A crescente demanda por serviços de saúde integrados e de alta complexidade tem impulsionado a criação de Medical Centers – centros de atenção à saúde que congregam clínicas, laboratórios, serviços de imagem e, muitas vezes, pequenas unidades de internação. Contudo, a implementação desses empreendimentos exige mais do que investimentos financeiros e estrutura física, atraindo a importância de uma análise jurídico-sanitária integrada, sob pena de comprometer a viabilidade do projeto.
Neste contexto, a análise jurídico-sanitária consiste na avaliação das exigências legais, sanitárias e regulatórias aplicáveis ao projeto arquitetônico e ao modelo de operação pretendido. Seu escopo abrange: (i) viabilidade regulatória do empreendimento no local proposto; (ii) conformidade do projeto arquitetônico com a legislação sanitária e de acessibilidade; (iii) licenciamento sanitário e autorizações específicas, como o alvará de funcionamento, licenças ambientais e de vigilância sanitária; (iv) definição do regime jurídico das relações entre os profissionais de saúde, operadoras e pacientes; (v) avaliação dos riscos jurídicos e contratuais envolvidos na terceirização de serviços, locação de espaços, uso compartilhado de equipamentos, entre outros; (vi) prevenção de responsabilidade civil e penal dos gestores e dos profissionais que atuarão na unidade.
As etapas críticas da implantação que exigem análise jurídica referem-se à escolha do imóvel, que deve estar em área compatível com o uso institucional ou comercial de saúde, conforme Plano Diretor e Código de Obras municipal, ao projeto arquitetônico sanitário, que compreende layout de acordo com a setorização e os fluxos recomendados pela RDC nº 50/2002; à elaboração de contratos e modelos societários, em conformidade com o Código de Ética Médica, com a finalidade de evitar vínculo empregatício indevido e definir claramente responsabilidades técnicas. Além destas etapas, inclui-se a gestão de resíduos e segurança do paciente e os requisitos de construção exigidos pela Anvisa para um Medical Center.
A Anvisa, por meio da RDC nº 50/2002, estabelece o Regulamento Técnico para o planejamento, programação, elaboração e avaliação de projetos físicos de estabelecimentos assistenciais de saúde. Embora a RDC tenha como foco principal hospitais, seus princípios são amplamente aplicáveis a Medical Centers, sobretudo quando estes reúnem serviços ambulatoriais, diagnósticos e terapias em um único espaço.
A norma impõe que todo estabelecimento assistencial de saúde deve ser projetado com base em critérios de: segurança sanitária; fluxos funcionais adequados (pacientes, profissionais, resíduos, materiais limpos e sujos); flexibilidade e modularidade do espaço; facilidade de higienização e manutenção; conforto térmico, acústico, visual e ergonômico. Esses critérios devem estar presentes desde a concepção do projeto até a execução da obra e posterior solicitação de licenciamento sanitário.
Conforme o escopo dos serviços a serem oferecidos no Medical Center, a Anvisa exige: sala de espera dimensionada de acordo com a demanda prevista; recepção e triagem, separando, quando necessário, pacientes com doenças infectocontagiosas; consultórios médicos, com lavatório exclusivo; salas de procedimentos (quando houver); sanitários para público e funcionários; sala de utilidades para limpeza de materiais e utensílios; áreas administrativas separadas das áreas assistenciais. Cada ambiente deve seguir requisitos específicos de ventilação, iluminação, acabamentos laváveis e lavatórios, conforme tabelas anexas à RDC nº 50/2002.
A Anvisa também impõe exigências técnicas às instalações hidráulicas, elétricas e de gases medicinais, além de aprovação e responsabilidade técnica, que requer a aprovação de projeto assinado por profissional habilitado (engenheiro ou arquiteto), anotação de responsabilidade técnica; memorial descritivo técnico e licenciamento prévio ambiental, quando aplicável.
Diante de todos esses critérios, a antecipação de riscos legais garante segurança jurídica para investidores e sócios, adequação do projeto ao perfil assistencial desejado, prevenção de infrações sanitárias e interdições e fortalecimento da imagem institucional do empreendimento.
Conclusão
A construção de um Medical Center não se limita à elaboração de um projeto arquitetônico ou à obtenção de licenças. Trata-se de uma iniciativa complexa que exige o envolvimento de profissionais especializados em direito médico e sanitário. A RDC nº 50/2002, em especial, deve ser interpretada com atenção desde a fase inicial do empreendimento, integrando-se aos aspectos urbanísticos, ambientais, contratuais e éticos que envolvem a estruturação de um serviço de saúde moderno e eficiente. A análise jurídico-sanitária é, portanto, um aliado estratégico essencial do empreendimento.