A Teoria dos Custos de Transação e os contratos empresariais

A Teoria dos Custos de Transação abrange a análise de custos envolvidos nas contratações, os quais nem sempre são considerados e precificados.
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Bruno Fonseca Marcondes

Head da área de estruturação de negócios

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A Teoria dos Custos de Transação (TCT) abrange a análise dos custos envolvidos e os consequentes impactos para a realização de uma transação que, para a teoria, nada mais é que a passagem de um bem ou a contratação de serviços entre agentes econômicos. Desenvolvida e aprimorada por Oliver Williamson _ em trabalho que, inclusive, lhe proporcionou o Nobel de Economia em 2009 _ em conjunto com Elinor Ostrom, a teoria compara os custos de transação à fricção ou atrito nos sistemas estudados pela Física.

Tais custos surgem quando a empresa recorre ao mercado para adquirir novos produtos ou insumos para produção ou mesmo para manter a sua estrutura atual funcionando regularmente. Nestas transações, a companhia celebra contratos (ainda que verbais, por exemplo) e se utiliza de uma estrutura interna destinada à gestão e ao controle do desempenho e execução destes contratos.

A TCT é relevante neste ambiente porque chama atenção para o fato de que a matriz de custo de uma empresa deve sempre considerar não só os custos de produção, mas também os custos de transação a ela relacionados. Obviamente, uma vez que toda companhia visa a maximização dos seus lucros, uma das principais tarefas dos gestores é a redução dos custos em geral; neste sentido, o melhor instrumento para reduzir e mitigar os custos de transação é garantir que cada contrato celebrado pela empresa esteja realmente adequado para cada operação.

Teoricamente, no decorrer de uma negociação, ambas os lados têm a intenção de fixar o conteúdo do contrato de forma equilibrada entre si. Isso envolve, por exemplo, a definição do melhor preço e condições de mercado para que a aquisição do produto/serviço ocorra da forma mais eficiente possível para ambas as partes. Contudo, na realidade, ocorre que a própria transação em si apresenta custos adicionais, tanto na etapa prévia à contratação (ex ante) quanto na etapa posterior (ex post).

Os custos anteriores são mais facilmente constatáveis e, portanto, mensuráveis, porque se referem aos custos próprios para negociar e estabelecer a contratação. Incluem-se nesta categoria a definição da forma e condições de entrega, planos de metas, acordo de nível de serviço (em inglês service level agreement ou SLA),projetos, cálculos, avaliação de condutas possíveis pelos agentes com a previsão de remédios ou penalidades em caso de descumprimento, o próprio tempo da contratação em si e os custos relacionados à sua formalização (assistência jurídica e a elaboração do contrato em si).  Os custos posteriores, por sua vez, são aqueles decorrentes da má adaptação da relação econômica ao contrato celebrado, ou mesmo o custo para a renegociação desse contrato para resolver o mal entendido, além dos custos e despesas para fiscalizar e administrar a execução dos contratos e assegurar o cumprimento das obrigações assumidas.

A origem de todos esses custos de transação é justamente o fato de que toda transação é realizada entre seres humanos, ou seja, agentes com comportamentos que nem sempre são racionais e são, na maioria das vezes, oportunistas. O próprio modelo de transação considera que o homem possui racionalidade limitada, gerando, assim, contratos incompletos ou inadequados.

Sem dúvida, todo agente econômico, quando negocia um contrato, pretende ser totalmente racional em suas decisões; contudo, consegue sê-lo apenas parcialmente. Sua capacidade cognitiva está muitas vezes prejudicada por uma inevitável assimetria de informação entre as partes, pela qual uma delas revela suas informações de forma parcial ou distorcida, agindo estrategicamente em benefício próprio. Este fato, por si só, acaba gerando custos adicionais para verificar a credibilidade e confiabilidade das informações fornecidas, de modo que os contratos devem conter salvaguardas ou precauções para atender a tais imprevistos.

Além dos atributos humanos, as transações também serão impactadas pela especificidade do ativo objeto do contrato e a sua frequência de contratação. Quanto maior o grau de especificidade do ativo, maiores são as necessidades de salvaguardas contratuais, considerando que o descumprimento é prejudicial a ambas as partes; consequentemente, é maior o interesse das partes de estender a duração contratual. Nestes casos, as salvaguardas geralmente pretendem o realinhamento dos incentivos (multas por inadimplemento), a estruturação de uma forma de gestão e fiscalização do contrato e a garantia de regularidade nas trocas. Todos estes elementos devem ser considerados no processo de contratação e devem estar devidamente regrados no contrato.

Geralmente, existe uma correlação entre os custos ex ante e ex post. Quanto maiores os custos anteriores, menores tendem a ser os custos posteriores. A título de exemplo, uma pesquisa realizada na Espanha, em 2015, analisou o processo de registro de empresas em diversas jurisdições e constatou essa correlação. As jurisdições que possuem exigências de registro mercantil mais rígidas, impondo, por exemplo, a necessidade de registro de todos os documentos societários referentes à eleição de diretores (como a Alemanha), tornam públicas as informações sobre os mandatos, poderes e alçada, o que gera mais custos ex ante às empresas.

Por outro lado, há jurisdições que não exigem esses registros públicos (caso dos EUA), de forma que apenas a declaração da própria companhia já basta para a sua comprovação. Isso reduz bastante os custos iniciais; contudo, em um segundo momento, a demanda da comprovação dos termos da contratação dos diretores, bem como a sua validação e conferência dos poderes pelo mercado em geral, gera custos ex post a todos os agentes do mercado que quiserem contratar com aquela empresa.

O estudo acima referido também analisou centenas de opiniões legais emitidas por juristas em mais de 25 países, tendo constatado que, nos países cujo processo de registro é mais demandante, as opiniões legais referentes à validade e a extensão dos poderes da administração são muito mais simples. Ao contrário, em países com processos menos exigentes, as opiniões legais são muito mais estruturadas e complexas, e, portanto, mais caras (mais custosas) porque demandam a conferência de um número maior de documentos pela parte contratante para a sua validação.

Essa mesma análise pode ser aplicada a qualquer contratação. A correlação e a intensidade dos custos de transação ex ante e ex post devem sempre ser levadas em consideração. Neste sentido, os custos de transação devem ser considerados no momento de estruturar a transação e também na contratação em si. Por este motivo, a ciência de elaborar contratos deve não só se ocupar com a redação dos contratos, mas também com o reconhecimento prévio de potenciais pontos de conflitos, a estruturação da operação e as suas salvaguardas, a instituição de medidas de gestão e de remédios jurídicos que mitiguem ao mínimo possível o risco de surgir um conflito ou mesmo o impeçam de acontecer.

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