Há muito tempo que o Fisco e os Contribuintes debatem as repercussões fiscais e tributárias dos benefícios de ICMS concedidos pelos Estados em um contexto de guerra fiscal.
A ideia geral da tese tributária que está em discussão é a desoneração dos Contribuintes da tributação federal sobre os ganhos obtidos em razão da concessão de subvenções pelos Estados para o desenvolvimento de atividades econômicas. Um dos objetivos é preservar o pacto federativo e a autonomia dos Estados estabelecerem suas políticas de desenvolvimento.
Neste contexto, em 2017, a legislação federal se aperfeiçoou ao esclarecer a natureza dos tipos de subvenções estatais, que foram divididas em subvenções de custeio e de investimento, de acordo com a sua finalidade. Ao mesmo tempo, a Lei Complementar 160 resolveu parte das discussões quando: i) permitiu a convalidação dos incentivos e benefícios fiscais concedidos pelos Estados perante o Confaz; e ii) estabeleceu requisitos para a classificação fiscal e destinação das subvenções na contabilidade fiscal e tributária das empresas.
Ainda assim, as discussões administrativas e judiciais sobre o tema prosseguiram, e, em meados de 2023, o Superior Tribunal de Justiça deu início ao julgamento do Tema 1182. O objeto da ação de origem era “Definir se é possível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS – tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros – da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (extensão do entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL)”.
Na ocasião, foram firmadas teses confirmando a possibilidade de exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS somente nas hipóteses de atendimento aos requisitos estabelecidos no artigo 10 da Lei Complementar 160/2017 e no artigo 30 da Lei Federal 12.973/2014. O Tribunal também reservou à Receita Federal a prerrogativa de proceder ao lançamento dos tributos quando verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade diversa da garantia da viabilidade do empreendimento econômico.
A partir do julgamento do STJ – ainda não finalizado – a principal fonte de divergências e ponto de atenção para os Contribuintes deixou de ser a natureza das subvenções, mas sim o cumprimento dos requisitos legais para as exclusões. Entre eles, se destacam as regras de contabilização das subvenções, os aspectos formais do benefício reportado na Escrituração Contábil Fiscal do Contribuinte e na Escrituração Fiscal Digital do ICMS. A decisão trouxe parâmetros a serem seguidos pelos contribuintes e pelo Fisco na definição da legitimidade das exclusões das subvenções.
Seguindo a sequência de alterações no tema, mais recentemente, em agosto de 2023, o Governo federal publicou a Medida Provisória nº 1.185 modificando completamente o regime fiscal e tributário das subvenções, com efeitos previstos para janeiro de 2024.
Esta MP revogou a possibilidade de exclusão das subvenções das bases dos tributos federais, estabelecendo um novo modelo baseado em créditos fiscais. De acordo com a Medida Provisória, referidos créditos poderão ser utilizados por contribuintes, mas somente após a conclusão da implantação ou expansão do empreendimento, desde que previamente habilitados.
Outra novidade é que a geração dos créditos não vai ficar restrita às subvenções estaduais, podendo ser estendida a benefícios federais e municipais. E, ainda, os créditos fiscais acumulados sob esta rubrica poderão ser objeto de ressarcimento, além da compensação.
Caso esta Medida Provisória seja convertida em lei, constituirá um novo marco temporal na disciplina normativa do tratamento fiscal e tributário das subvenções, impondo novos requisitos legais, mais restritivos que os das legislações anteriores.
Ainda longe de um desfecho, a discussão do tratamento fiscal e tributário das subvenções abriu uma série de caminhos e oportunidades para os contribuintes. Primeiro, para promover a revisão e solicitação, inclusive judicial, das exclusões das subvenções dos tributos federais e recuperar o que foi pago de forma indevida nos últimos cinco anos.
Um outro caminho, para aqueles que já deixaram de pagar os impostos, é validar os procedimentos adotados em conformidade com as novas orientações do STJ, e ajustar provisionamentos e condutas.
Com a MP, a perspectiva é de que os requisitos mais restritivos vão representar aumento de carga tributária para o próximo ano, além da ampliação da discussão judicial dos períodos anteriores.
Se não for aprovada até o final do ano, a norma perde sua validade. Já existe, contudo, uma articulação do Governo no sentido de transformar o tema em Projeto de Lei, em que provavelmente serão mantidas as principais diretrizes da Medida Provisória.
E se tudo é duvidoso, uma coisa é certa: devido ao grande e crescente volume de desonerações promovidas pelos contribuintes, a tributação das subvenções, que já ocupa um lugar de destaque no Plano de Fiscalização da Receita Federal de 2023, deve permanecer no centro das atenções pelos próximos anos.