COVID-19 e os efeitos imediatos nos contratos administrativos de fornecimento

Thiago-Lima-Breus

Thiago Lima Breus

Head da área de infraestrutura e regulatório

COVID-19 e os efeitos imediatos nos contratos administrativos de fornecimento

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1. Crise e Contratos Públicos de Fornecimento

A pandemia do COVID-19 inexoravelmente se impôs. O número de casos confirmados no Brasil cresce dia a dia, juntamente com a sensação de insegurança.

Na ausência (ainda) de uma vacina apta a prevenir a infecção e de medicamento apta a curar a enfermidade em menor tempo, o controle da pandemia tem reclamado a adoção de medidas que restringem a circulação de pessoas, impactando de maneira inédita na atividade econômica. O mercado dos contratos públicos não é exceção. A imensa maioria dos contratos firmados com a Administração Pública sofrem os efeitos da crise econômica causada pela pandemia do COVID19.

É inevitável que obras enfrentem atrasos, que serviços sofram limitações impostas pela política de controle da doença e que os contratos de fornecimento de bens em favor da Administração Pública também sintam os impactos dessa crise e em aspectos bastante específicos.

No que se refere aos contratos administrativos que são objeto deste texto – os contratos de fornecimento –, cita-se 3 (três) pontos especialmente sensíveis aos efeitos da crise causada pela pandemia do COVID19: a ausência de mão-de-obra, a escassez de insumos e a variação cambial.

 

2. Questões especialmente sensíveis para os Contratos de Fornecimento: ausência de mão-de-obra, a escassez de insumos e a variação cambial.

A fabricação (e a entrega) de bens está diretamente atrelada à disponibilidade de mão-de-obra para trabalhar nas plantas industriais. Sem contar com a quantidade adequada de trabalhadores, a produção de bens é freada, o que pode afetar o abastecimento do mercado e implicar em atrasos no cumprimento de prazos de entrega.

Essa mão-de-obra, contudo, deve se tornar ainda mais escassa enquanto perdurarem as medidas de contenção do COVID19. Observa-se que as autoridades públicas têm determinado, por exemplo, uma redução nos serviços de transporte público, a imposição de toques de recolher e outras providências que restringem a livre circulação das pessoas.

É claro que esse estado de coisas pode implicar numa diminuição de trabalhadores nas fábricas, reduzindo assim os estoques e a disponibilidade de alguns bens contratados pela Administração Pública antes do agravamento da pandemia do COVID19. Nesse contexto, é de se esperar alguma dificuldade em se cumprir os prazos de entrega firmados entre o Poder Público e a iniciativa privada nos contratos de fornecimento.

Ainda, não se pode perder de vista que a nossa economia é altamente globalizada. Diversos bens montados e distribuídos no mercado interno demandam insumos adquiridos fora do país. Computadores fabricados no Brasil, por exemplo, podem ser compostos por processadores e placas produzidas no mercado externo.

Esses bens, compostos por insumos produzidos fora do país, estão especialmente sujeitos aos efeitos econômicos da pandemia do COVID19.

Isso porque diversos centros de industrialização e de fornecimento de insumos passaram pelo ápice da contaminação antes do Brasil, suspendendo a produção industrial e a circulação de pessoas há certo tempo – é o caso da China –, o que gerou algum desabastecimento do mercado internacional.

Assim, é possível que tenha havido setorialmente aumento dos custos de produção – e consequentemente de fornecimento – em razão da redução da oferta e da manutenção da demanda a nível global.

É preciso considerar também que vários países estão com as fronteiras fechadas, que as companhias aéreas têm cancelado muitos voos internacionais e que a economia mundial está desaquecida (também) em virtude da pandemia do COVID19.

Tudo isso gera dificuldades na importação dos insumos necessários para a fabricação e montagem de diversos produtos no Brasil, o que atrasa e encarece a produção, e consequentemente, gera problemas nos contratos de fornecimento firmados com a Administração Pública.

Some-se a isso os efeitos da extraordinária variação cambial decorrente da pandemia do COVID19. No último mês, o valor do dólar comercial saltou de R$ 4,3916 para R$ 5,0274. Essa escalada, é claro, torna mais onerosa importação de insumos e impacta no custo da produção de bens, o que tem efeitos nos contratos de fornecimento firmados com a Administração Pública.

Por todos estes motivos, o surgimento de crises nos contratos de fornecimento firmados com a Administração Pública é inevitável e reclamará das empresas a construção de soluções jurídicas capazes de mitigar os efeitos econômicos da pandemia.

