Aspectos relevantes dos crimes de responsabilidade praticados por prefeitos

Saiba mais sobre as condições necessárias para a aplicação da pena acessória de perda do cargo ou inabilitação para cargo público por até cinco anos.
Henrique-Dumsch-Plocharski

Henrique Plocharski

Advogado da área penal empresarial

Compartilhe este conteúdo

O antigo Decreto-Lei n.º 201/1967 define os crimes de responsabilidade que podem sujeitar prefeitos a responderem perante o Poder Judiciário. Dentre os 23 crimes de responsabilidade previstos no artigo 1º, o Peculato possui a maior pena. A origem da palavra remonta à antiga moeda romana pecus, que também inicia inúmeros vocábulos que representam valor, como peculiar (referente a pecúlio) e pecuária (que remete a gado, símbolo de riqueza e propriedade).  Assim, aquele que se apropriar de bens ou rendas públicas, pratica o delito de peculato. Da mesma forma, desviá-los em proveito próprio ou alheio ou, ainda, utilizar-se indevidamente, em proveito próprio ou alheio, fica sujeito a uma pena de reclusão que parte de dois anos de reclusão e pode, a depender do caso concreto, chegar a 12 anos de reprimenda.

No caso das demais hipóteses previstas pelo mencionado decreto, a pena é menos gravosa. Aquele que aplicar indevidamente rendas ou verbas públicas fica sujeito a uma pena de três meses a três anos, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular. Ocorre que, de acordo com previsão do Decreto-Lei n.º 201/1967, a condenação definitiva em qualquer um dos crimes de responsabilidade previstos no artigo primeiro “acarreta a perda de cargo e, também, a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação.”.

Trata-se, em resumo, da chamada pena acessória de inabilitação a cargo público. Importante não confundir com a inelegibilidade, sanção aplicável para os que forem condenados em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, com prazo de oito anos, nos termos da Lei Complementar n.º 64/90.

 Em que pese a previsão do Decreto-Lei n.º 201/1967 possa sugerir que a pena de inabilitação se aplica automaticamente em caso de condenação, este entendimento não está de acordo com a Constituição Federal. Neste sentido, o raciocínio deve partir do artigo 93, inciso IX da Constituição, que exige que todas as decisões sejam fundamentadas, sob pena de nulidade passando, também, pela garantia prevista no inciso XLVI, do artigo 5º, que prevê a diretriz da individualização da pena. E a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem assumido esta interpretação.

Em 2018, quando do julgamento do Habeas Corpus 481.010/BA, que tramitou perante a Quinta Turma, com a destacada relatoria do Ministro Joel Paciornik, foi reconhecido que “as penas acessórias previstas no § 2º do art. 1º do Decreto-Lei n.º 201/67 – perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou de função pública, eletivo ou de nomeação – não decorrem automaticamente da condenação, devendo o magistrado fundamentar sua aplicação.”.

Com amparo neste precedente, em junho deste ano o Superior Tribunal de Justiça, por meio da relatoria do Ministro Ribeiro Dantas, concedeu ordem de habeas corpus de ofício para, além da redução da pena privativa de liberdade, afastar a pena acessória de inabilitação. Reconheceu o Ministro, no Habeas Corpusn.º 667336/PE, que “a inabilitação foi aplicada pelo Tribunal de origem por força, exclusivamente, da condenação, devendo ser afastada por falta de fundamentação concreta.”.

Convém esclarecer que o crime de responsabilidade poderá sujeitar o prefeito em exercício a um longo e penoso processo de impedimento. E, nessa questão, alguns aspectos são importantes. O primeiro deles diz respeito à tipificação e definição desses delitos político-administrativos. É que o artigo 22, inciso I da Constituição Federal reservou essa atribuição legislativa à União. Portanto, Estados e municípios estão impedidos de legislar sobre a definição dessa espécie de crime, prevalecendo a definição do Decreto-Lei n.º 201/67.

O mesmo raciocínio se aplica à regulamentação das etapas processuais. Tal atribuição de legislar quanto ao processo de impedimento está reservada à União. Esse, aliás, foi o entendimento assentado pelo Supremo Tribunal Federal quando da edição da súmula 722 que diz: “são da competência legislativa da União a definição dos crimes de responsabilidade e o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento“.

Atualmente, com a grande utilização dos decretos para fins sanitários, cresce o movimento de judicialização das questões políticas envolvendo atos do Poder Executivo. Por consequência, a esfera do Executivo municipal também sofre a mesma pressão, já que constata-se uma crescente de pedidos de impedimento nessa esfera de poder. Em tal contexto, oportuno jogar luz e relembrar os poucos aspectos que reúnem entendimentos pacificados.

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.