Potencial mercado e desafios jurídicos do regime de fornecimento e prestação de serviços associados

Novo regime traz foco em soluções integradas e desempenho, ampliando espaço para inovação e oportunidades em infraestrutura, tecnologia e energia

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O regime de execução de fornecimento e prestação de serviços associados (FPSA) é um dos pontos de inovação da Lei Federal 14.133/2021 com potencial para modernizar e otimizar contratações públicas de obras e serviços de engenharia no Brasil.

Tal regime representa mudança de paradigma por colocar o foco da Administração Pública na contratação de soluções completas, baseadas no ciclo de vida do objeto, e não meramente na contratação individualizada de determinadas obras e serviços necessários para operação ou manutenção.

Ao permitir que um único contrato englobe tanto a entrega de um bem quanto sua subsequente operação e manutenção – ou ambas –, por um período determinado, a lei buscou endereçar ineficiências crônicas, fomentar uma maior sinergia e criar ponto único de responsabilidade contratual pelo desempenho integral de um ativo, por meio da concepção de um “objeto integrado” a ser colocado em disputa.

Nessa linha, no FPSA, a componente de serviço é substancial e contínua, estendendo-se por período determinado para garantir a operação e a manutenção do bem. A obrigação de fazer não é apenas um complemento à entrega, mas uma parte integrante e definidora do ciclo de vida da solução contratada.

Apesar de sua incipiência, já é possível verificar o uso do regime para contratação de implantação de data centers, geradores fotovoltaicos, geradores hospitalares, elevadores e ar-condicionado acoplados aos serviços de monitoramento, suporte, manutenção preventiva e corretiva. Em tais exemplos, percebe-se que o foco do serviço associado está antes em garantir a manutenção e menos na operação dos ativos “fornecidos”.

No entanto, a possibilidade de acoplar a operação embute o enorme potencial de mercado que o regime representa, pois ele pode servir para construção e operação de obras de engenharia de distintas matizes, incluindo um mercado de “mini Parcerias Público-Privadas (PPP)”.

Isso ocorre porque o regime do FPSA se aproxima da modalidade de PPP de concessão administrativa, porém sem as restrições que impedem o uso desta para projetos com valores de contrato inferiores a R$ 10.000.000,00 e prazos inferiores a 5 (cinco) anos. Ainda, é interessante mencionar que, em princípio, essas mini PPPs também não seriam contabilizadas para o limite de receita corrente líquida estipulado pela legislação federal.

Estas características do FPSA, aliadas à possibilidade de sua modelagem por meio de procedimentos de manifestação de interesse (PMI), introduzidas na legislação geral de licitações e contratações públicas, abrem relevante via para a iniciativa privada auxiliar no desenvolvimento desse potencial de mercado, por meio da apresentação de estudos, investigações, levantamentos e projetos.

Tecnologia de informação e comunicação (TIC), cidades inteligentes e energias renováveis são alguns exemplos de setores cujos projetos poderiam ser desenvolvidos via PMI e contratados sob o regime do FPSA.

Porém, o desenvolvimento do regime também demanda a superação de desafios. Afinal, é simples depreender que há incremento de complexidade no planejamento/modelagem dos objetos integrados do FPSA.

Isso implica, em alguma medida, virada de chave na atividade de planejamento desempenhada por gestores públicos e atenção a pontos jurídicos ligados à justificativa sobre a higidez da aglutinação de objetos, que tradicionalmente seriam contratados de forma separada, bem como garantias de desempenho expressas por parâmetros de desempenho/acordos de nível de serviço.

O FPSA desponta, portanto, como uma via promissora para superar a fragmentação contratual e alinhar as contratações públicas à lógica de soluções integradas, com foco em desempenho e ciclo de vida do objeto. Ao possibilitar a centralização da responsabilidade e a vinculação entre fornecimento e serviços contínuos, a Administração Pública tem à disposição um instrumento que tende a gerar maior eficiência, previsibilidade de custos e qualidade na entrega de bens e serviços.

Contudo, sua adoção requer amadurecimento institucional, tanto na esfera do planejamento, com a modelagem adequada dos objetos integrados, quanto na seara jurídica, com justificativas consistentes para a aglutinação e parâmetros de desempenho robustos. Se bem utilizado, o FPSA pode não apenas preencher lacunas entre contratações convencionais e PPPs, mas também ampliar o leque de oportunidades para inovação em setores estratégicos, como infraestrutura, tecnologia e energia, contribuindo para a modernização da gestão pública.

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