Aspectos legais do dropshipping no Brasil

Dropshipping: conceito, enquadramento jurídico, responsabilidades e possibilidades para a segurança jurídica do negócio.
Rafaella de Aragão - Versão Site 1

Rafaella de Aragão

Advogada da área de contencioso e arbitragem

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A expansão do e-commerce no Brasil caminha a passos largos. Essa expansão ocorreu de forma ainda mais acelerada após a pandemia da Covid-19, que impôs às pequenas e médias empresas a necessidade de ingressarem no comércio eletrônico.

Nesse cenário, o comércio eletrônico tem se tornado altamente competitivo, sendo necessária a adoção de estratégias de negócio para reduzir custos e manter a lucratividade. Uma dessas estratégias consiste no chamado dropshipping.

O assunto ainda é pouco explorado no Brasil e carece de disciplina legal, causando insegurança jurídica aos consumidores finais e às empresas que adotam a estratégia no e-commerce.

Este texto trata do conceito de dropshipping e dos aspectos legais relacionados ao seu enquadramento jurídico e à responsabilização das empresas que adotam tal estratégica em face do consumidor, bem como aborda a importância de estabelecer uma matriz de riscos e distribuição de responsabilidades no contrato entre vendedor (varejista) e fornecedor (produtor ou atacadista).

O que é dropshipping?

O dropshipping consiste em uma estratégia de venda de produtos em que não há a necessidade de armazenamento físico de produtos por parte do vendedor. Nesse caso, tanto o controle de estoque quanto a distribuição do produto para o consumidor final são realizados pelo fornecedor.

Simplificando, o dropshipping funciona do seguinte modo:

  1. o consumidor realiza a compra do produto no e-commerce;
  2. o vendedor recebe a ordem de compra e submete a informação ao fornecedor; e
  3. o fornecedor separa o produto e o envia diretamente ao consumidor.

Dessa maneira, toda a gestão logística é facilitada, tornando o negócio mais lucrativo ao vendedor, tendo em vista a redução dos custos com estocagem e distribuição de produtos.

Qual é o seu enquadramento jurídico?

No Brasil, não há disciplina legal específica sobre o dropshipping. Trata-se, assim, de um contrato atípico, conforme autoriza o art. 425 do Código Civil: “É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código”.

Justamente por se tratar de contrato atípico, não há modelo legal a ser seguido. Contudo, tradicionalmente, são identificadas duas práticas de dropshipping que importam enquadramentos jurídicos diversos, especialmente para fins tributários:

  1. compra e venda: nesse modelo, há duas operações de compra e venda: uma estabelecida entre o consumidor final e o vendedor; outra, entre o vendedor e o fornecedor. No âmbito tributário, esse modelo é conhecido como operação triangular por venda à ordem. Nesse caso, o vendedor emite a nota fiscal de venda do produto e o fornecedor realiza a entrega ao consumidor com uma nota fiscal de remessa; e
  2. intermediação: nesse modelo, o vendedor atua somente como intermediador entre o fornecedor e o consumidor final. Assim, o vendedor emite nota fiscal de intermediação e o fornecedor emite a nota fiscal de venda, realizando a entrega do produto ao consumidor final.

O fato de não haver um modelo legal exige a adoção de ainda mais cautela por parte dos contratantes. Em todo o caso, devem ser respeitadas as regras previstas no Código Civil a fim de conferir estabilidade à relação estabelecida entre o vendedor e o fornecedor.

Qual é a responsabilidade das empresas que adotam o dropshipping em face do consumidor?

O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 7º, parágrafo único, estabelece a responsabilidade solidária de todos os integrantes da cadeia de consumo pelos danos causados ao consumidor. Além de solidária, a responsabilidade dos integrantes da cadeia de consumo é também objetiva, ou seja, independe da existência de culpa.

A empresa que adota a estratégia do dropshipping eaplica o modelo de compra e venda é, em regra, considerada integrante da cadeia de consumo, na medida em que figura na nota fiscal como vendedora do produto adquirido pelo consumidor final.

Do mesmo modo, a empresa que aplica o modelo de intermediação é também considerada integrante da cadeia de consumo. No julgamento do REsp 1.444.008/RS, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) distinguiu a “intermediação” do “serviço de anúncios”, concluindo que, no caso de o provedor de serviço na Internet fornecer toda a estrutura virtual para que a venda seja realizada, passa a fazer parte da cadeia de fornecimento, nos termos do art. 7º, parágrafo único, do Crédito Direto ao Consumidor (CDC).

Contudo, como reconheceu a Corte Superior naquela ocasião, existem “múltiplas formas de atuação no comércio eletrônico”, sendo crucial o exame do modelo negocial adotado para imputar à empresa a responsabilidade solidária pela reparação do eventual dano causado ao consumidor.

Importância da matriz de riscos e distribuição de responsabilidades no contexto interempresarial

Em conclusão, do ponto de vista da relação interempresarial entre vendedor e fornecedor, é de extrema importância a elaboração de um contrato estabelecendo a matriz de riscos e a distribuição de responsabilidades entre as partes para a manutenção do equilíbrio e da segurança jurídica do negócio.

A depender das cláusulas constantes do contrato, será possível, inclusive, que aquele que pagou pela reparação dos danos causados ao consumidor (vendedor ou fornecedor) exerça o direito de regresso contra aquele que se responsabilizou contratualmente, permitindo a indenização pelos prejuízos suportados.

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