Delatado deve apresentar alegações finais por último, define STF

Entenda os motivos que levaram o STF a anular a decisão de primeiro grau e determinar o retorno dos autos à fase de alegações finais.
Henrique-Dumsch-Plocharski

Henrique Plocharski

Advogado da área penal empresarial

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Síntese

Em Habeas Corpus impetrado pela defesa de réu delatado, por maioria, o plenário do STF definiu que a fase de alegações finais deve seguir a ordem constitucional sucessiva, qual seja, acusação, delator e por fim deletado.

Comentário

Entre o final de setembro e o início deste mês de outubro, os holofotes da mídia se voltaram para o julgamento no Supremo Tribunal Federal – STF do Habeas Corpus nº 166.373, que foi divulgado por parte da imprensa sensacionalista como o “julgamento que poderia anular condenações da Lava Jato”.

Ainda que a controvérsia jurídica pudesse se resumir à ordem de apresentação das alegações finais no processo penal –– especialmente quando há participação de réu delator no processo (questão esta exclusivamente técnica) ––, o embate foi muito mais profundo em razão das consequências que tal decisão poderá ter como precedente para outros casos.

É neste aspecto que reside a preocupação de como se dará a repercussão desta decisão em relação a outros casos já julgados e com condenação, o que ainda não foi totalmente definido pelo Tribunal.

No que se refere ao mérito da decisão, se for analisado detidamente o andamento processual, é possível afastar um dos fundamentos do voto do Min. Fachin para denegar o habeas corpus (que foi seguido por Barroso, Fux e Marco Aurélio).

Houve prejuízo e a defesa assim se insurgiu tempestivamente contra a ilegalidade: “O Ministério Público ofereceu denúncia em junho de 2017. Ao final da instrução, mais especificamente em 14 de novembro de 2017, o magistrado determinou prazo comum para apresentação das alegações finais, o que foi prontamente impugnado no processo pela defesa, que teve seu pedido para postergar as alegações finais negado pelo magistrado de primeiro grau com fundamento na ausência de previsão legal (seja no CPP ou na Lei nº 12.850/13).”

Isso ensejou uma série de recursos, quais sejam: (I) Recurso de Habeas Corpus perante o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (dezembro/2017), (II) Recurso ordinário perante o Superior Tribunal De Justiça (maio/2018) e, igualmente, após publicação da sentença que condenou o réu, a questão também foi suscitada em tese preliminar na (III) Apelação (fevereiro/2019).

Ainda que o artigo 403 do Código de Processo Penal não estabeleça expressamente o momento em que deve o delator apresentar suas alegações finais (tampouco o faz a Lei nº 12.850/13), fato é que a ideia geral de que a defesa fala por último é inquestionável, ainda mais se este dispositivo processual for lido em consonância com o art. 5º, inciso LV da Constituição (direito ao contraditório e ampla defesa).

Embora o delator não seja parte da acusação, também não pode ser tido como um mero acusado. Afinal, o delator é alguém que, antes mesmo do processo, formulou acordo com o órgão de persecução e, para obter os benefícios pactuados, se esforçará para obter a confirmação judicial da hipótese acusatória. O momento final de sua versão é justamente a alegação final, onde apresentará a tese definitiva de sua colaboração que, sem sombra de dúvidas, influenciará a convicção do magistrado.

Recorde-se, igualmente, que não há possibilidade de impugnação prévia dos acordos de colaboração premiada por parte dos delatados; logo, a defesa desses acordos deverá ocorrer, inevitavelmente, no decorrer da instrução e após a formação definitiva da tese do colaborador, sem olvidar a importância de definir também o momento da oitiva do colaborador.

É por tais circunstâncias que o STF anulou a decisão de primeiro grau, determinando o retorno à fase de alegações finais, já que não poderia ter o magistrado negado o direito do delatado se manifestar posteriormente ao delator.

O direito a falar por último se insere no exercício da mais plena defesa, ao permitir refutar todas as informações, depoimentos, provas ou indícios que possam influenciar na futura decisão, dentre as quais as alegações do delator.

Como bem salientou o Min. Dias Toffoli, “A par dessas premissas, penso que a oitiva dos acusados delatados deve necessariamente ser realizada em momento posterior ao interrogatório do acusado colaborador, como ocorreu na espécie, sendo que, essa mesma lógica processual, em prol da ampla defesa e de um efetivo contraditório, deve ser assegurada aos acusados delatados na fase das alegações finais”, concluindo que o paciente se insurgiu oportunamente contra a questão, percorrendo toda a cadeia processual até chegar ao STF.

Por fim, no que se refere à pretensão de modulação dos efeitos, deve-se observar que a decisão proferida em âmbito de habeas corpus repousou sobre a aplicação concreta de regra processual. Assim, deve ocorrer sua aplicação retroativa se constatada a violação –– caso tenha influenciado na apuração da verdade ou na decisão da causa, conforme dispõe o art. 566 do CPP ––, não dependendo, tão somente, de subjetiva “demonstração de prejuízo”.

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