Em janeiro deste ano, após 16 anos de seu lançamento (outubro de 2008), a principal criptomoeda, o bitcoin, alcançou o marco histórico de U$ 100.000,00 (cem mil dólares). Muita coisa aconteceu neste período, desde o pagamento de 10.000 bitcoins por uma pizza, em maio de 2010, até a criação de fundos para investimentos nas criptomoedas (ETF), os quais são negociados oficialmente na B3, a bolsa de valores brasileira.
Defensores do dinheiro eletrônico costumam ressaltar alguns benefícios da alternativa em relação ao dinheiro tradicional. Destaca-se, dentre os benefícios, a possibilidade de realizar transações sem intermediários (descentralizadas), como as instituições bancárias, o que reduziria o custo e aumentaria, em tese, a eficiência do mercado. Ainda, qualquer pessoa poderia participar deste mercado, com nível de acessibilidade global, e, também, a tecnologia da criptografia permitiria a rastreabilidade e dificultaria alterações ou falsificações em transações, indicando a segurança desses ativos.
Entretanto, nem tudo são flores. Todos os dias dezenas de notícias inundam os jornais mundo afora com histórias de esquemas de pirâmides (promessas de lucro rápido que dependem de novos integrantes no esquema para financiar os investidores primários); golpes virtuais, que visam obter chaves ou informações pessoais por meio de programas fraudulentos ou sites falsos; ou, também, fraudes em exchanges, as famosas plataformas que permitem os investimentos em criptomoedas, as quais podem ser alvos de ataques externos ou até mesmo de seus próprios administradores, que por vezes desaparecem com todos os investimentos.
Não bastasse isso, esse mercado incipiente é bastante volátil.
De acordo com o site Época Negócios, em poucos dias de negociação, a memecoin $Trump, moeda lançada pelo Presidente dos Estados Unidos Donald Trump, movimentou aproximadamente U$ 100.000.000,00 (cem milhões) de dólares em taxas de negociação. De um lado, dados da blockchain apontam que 50 dos maiores investidores puderam alcançar lucros de US$ 10 milhões cada, enquanto cerca de 200 mil carteiras angariaram prejuízo com a negociação, a maior delas com pequenas participações.
Percebe-se, portanto, que junto às oportunidades existem grandes riscos. O investimento nesta categoria depende do conhecimento e da tolerância ao risco do investidor, que pode ser mitigado limitando o aporte na categoria a uma pequena parte do patrimônio.
Entretanto, no Brasil, não foram poucas as pessoas que nos últimos anos perderam tudo o que conquistaram em décadas de trabalho, ou quase tudo.
Embora a Lei n.º 14.155/21 tenha inserido no Código Penal a figura da fraude eletrônica, isto é, quando o estelionato é cometido com a utilização de informações fornecidas por meio eletrônico, com penas de 04 a 08 anos, e no ano seguinte a Lei n.º 14.478/22 tenha criado o tipo penal do art. 171-A, que consiste em “Organizar, gerir, ofertar ou distribuir carteiras ou intermediar operações que envolvam ativos virtuais, valores mobiliários ou quaisquer ativos financeiros com o fim de obter vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento”, com pena de igual gravidade, o que se constata nos processos e inquéritos em andamento que tratam desses crimes é a incapacidade de restituir o prejuízo causado à vítima.
Por conta das características festejadas por muitos, como a descentralização e a desburocratização, o criptoativo é facilmente ocultado ou dispersado, dificultando a sua rastreabilidade e recuperação. Inclusive, estima-se que seu uso em atividades ilegais esteja crescendo, especialmente por parte de organizações criminosas, que podem usufruir das criptomoedas para promover a movimentação de seu patrimônio ilícito, atos que configuram o crime de lavagem de dinheiro.
Nesse sentido, o CNJ está desenvolvendo um novo Sistema, chamado de Criptojud, para agilizar o bloqueio e liquidação de criptoativos em processos, seja penal ou cível. Mesmo assim, ainda que seja uma iniciativa necessária e louvável do Poder Judiciário, cabe recordar que os ativos digitais podem ser armazenados em carteiras “offline”, as chamadas cold wallets, que consistem em dispositivos de armazenamento capazes de guardar o ativo, acessíveis exclusivamente mediante senha do portador.
De outro lado, é necessário ressaltar que a vítima pode e deve contar com o auxílio de um advogado especializado caso seja alvo de algum crime relacionado a seus investimentos, especialmente em criptomoedas, já que a demora na investigação consequentemente reduz drasticamente a chance de recuperar o patrimônio.
Além de buscar elementos que comprovem o crime e sua respectiva autoria, é possível que a vítima promova, diretamente, os pedidos de bloqueio de bens para futuro ressarcimento. As denominadas medidas cautelares patrimoniais permitem que mesmo antes do início do processo, ou seja, ainda na etapa investigatória do inquérito, eventual patrimônio adquirido ilicitamente pelo suspeito possa ser indisponibilizado, para que após a sentença seja revertido à vítima, em compensação aos seus prejuízos.