Acesso irregular à rodovia federal: quem compete a regularização?

Para o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, a obrigação de regularizar o acesso à rodovia recai sobre o particular.
Thaina-Oliveira

Thaina de Oliveira

Advogada da área de contencioso e arbitragem

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Síntese

A abertura de acessos irregulares para utilização de rodovias federais por titulares de imóveis lindeiros é medida comum, sobretudo em regiões cuja implementação dos contratos de concessão é conquista recente. Todavia, a ausência de regularização destes trechos pode implicar riscos à segurança dos usuários. Mas a quem compete este ônus? Aos olhos do Poder Judiciário, o dever de regulamentação recai sobre o proprietário do imóvel beneficiado pelo acesso.

Comentário

Embora os contratos de concessão de rodovias sejam comuns, a extensão dos direitos e obrigações previstos nestes instrumentos ainda são pouco conhecidos pelos particulares. Não raras vezes, os usuários de serviços públicos atribuem exclusivamente às concessionárias o dever de regularização de acessos que conectam terrenos particulares lindeiros à rodovia. Normalmente, essas passagens são instituídas de forma precária, sem autorização do Poder Público ou mesmo observância das regras previstas no Manual de Acesso de Propriedades Marginais a Rodovias Federais do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT).

No entanto, é em razão do exercício do poder-dever fiscalizatório cedido pela União em virtude de contrato, bem como do princípio geral da supremacia do interesse público sobre o privado, que as concessionárias de serviços públicos rodoviários podem compelir o particular a iniciar procedimento administrativo para regularização da passagem instalada na faixa de domínio, sob pena de fechamento do acesso.

Sobre o tema, em recente decisão proferida no Recurso de Apelação n.º 5000212-34.2022.8.13.032, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais reiterou este entendimento, ao manifestar que “A obrigação de adequação dos acessos às rodovias federais é propter rem dos proprietários atuais dos imóveis lindeiros que dele se utilizem, ainda que não tenham sido eles quem anteriormente implantou o acesso”.

No caso concreto, uma concessionária ajuizou ação visando compelir o proprietário de um imóvel lindeiro à Rodovia BR-381 a iniciar um procedimento administrativo de regularização do acesso, sob pena de fechamento.

Em defesa, o particular alegou que não foi o responsável pela abertura do acesso, que já existia desde 1959, tendo adquirido a propriedade do imóvel beneficiado apenas em 2010. No mesmo sentido, alegou que o acesso se encontra a 60 metros da rodovia, fora da faixa de domínio, sendo criado para atender à Gruta de Nossa Senhora das Dores de Itaguara/MG, patrimônio cultural da cidade. Além disso, sustentou que a concessionária também se utiliza da passagem para descarte de fresa e que, em razão do contrato de concessão e do termo de cessão, estaria obrigada à manutenção da integridade da faixa de domínio da rodovia, zelando pelas boas condições do acesso.

Entretanto, apesar da argumentação, o Tribunal consignou na decisão que o próprio DNIT, por meio de regulamento específico, limita a construção de interligação viária às rodovias federais por proprietários de imóveis lindeiros, permitindo o acesso à rodovia a título precário. Em outras palavras, o ato que autoriza a abertura de passagem pode ser revisto a qualquer tempo, visando à garantia da segurança comum e da ordem, não constituindo, portanto, direito adquirido.

Além do mais, a obrigação de zelar pela manutenção das boas condições do acesso e de proceder com a sua regularização recai sobre o atual proprietário do imóvel beneficiado, independentemente de ter ou não construído a passagem, possuindo, portanto, natureza propter rem.

O poder-dever das concessionárias em exigir a regularização dos acessos ainda possui amparo no Programa de Exploração da Rodovia BR-381/MG/SP que outorga às concessionárias a possibilidade de exigir a regularização das vias precárias, tanto administrativamente, quanto pelas vias judiciais.

É justamente pensando no bem comum e na efetivação do princípio da supremacia do interesse público sobre o privado que esse entendimento também é endossado e aplicado pelos Tribunais de todo o País, os quais, em reiteradas oportunidades, ratificaram a necessidade de fechamento da passagem na hipótese de eventual recusa do particular em regularizar o acesso.

A toda evidência, é certo que a atuação ativa da concessionária para saneamento de acessos irregulares visa unicamente resguardar a segurança do particular e, com isso, cumprir com o propósito da atividade contratada. Não é incomum que os acessos irregulares possuam alguma deficiência de sinalização ou não recebam a manutenção adequada, situação gravíssima que autoriza a intervenção das concessionárias rodoviárias por meio de atos administrativos.

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