Convenção de arbitragem em contratos de locação

Jurisprudência acolhe a validade de cláusulas compromissórias em contratos de locação, mas há requisitos a serem observados.
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Caio César Bueno Schinemann

Advogado da área de contencioso e arbitragem

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Síntese

A jurisprudência tem convalidado a cláusula compromissória veiculada em contratos de locação residencial, mas é necessário que se atente aos requisitos legais para tanto realização em documento apartado ou destaque da cláusula no contrato, com assinatura específica do locatário na cláusula compromissória. Em qualquer caso, a inclusão de cláusula compromissória em contrato de locação não retira a exequibilidade imediata do contrato enquanto título executivo extrajudicial.

Comentário

Denomina-se convenção de arbitragem a disposição contratual por meio da qual as partes concordam em resolver qualquer disputa ou controvérsia decorrente do contrato por meio de arbitragem em vez de recorrer ao Poder Judiciário. Com isso, exclui-se, em absoluto, a competência da Justiça estatal para apreciar a demanda.

Sendo arbitráveis os direitos patrimoniais disponíveis, em tese, não há dúvidas quanto à possibilidade de que as relações locatícias sejam submetidas à convenção de arbitragem. Em locações empresariais não há maiores dúvidas quanto à possibilidade de adoção da cláusula compromissória, já amplamente utilizada. A questão, no entanto, torna-se mais tormentosa no concernente às locações residenciais.

Locações residenciais foram usualmente consideradas pela jurisprudência como relações consumeristas, especialmente quando a relação se dá entre uma pessoa jurídica locadora e uma pessoa física locatária. Da mesma forma, foi usual que se considerasse os contratos de locação como sendo de adesão, diante de seu caráter padronizado e da pouca margem existente para negociação entre a pessoa física locatária e a pessoa jurídica locadora. Em suma, estendeu-se às relações locatícias a compreensão jurisprudencial expansiva que pautou o direito do consumidor em larga medida.

A Lei de Arbitragem não veda a veiculação de cláusula compromissória em contratos de adesão, mas há limitações, já que o art. 4º, § 2º da referida lei estabelece que “Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”.

O que a lei exige, portanto, é que nos contratos de adesão _ típicos de relações consumeristas _ haja um consentimento ainda mais qualificado no concernente à cláusula compromissória. Deverá haver uma adesão específica à arbitragem como meio de solução dos conflitos oriundos daquele contrato, o que se verifica mediante o destaque da cláusula compromissória, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula, ou a realização de documento em apartado.

A rigor, a despeito de pretensa hipossuficiente, em última análise, relações consumeristas dizem respeito a obrigações _ direitos patrimoniais disponíveis. É este o campo, por excelência, da arbitragem.

No caso das relações locatícias, é possível pensar em um sem número de ocorrências decorrentes da relação obrigacional ajustada entre as partes que poderiam ser solucionadas via arbitragem: questões relacionadas ao desequilibro econômico-financeiro do contrato, alteração do critério de atualização monetária (como tanto se viu, durante a pandemia, em relação ao IGP-M), responsabilidade por eventos e gastos extraordinários, danos verificados no imóvel, aplicação de multas contratuais. Enfim, toda a sorte de questões que podem se originar daquela relação contratual.

Ressalva-se, de toda forma, que a estipulação de cláusula compromissória não retira do contrato de locação a sua exequibilidade imediata enquanto título executivo extrajudicial. Em caso de simples inadimplência do locatário, caso estejam presentes os requisitos de título executivo extrajudicial (certeza, liquidez e exigibilidade), o locador poderá se valer, de imediato, da via executiva judicial.

A larga utilização de cláusulas compromissórias pelas startups, principalmente pelo Quinto Andar, tornou a questão objeto de ampla análise pela jurisprudência. Apesar de resistência inicial,  posicionamento que tem se demonstrado dominante na jurisprudência indica que a cláusula compromissória, respeitados os requisitos legais, não veicula qualquer tipo de abusividade, fazendo prevalecer a competência do juízo arbitral — por consequência, com a extinção do processo judicial instaurado, nos termos do art. 485, VII, do Código de Processo Civil (CPC).

É possível afirmar, portanto, que há segurança jurídica na opção, pelo locador, na inclusão, em contratos de locação, de cláusula compromissória. A ressalva é pela estrita necessidade de observância dos requisitos postos pela Lei de Arbitragem à veiculação de cláusula compromissória em contratos de adesão, ou seja, a realização em documento apartado ou destaque da cláusula no contrato, com assinatura específica do locatário na cláusula compromissória.

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