Síntese
O Tribunal de Contas da União (TCU) acompanhou, em processo de fiscalização, o setor de gás natural, observando avanços na competição e a urgência de expansão da infraestrutura, com destaque para a entrada de novos agentes e a relevância das regulamentações para estimular o mercado, apesar dos atrasos na edição dos regulamentos. O relatório ressalta a necessidade de ações rápidas para promover uma maior abertura do mercado e garantir o desenvolvimento sustentável do setor.
Comentário
O Tribunal de Contas da União publicou, em abril de 2024, acórdão em processo de fiscalização que, desde 2020, acompanha o setor de gás natural a fim de identificar riscos e oportunidades de melhoria na condução da política pública do Novo Mercado de Gás – NMG, que propõe a modernização e a competição naquele mercado de forma a fomentar a concorrência.
Editada em 2009, a Lei do Gás (Lei n.º 11.909/09) foi o primeiro marco legal específico do setor no país e buscou a atração de novos agentes setoriais, com a regulamentação da modalidade de concessão para gasodutos de transporte.
Na realidade, contudo, a malha de gasodutos de transporte praticamente não se expandiu no país na década de 2010. À época, diversas iniciativas foram tomadas para repensar o modelo de regulação do gás natural, a fim de atrair novos agentes para o mercado, incrementar a malha de transporte dutoviário e reduzir a posição dominante da Petrobras.
Em 2019, foi lançado, pelo Governo Federal, o programa Novo Mercado de Gás, a fim de conceber um modelo de regulação apto a assegurar o acesso às infraestruturas essenciais, como escoamento, processamento e terminais de gás natural liquefeito, visando o aperfeiçoamento do sistema de transporte, a implementação de medidas de estímulo à competição e, finalmente, a liberalização do mercado.
Ainda no âmbito deste programa, em 2019, a Petrobras celebrou com o CADE um Termo de Compromisso de Cessação de Prática por meio do qual se comprometeu a realizar uma série de desinvestimentos no mercado de gás natural, entre eles a alienação de sua participação em transportadoras e distribuidoras estaduais.
Finalmente, em 2021 foi sancionada a Nova Lei do Gás (Lei n.º 14.134/21), que alterou substancialmente a regulamentação do setor, substituindo, no transporte do gás natural, o regime de concessão, previsto anteriormente, pelo de autorização, e estabelecendo o acesso não discriminatório às infraestruturas essenciais, tais como gasodutos, unidades de tratamento e processamento e terminais de gás natural liquefeito.
Em seu relatório, o TCU apontou que a necessidade de expansão da infraestrutura de transporte é evidenciada pelas projeções de aumento da produção de gás natural, especialmente nas Bacias de Santos, Campos, Solimões e Parnaíba. Foi também observado que esta expansão pode diversificar o desenvolvimento regional e substituir combustíveis mais poluentes, bem como que sua viabilidade está atrelada à demanda termelétrica na área de influência do modal.
Destacou-se a importância de expandir a capacidade de transporte de gás entre os estados do Rio de Janeiro e São Paulo para garantir maior segurança energética ao país. A fiscalização ressaltou, também, a relevância do transporte dutoviário para ampliar o acesso a formas de energia mais modernas e mitigar emissões, além da possibilidade de aproveitar o potencial de hidrogênio e biometano, combustíveis que devem ganhar escala nos próximos anos e poderão compartilhar a infraestrutura de dutos utilizados para o transporte de gás natural.
Diversos aspectos relacionados às inovações promovidas pela Nova Lei do Gás, no entanto, dependem da edição de regulamento pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para que sejam efetivamente implementadas. O TCU identificou cinco ações regulatórias que haviam sido previstas na agenda regulatória da ANP 2022-2023 relacionadas à Nova Lei do Gás. Tais ações incluem a instituição de diretrizes para autonomia e independência da atividade de transporte de gás natural, o estabelecimento de critérios para o cálculo de tarifas de transporte, além da adequação de resoluções antigas às novas disposições legais, por exemplo.
O TCU apontou, entretanto, que as ações regulatórias no setor têm sido postergadas de forma continuada pela ANP, sobretudo em razão da escassez de recursos humanos, o que afeta severamente o desenvolvimento do mercado de gás natural no Brasil.
Em conclusão, a fiscalização do TCU verificou um avanço relevante na competição no setor de gás natural, com a entrada de novos agentes, apesar da pequena redução da posição dominante da Petrobras. O documento constata que a infraestrutura de escoamento e transporte deverá se desenvolver nas próximas décadas, com a adoção de projetos compartilhados e acesso à infraestrutura de terceiros. Ressalta-se, no entanto, que a postergação de ações regulatórias tem colaborado para reduzir a velocidade da abertura do mercado.