A Lei de Recuperação Judicial n.º 11.101, de 2005, previa inicialmente que a suspensão das execuções perduraria pelo prazo terminativo de 180 dias, a contar do deferimento do processamento da recuperação. Esse intervalo serviria para oportunizar ao devedor o levantamento de suas dívidas, sua classificação para ordem de pagamento, a habilitação dos credores e a elaboração de um plano de reestruturação financeira.
O legislador foi claro e incisivo ao dispor que a suspensão, em hipótese alguma, excederá o prazo improrrogável de 180 dias. Todavia, pouco após o início de vigência da norma, os órgãos julgadores identificaram a inviabilidade fática para o cumprimento do limite imposto.
Em 2008, o Superior Tribunal de Justiça – STJ já havia decidido que a legislação deveria ser compreendida de maneira sistemática para tutelar o princípio da preservação da empresa, autorizando a continuidade da suspensão, conforme julgado do Conflito de Competência n.º 88.661/SP.
Somente em agosto de 2019, o Grupo de Câmaras Reservadas de Direito Empresarial do TJ-SP publicou o Enunciado 09, com o intuito de consolidar o posicionamento, para admitir a prorrogação do prazo legal. O prazo anteriormente fixado tornou-se obsoleto e a Lei n.º 14.112, de 2020, alterou a redação anterior admitindo, excepcionalmente, a prorrogação do stay period em uma única oportunidade.
Por outro lado, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, no julgamento do Agravo de Instrumento n.º 2106236-39.2023.8.26.0000, em junho de 2023, proferiu acórdão admitindo uma segunda prorrogação do stay period em Recuperação Judicial. Os Desembargadores entenderam que a conduta da recuperanda não contribuiu para a superação do lapso temporal e morosidade na condução da demanda.
A postura diligente da recuperanda no cumprimento dos prazos processuais motivou a autorização para renovar o período de suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor relativas aos créditos sujeitos ao procedimento recuperacional. Desse modo, prevaleceram os precedentes jurisprudenciais e os princípios fundamentais da recuperação judicial sobre a letra fria da lei.
A própria legislação tem como finalidade viabilizar a superação da crise financeira do devedor para proteger o emprego dos trabalhadores, o interesse dos credores e a função social da empresa, estimulando a atividade empresarial. Em contrapartida, verifica-se certa insegurança jurídica trazida por decisões nesse sentido que decretam entendimentos objetivamente contrários ao texto legal, principalmente se considerarmos que a Lei de Recuperação Judicial foi atualizada em 2020.
Este cenário provoca dúvida às empresas recuperandas, aos credores, aos magistrados e aos operadores do direito: qual o limite de prorrogação do stay period em recuperações judiciais?
O Tribunal de Justiça de São Paulo firmou entendimento de que a ausência de indícios de protelação intencional dos atos de responsabilidade da recuperanda autorizaria a segunda prorrogação da suspensão executiva. De fato, a prática demonstra que o limite estabelecido pela lei ____ na maioria das vezes ____ não é suficiente para a realização dos atos necessários para viabilizar a recuperação judicial.
Todavia, o requisito adotado pelos Tribunais carece de solidez. O mero cumprimento do critério objetivo de obediência aos prazos da recuperação judicial mostra-se frágil para o deferimento de subsequentes postergações do stay period.
Devem ser contemplados os elementos subjetivos para renovar a suspensão das execuções: o porquê de o prazo de 360 dias não ter sido suficiente para a adoção das medidas necessárias para viabilizar a recuperação judicial, analisando-se, inclusive, eventual interesse de terceiros em retardar a efetivação do plano de recuperação por algum interesse de mercado.
Ao impor uma limitação fixa ao stay period, a legislação deixa de abarcar a particularidade de cada recuperação judicial, vez que o importe da empresa e a quantidade de credores impacta diretamente na condução da sua recuperação.
A finalidade da recuperação judicial não é a postergar as dívidas da empresa, mas viabilizar a reorganização da sua atividade econômica para que possa quitar seus débitos e seguir cumprindo sua função, prevenindo danos sociais e financeiros à comunidade.
O processamento não precisa ser apressado e engessado, como a previsão legal de 2005 instituía. No entanto, não pode ser vagaroso e protelatório como pretendem alguns devedores. Deve ser eficiente e tempestivo para atender à finalidade da recuperação judicial.