de demitir.

O direito de resilir os contratos de trabalho ainda permanece com o Empregador, mas sua validade jurídica fica condicionada à observância de algumas diretrizes, que, vale dizer, não encontram amparo em nenhum ato normativo. No mesmo sentido, não há norma brasileira que defina, em parâmetros objetivos ou subjetivos, o conceito de demissão coletiva.

De todo modo, a Jurisprudência iterativa e atual que se debruçou sobre a matéria exige, imprescindivelmente, a negociação coletiva para a validade da despedida massiva de empregados. O fundamento adotado pela Jurisprudência se esteia na necessidade de participação dos sindicatos obreiros nesses atos demissionais, que, pela abrangência, redundam em forte impacto social.

Em tese, a participação dos Entes Sindicais obreiros tende a mitigar alguns efeitos indesejáveis oriundos do fim da relação empregatícia, nos termos da Jurisprudência mais atual.

Ante a falta de previsão legal específica, a definição de parâmetros pelo Judiciário tem lastro no artigo 8º, da CLT, que estatuiu como fonte supletiva do direito material do trabalho o Direito Comparado.

Fica, pois, exclusivamente a cargo do Julgador a definição do conceito de dispensa em massa.

O prestigiado Prof. Maurício Godinho Delgado classifica o instituto como a despedida que “atinge um grupo significativo de trabalhadores vinculados ao respectivo estabelecimento ou empresa, configurando uma prática maciça de rupturas contratuais” (Curso de Direito do Trabalho, 12ª Edição, Editora LTr, p. 1192).

A subjetividade que ostenta a definição acima é que transfere ao analista do caso concreto a tarefa de sopesar as configurações empresariais e declarar o tipo de despedida ocorrida na hipótese – se individual (ainda que destinada a um grupo de empregados) ou se coletiva (lay-off).

Analisando os parâmetros que proporciona a Lei Alienígena, importa adentrar, de início, no conceito firmado no Direito Espanhol. Nos termos dos artigos 49, §1º, “i” e 59, do Estatuto de los Trabajadores, a dispensa coletiva se dá quando as extinções contratuais decorrem de motivos econômicos, técnicos, de produção ou organizacionais. O referido diploma laboral trouxe parâmetros objetivos para a conceituação da despedida coletiva.

Há o despido colectivo quando, observados os requisitos acima, ocorrer a extinção contratual de 10 trabalhadores em empresas que empreguem menos de 100 operários; dez por cento dos trabalhadores em empresas que empreguem de 100 a 300 trabalhadores; e 30 trabalhadores em empresas que empreguem mais de 300 empregados.

Já a Lei Portuguesa, no Código do Trabalho (artigos 359 a 366), também fixa critérios objetivos para a conceituação de despedimento colectivo:

É a cessação de contratos, operada simultaneamente ou no interlúdio de 3 meses, direcionada a, pelo menos, 2 ou 5 empregados. O referido texto legal condiciona a dispensa à invocação de motivos de mercado (redução da atividade empresarial), estruturais (desequilíbrio econômico–financeiro) e tecnológicos (automatização de procedimentos produtivos, por exemplo).

Como se disse acima, a jurisprudência pacífica e atual do Tribunal Superior do Trabalho constantemente invoca os preceitos definidos no Direito Estrangeiro para a definição dos critérios da caracterização, ou não, da despedida em massa. É o caso do RO-147-7.2012.5.15.0000, no qual se adotaram os motivos (econômicos, estruturais e tecnológicos, da Lei Portuguesa) para classificação da despedida analisada.

Importante citar, também, que a Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) exige a consulta aos representantes obreiros, quando o Empregador antever términos de relações empregatícias por motivos “econômicos, tecnológicos, estruturais ou análogos”. Essa convenção internacional, não obstante ter sido denunciada pelo Brasil, permanece a ostentar a natureza de fonte material de direito do trabalho.

Pois bem. Classificada uma dispensa como coletiva, com o auxílio dos parâmetros acima explanados, torna-se imprescindível prévio processo de negociação coletiva – este requisito, com efeito, também se encontra definido no artigo 360 do Código do Trabalho Português.

Descumprido o pressuposto, a jurisprudência declara a nulidade da resilição contratual massiva, o que, por consequência, culmina na reintegração de todos os trabalhadores afetados com o ato demissional.

O discurso dos Julgadores do Tribunal Superior do Trabalho tem sugerido, usualmente, a adoção de institutos que possam mitigar os efeitos da ruptura em massa. É vista com grande simpatia pela Cúpula da Justiça do Trabalho a transação por meio de Planos de Demissão Voluntária ou Incentivada, através da qual os empregados, por livre vontade, aderem ao “pacote” proposto pela empresa, mediante contraprestação pecuniária – normalmente significativa.

Por oportuno, note-se que, por força da decisão do E. STF no Recurso Extraordinário nº 590.415, é válida a cláusula de Norma Coletiva que estabelece a eficácia liberatória geral em razão da adesão de empregado ao Plano de Demissão Incentivada. A partir de tal marco jurisprudencial, o empregado que tiver rescindido o contrato de trabalho em razão da adesão ao PDV (que contar com previsão em norma coletiva neste sentido) fica impossibilitado de rediscutir parcelas contratuais em futura ação trabalhista.

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