 

3. Perspectivas de Prorrogação do Prazo de Execução do Contrato.

Tomando-se por base a Lei nº 8.666/93, que contém regras gerais sobre licitações e contratos, chama a atenção o contido no seu art. 57, § 1º, inc. II, o qual admite a prorrogação das etapas de execução e conclusão dos contratos, no caso de “superveniência de fato excepcional ou imprevisível, estranho à vontade das partes, que altere fundamentalmente as condições de execução do contrato”.

Ao comentar o dispositivo, Marçal Justen Filho destaca que “O inc. II [do § 1º, do art. 57] prevê a força maior ou caso fortuito. Trata-se da ocorrência de um fato excepcional e imprevisível, estranho à vontade das partes e que impossibilite o cumprimento dos prazos anteriormente previstos” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos [livro eletrônico]: 3. Ed [baseada na 18. ed. Impressa]. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019. Comentários ao art. 57, item 9.3)

Ou seja: sempre que algum acontecimento imprevisível, excepcional e alheio à vontade das partes recair sobre a relação contratual, impossibilitando a observância dos prazos originalmente pactuados, cabe à Administração Pública prorrogar esses prazos.

Considerando a imprevisibilidade e a excepcionalidade da pandemia do COVID19, e em se comprovando o impacto dela sobre a exequibilidade dos prazos contratuais originalmente fixados, considera-se legítima a realização de prorrogações em prazos de execução e entrega de bens à Administração Pública, com fundamento no art. 57, § 1º, inc. II, da Lei nº 8.666/93.

 

4. Possibilidade de Suspensão dos Prazos Contratuais, com Consequente Prorrogação do Contrato.

Nos casos mais extremos, pode a Administração Pública, de ofício, determinar a suspensão dos prazos contratuais. A autorização está contida implicitamente no art. 78, inc. XIV, da Lei nº 8.666/93, e poderá ter duração enquanto perdurarem os efeitos do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 06/2020.

Eventual suspensão por iniciativa da Administração Pública, é claro, deverá resultar na prorrogação de prazos contratuais. Ademais, cogita-se que, nesses casos, o particular contratado requeira indenização por todos os prejuízos, regularmente comprovados, decorrentes da suspensão da execução do contrato.

Essa pretensão encontra amparo, por exemplo, no acórdão proferido no Recurso Especial nº 734.696, cuja ementa indica que “embora legítima a interrupção contratual, impõe-se o dever de indenizar os prejuízos suportados pelo particular em decorrência da paralisação, para resguardar a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato.” (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 734.696/SP. Relatora Ministra Eliana Calmon. j. em 16/10/2007. Brasília: Diário Oficial de Justiça eletrônico, 07/04/2009).

Mesmo os problemas causados pela variação cambial podem encontrar solução na disciplina da Lei nº 8.666/93, cujo art. 65, inc. II, “d”, da Lei nº 8.666/93, resguarda o direito de realinhamento da equação econômico-financeiro de contratos administrativos, em favor do particular contratado, sempre que ela for afetada “[…] fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual”.

É bem verdade que o Tribunal de Contas da União entende que a flutuação do valor da moeda estrangeira, por si só, não caracteriza fato imprevisível apto a ensejar o reequilíbrio econômico-financeiro de contratos administrativos.

Entretanto, o próprio TCU admite que situações excepcionais, em que a variação cambial fugir fuja à normalidade do regime de câmbio flutuante, e gerar onerosidade excessiva ao particular contratado, podem ser classificadas como “fato previsível, mas de consequências incalculáveis”, e justificar a realização de revisões nos preços contratuais.

A variação da taxa cambial, para mais ou para menos, não pode ser considerada suficiente para, isoladamente, fundamentar a necessidade de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato. Para que a variação do câmbio seja considerada um fato apto a ocasionar uma recomposição nos contratos, considerando se tratar de fato previsível, deve culminar consequências incalculáveis (consequências cuja previsão não seja possível pelo gestor médio quando da vinculação contratual) , fugir à normalidade, ou seja, à flutuação cambial típica do regime de câmbio flutuante e, sobretudo, acarretar onerosidade excessiva no contrato a ponto de ocasionar um rompimento na equação econômico-financeira, nos termos previstos no art. 65, inciso II, alínea d, da Lei 8.666/1993.(BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão nº 1.431/2017 – Plenário. Relator Ministro Vital do Rêgo. j. em 05/07/2017. Brasília: Diário Oficial da União de 15/12/2017)

 

5. Conclusão

Isso tudo denota que a legislação vigente dá solução para uma série de problemas que se materializarão nos contratos de fornecimento firmados com a Administração Pública em virtude da pandemia do COVID19. Assim, o empresário atento, e bem assessorado, pode mitigar consideravelmente os riscos dos efeitos negativos da crise que se impõe.

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