Alocação de riscos nos contratos de EPC

Alocar riscos significa estabelecer a responsabilidade de cada uma das partes diante dos riscos da execução contratual. Entenda!
Bruno-Marzullo-Zaroni

Bruno Marzullo Zaroni

Head da área de contencioso e arbitragem

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A necessidade de ampliação e renovação da infraestrutura no Brasil resulta na concepção de empreendimentos de grande porte, sobretudo nos segmentos de saneamento, energia, óleo e gás, rodovias, portos e aeroportos. Estes projetos caracterizam-se pelo gigantesco investimento financeiro, pela complexidade técnica e pela enorme quantidade de atividades que se sucedem simultaneamente e de forma interativa. Tem-se aqui um ambiente no qual convivem vasto número de fornecedores, expressivo volume de dados, elevados riscos e complexas exigências tecnológicas e gerenciais.

Tipicamente, grandes obras de infraestrutura eram empreendidas pelo Poder Público e empresas estatais, quando dotadas de corpo técnico. A empresa contratada era selecionada, na maioria das vezes, com base no menor preço, num contexto em que o projeto já se apresentava integralmente definido pelo contratante, não outorgando margem de liberdade à contratada para contribuir tecnicamente na fase projetos e influenciar na gestão. Esse modelo naturalmente atribui significativamente os riscos contratuais para a contratante.

Gradativamente, porém, os donos de obras buscaram partilhar responsabilidades com os construtores. Uma opção foi a contratação de empresa com expertise tanto na concepção de projeto quanto no fornecimento, construção e gestão do empreendimento.

Atualmente, para viabilizar distintas dinâmicas e exigências em projetos de infraestrutura, uma variedade de modelos contratuais pode ser adotada, não havendo espaço aqui para abordá-los. Por ora, interessa tratar aqui dos contratos EPC (engineering, procurement and construction) ou ainda Turn Key (chave na mão). Nestes modelos, o contratado assume a responsabilidade por todas as etapas do empreendimento: projetos, engenharia, fornecimento, construção e montagem, comissionamento e entrega da obra em condições de operação. A adoção desta composição contratual é benéfica, pois favorece o monitoramento do empreendimento pelo contratante, além de alocar ampla parte dos riscos ao contratado.

Reside aqui uma particularidade em projetos de infraestrutura: de regra, na fase preliminar, os contratantes buscam isolar os principais riscos associados à execução contratual, repartindo-os expressa e objetivamente entre si e preordenando meios de resolução.  De um modo geral, as partes costumam ajustar que os riscos afetos à implantação do empreendimento devem ser suportados pelo contratado, tais como os riscos associados à mão de obra e a questões geológicas, hidrológicas e pluviométricas.

Daí porque a precificação do contrato EPC deve levar em conta as potenciais contingências e incidentes que podem ocorrer ao longo da execução contratual. Ainda no plano dos riscos, por conta da envergadura e complexidade de projetos de infraestrutura, é aconselhável a previsão contratual de limitadores financeiros à responsabilidade do contratado, de modo a resguardar este de perdas substanciais.

De qualquer sorte, embora o contratado assuma os riscos correlacionados a eventos que comprometam ou retardem a implantação, comissionamento e entrega do empreendimento em operação, não é lícito concluir que todo e qualquer risco possa ser a ele atribuído. Os riscos ___ dentre eles, os geológicos, hidrológicos e pluviométricos ___ que exorbitem a capacidade de prognóstico de um “epecista” diligente e que tenham caráter extraordinário não podem ser presuntivamente a este imputados.

Por isso mesmo, o pleito de revisão do contrato EPC relativo a um risco expressamente alocado ao contratado apenas se torna plausível quando comprovável que o evento perturbador do equilíbrio econômico-financeiro é extraordinário e de impossível previsão por ocasião da contratação. Poderá ainda o contratado demonstrar que, mesmo que o evento em si pudesse ser antevisto, a sua proporção e deletéria repercussão na execução do projeto não poderiam ser previstas por um contratado experiente.

Desta brevíssima exposição fica a conclusão de que qualquer litígio entre os contratantes, seja no ambiente extrajudicial ou judicial, deve ser interpretado a partir da matriz de riscos expressa no contrato EPC e pautado na preservação do equilíbrio econômico-financeiro contratual.

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