A importância da realização de due diligence na aquisição de estabelecimento comercial

A due diligence é o principal instrumento para o empresário mensurar os riscos da aquisição de um negócio, sendo excepcional a intervenção judicial.
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Renan Sequeira

Advogado da área de contencioso e arbitragem

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No que diz respeito ao comércio, assim como às atividades empresariais em geral, o trespasse é uma atividade rotineira, que consiste, resumidamente, na alienação de um estabelecimento comercial por meio da transferência de sua titularidade de uma pessoa para outra. Para além de comum, trata-se de um mecanismo vital para que o universo econômico tenha a fluidez que o marca, tão importante para o desenvolvimento das sociedades.

O trespasse, por ser um negócio jurídico celebrado entre empresários, não pode pressupor uma assimetria contratual, não havendo, em princípio, uma parte presumidamente vulnerável. Por isso, o dirigismo contratual é evitado quando o Poder Judiciário enfrenta discussões envolvendo o trespasse. É que nesse tipo de transação se espera dos contratantes ressaltada diligência nas tratativas.

Nessa ordem de ideias, as partes envolvidas em um trespasse devem guardar muita cautela ao realizarem as tratativas associadas ao negócio. É que, por não se estar de modo geral diante de uma relação de disparidade, o Poder Judiciário é menos aberto a intervir nos termos contratados entre as partes, preservando de forma mais acentuada o princípio da autonomia da vontade.

Parte importante desse dever de cautela envolve a realização de adequada due diligence do estabelecimento comercial objeto da alienação contratada entre as partes. Tal atividade varia de caso a caso, a depender da complexidade e das especificidades do estabelecimento comercial em questão, mas, em geral, entre outros aspectos, passa, necessariamente, pela análise de passivos trabalhistas e fiscais, como a investigação de ações judiciais envolvendo o estabelecimento comercial.

Nesses dois pontos específicos, a realização de due diligente pode ser bastante complexa e trabalhosa, sendo diversos os instrumentos pelos quais se pode obter as informações necessárias para a execução da investigação. A título de exemplo, destaca-se a importância de se realizar o levantamento e a análise de todas as ações judiciais envolvendo o estabelecimento comercial sobre o qual versa o negócio, das certidões processuais e administrativas pertinentes, bem como a realização de pesquisas junto à Receita Federal e aos fiscos estaduais e municipais.

Reunida toda a base informacional necessária, aquele empresário que adquire o estabelecimento comercial pode identificar de forma adequada todos os riscos que a realização do negócio jurídico representa, sendo essa consciência algo que se espera dos atuantes no universo comercial. É a partir dos resultados da due diligence que o empresário, sabendo de todos os riscos associados ao trespasse, estará em condições de pactuar seus termos, os quais, como destacado, não são passíveis de revisão judicial, via de regra.

Nesse sentido, é ilustrativa a recente decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferida no âmbito do recurso de apelação de n.º 1037160-77.2016.8.26.0100. No caso, uma parte requereu que a tutela jurisdicional revisasse os termos de contrato de trespasse, sob o fundamento de que a parte contrária não declarou vultoso passivo empresarial (dívidas trabalhistas e fiscais, entre outros) durante as tratativas realizadas para a celebração do negócio.

A 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, porém, em consonância com o exposto acima, entendeu que não cabe a intervenção judicial nos termos contratuais celebrados entre as partes em preservação ao princípio da autonomia da vontade. É que, entre outros pontos, os julgadores paulistas entenderam que os empresários adquirentes tinham plenas condições de averiguar a efetiva situação econômica do estabelecimento comercial e, após as ponderações necessárias, orientarem-se quanto ao prosseguimento ou não da transação, não cabendo a interferência judicial. Considere-se aqui que o risco é uma das tônicas da atividade empresarial, sendo elemento indispensável do empreendedorismo que deve ser equacionado pelo empresário, com cautela, em cada caso.

O julgado, dessa forma, só ressalta a importância de que as tratativas de trespasse sejam acompanhadas de adequada due diligence, essencial para aferir os riscos associados à aquisição de um estabelecimento comercial e definir os termos do negócio. Sem ela, em realidade, ao empresário restam poucas alternativas, entre as quais não se inclui a intervenção do Poder Judiciário, em regra.

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