Síntese
O Plenário do CADE impôs penalidade a empresas de telecomunicações por constituição anticompetitiva de consórcio em licitação destinada à aquisição de serviços de transmissão de dados. Nos termos do voto da Conselheira Relatora, o consórcio foi utilizado para implementação de divisão de mercado e obtenção de informações sobre a abrangência da infraestrutura de seus competidores.
Comentário
Em processo administrativo instaurado pela Superintendência Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), após Representação movida pela British Telecom, o Plenário do CADE determinou aplicação de penalidades às empresas de telecomunicações Claro, Oi e Telefônica Brasil. O Plenário adotou o voto da Conselheira Relatora, que consignou que o consórcio constituído pelas empresas para disputar licitação dos Correios – instaurada para aquisição de serviços de transmissão de dados – violava a livre concorrência, na medida em que teria sido empregado para implementação de divisão de mercado.
Para sustentar sua conclusão, o voto da Conselheira Relatora destacou a avaliação técnica feita pela Superintendência Geral do CADE, que indicou elevada sobreposição de redes entre as empresas, de modo que duas das consorciadas – Oi e Claro – poderiam atender aos serviços licitados pelos Correios isoladamente. Além disso, também destacou que as consorciadas, principais detentoras da infraestrutura necessária ao oferecimento dos serviços, teriam a oportunidade de obter valiosas informações sobre a abrangência da infraestrutura de seus competidores, facilitando a adoção de condutas anticoncorrenciais em futuras contratações. Diante da análise técnica da Superintendência, o Plenário acolheu a posição da Conselheira Relatora e determinou a aplicação de penalidades às empresas envolvidas por infração às regras de concorrência.
No âmbito das contratações públicas, a formação de consórcios é uma faculdade conferida às empresas licitantes pelo art. 33 da Lei n.º 8.666/93, e pelo art. 15 da Nova Lei de Licitações (Lei
n.º 14.133/21). A autorização tem por objetivo incrementar a competitividade do certame, permitindo que empresas diversas reúnam esforços para apresentar uma proposta única e mais adequada à Administração Pública.
No entanto, na contramão desses objetivos, é possível que o instrumento consorcial seja indevidamente manejado por empresas licitantes para burlar a competição pretendida – como, por exemplo, empresas que se associam para evitar concorrência entre si e para aumentar os preços oferecidos, beneficiando-se indevidamente da associação. Nesses casos, a constituição de consórcios não se afigura legítima e pode gerar a responsabilização dos envolvidos.
A preocupação com a maior ou menor competitividade da licitação gerada pela possibilidade de constituição de consórcios é compartilhada por órgãos de controle da Administração Pública. Em mais de uma oportunidade, o Tribunal de Contas da União destacou que a participação de empresas em consórcio pode não implicar o incremento de competitividade, mas, ao contrário, gerar limitação à concorrência – vide Acórdãos n.º 1946/2006 e 280/2010 do Plenário. Por essa razão, o Tribunal vem apontando a necessidade de que a escolha da Administração Pública seja devidamente justificada, caso a caso – vide Acórdão n.º 1636/2007 do Plenário.
Uma forma de se avaliar se o consórcio foi constituído com o objetivo legítimo de ampliação da competitividade está na análise da eficiência econômica decorrente de sua criação. Nesse sentido, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) elaborou, em 2021, estudo específico sobre o tema com relevantes orientações para uma avaliação acerca da formação de consórcios em licitações. A OCDE apresenta os seguintes indicativos para determinar a competitividade dos consórcios: (i) se os consorciados são ativos em mercados distintos; (ii) se os consorciados fornecem um serviço integrado único; (iii) se dois fornecedores ativos em diferentes áreas apresentam propostas que atendem a todo o território; e (iv) e se dois ou mais fornecedores combinam capacidades para atender a contratos que não poderiam ser atendidos individualmente.
Diante do exposto, e tendo em vista a orientação adotada pelo CADE, as empresas que disputam licitações deverão se atentar ao poder de mercado detido pelas possíveis parceiras de consórcio antes de eventual associação. A inexistência de justificativas econômicas e técnicas aptas à constituição do consórcio que prestigiem a concorrência buscada pela Administração Pública poderá atrair questionamentos. A decisão do CADE, portanto, prestigia e reforça o dever de ampliação da competitividade dos certames.