A recuperação judicial do produtor rural pessoa física

STJ decide que produtor rural pode requerer recuperação judicial das dívidas contraídas antes do registro da sua atividade perante a Junta Comercial.

Compartilhe este conteúdo

Síntese

A 4ª Turma do STJ decidiu por maioria, em 05 de novembro no Resp. nº 180032-MT, que produtor rural poderia incluir na recuperação judicial os créditos que foram contraídos mesmo antes da formalização de sua empresa com o registro da atividade na Junta Comercial.

Comentário

A 4ª Turma do STJ decidiu, em 05.11.2019, no Recurso Especial nº 1800032 – MT, que as dívidas contraídas por produtor rural pessoa física mesmo antes da sua inscrição na Junta Comercial, ou seja, da abertura da sua empresa, podem também ser inseridas na recuperação judicial.

O caso envolve o Grupo JPupin que está em recuperação judicial e cujas dívidas, constituídas em sua imensa maioria ainda na condição de pessoa física, somam cerca de R$ 1,3 bilhão. O julgamento teve início em 04.06.2019, ocasião em que o relator, Ministro Marco Buzzi, entendeu que a recuperação judicial não poderia abranger os créditos contraídos antes do registro na Junta Comercial por se tratarem de dois regimes jurídicos diferentes, o da pessoa física e o da pessoa jurídica.

Entretanto, o Ministro Raul Araújo abriu a divergência e votou no sentido contrário, uma vez que, segundo ele, a atividade econômica exercida pelo produtor rural, seja pessoa física ou jurídica, não se altera mesmo após o registro na Junta Comercial. Na sequência, o Ministro Luis Felipe Salomão pediu vista e o julgamento foi retomado em 05.11.2019.

Sendo assim, por 3 votos a 2, o STJ entendeu que é possível a submissão das dívidas contraídas pelo produtor rural pessoal física aos efeitos da recuperação judicial. O cerne da discussão decorre da interpretação dos artigos 48 e 51, V da Lei de Recuperação e Falência – LRF nº 11.101/05 e do artigo 971 do Código Civil – CC. Isso porque a LRF prevê, de forma genérica, que somente poderá requerer a recuperação judicial aquele que comprovar o exercício regular de sua atividade por mais de dois anos e que demonstrar o registro mercantil na Junta Comercial.

Por outro lado, o art. 971 do CC faculta, e não obriga, o registro para a pessoa física que exerça a atividade rural de forma habitual, como sua principal profissão, não significando com isso que este, mesmo sem o registro, não exerça uma atividade empresarial regular. Além disso, o registro da atividade mercantil seria meramente declaratório e não constitutivo, uma vez que o que qualifica o sujeito como empresário é o exercício da sua atividade econômica de forma organizada para produzir ou circular bens e serviços de natureza agrícola, pecuária, agroindustrial e extrativa.

Desse modo, a 4ª Turma do STJ, por maioria, entendeu que o produtor rural pode requerer recuperação judicial imediatamente após o registro empresarial da atividade na forma da lei, desde que comprovada a exploração da atividade rural por mais de dois anos, mesmo que exercida antes de tal registro. Mais do que isso, mesmo as dívidas contraídas nesse período anterior podem se submeter ao regime e às benesses da recuperação judicial.

Além disso, o produtor rural poderia comprovar o exercício regular da sua atividade das mais variadas formas, como, por exemplo, através das notas de produtor rural, comprovantes de recolhimento de tributos, cópias de contratos bancários rurais ou dos quais se denote a natureza da atividade econômica desenvolvida, documentos contábeis, dentre outros.

Mesmo que essa decisão se aplique tão somente para as partes envolvidas no processo, ela serve de importante precedente sobre o assunto e poderá nortear uma eventual decisão em repercussão geral sobre o tema, que, como tal, valerá para quaisquer casos que nele se enquadrem.

É de grande valia a consolidação de entendimentos sobre a possibilidade de utilização da recuperação judicial pelo setor agrícola, fundamental para a economia do País, especialmente se considerarmos que, de acordo com o IBGE, em 2017, dos 5 milhões de produtores rurais no Brasil, apenas 97,5 mil estavam constituídos na forma de empresa. Para além disso, o instituto da recuperação judicial tem sua função social ao auxiliar na superação do estado de insolvência, privilegiando a continuação da atividade produtiva, a manutenção de empregos e a geração de tributos.

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.