Disputas judiciais envolvendo os grandes geradores de resíduos sólidos

Compreenda os temas levados à discussão judicial envolvendo grandes geradores de resíduos sólidos.
Bruno-Marzullo-Zaroni

Bruno Marzullo Zaroni

Head da área de contencioso e arbitragem

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A Lei n.º12.305/2010 instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que engloba diretrizes, princípios, objetivos e instrumentos para a gestão e gerenciamento adequado dos resíduos sólidos. A PNRS integra a Política Nacional do Meio Ambiente e está relacionada à Política Nacional de Educação Ambiental e à Política Federal de Saneamento Básico.

Tal norma jurídica estabeleceu ainda metas e ações a serem implementadas pelo Governo Federal, isoladamente ou em cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou entidades privadas com o objetivo de alcançar a gestão integrada e o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos.

A legislação federal torna obrigatória a elaboração de planos municipais e estaduais de gestão de resíduos sólidos, estabelece critérios da logística reversa para implementar o conceito de responsabilidade compartilhada ___ incluindo o setor produtivo e os consumidores na gestão ___ e determina instrumentos econômicos para fomentar os serviços de gestão.

A observância da lei é cogente para pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, que sejam responsáveis, direta ou indiretamente, pela geração de resíduos sólidos ou que desenvolvam atividades relacionadas à gestão integrada ou ao gerenciamento desses resíduos.

Dentro desse microssistema legal de responsabilidade compartilhada entre entes públicos e privados, figuram os geradores de resíduos sólidos de grande porte, entendidos aqui como agentes que produzem quantidade significativa de resíduos sólidos em suas operações diárias. Enquadram-se no conceito, via de regra, indústrias, complexos comerciais, instituições de saúde, estabelecimentos de ensino, aeroportos, terminais de transporte e grandes estabelecimentos hoteleiros, entre outros.

A caracterização como gerador de resíduos sólidos de grande porte, regulamentada por legislação municipal, leva em conta a quantidade e a natureza dos resíduos que determinado sujeito produz (resíduos industriais, resíduos de construção e demolição, resíduos hospitalares, resíduos eletrônicos, resíduos alimentares, resíduos de embalagens). A título exemplificativo, a Lei Municipal de São Paulo 13.478/2002 e seus decretos consideram grandes geradores os estabelecimentos comerciais com produção de resíduos acima de 200 litros por dia, assim como condomínios não-residenciais ou de uso misto cuja soma dos resíduos sólidos gerados pelas unidades autônomas totalize o volume médio diário igual ou superior a 1.000 litros.

Devido à quantidade e diversidade dos resíduos produzidos, os grandes geradores estão sujeitos a regras que impõem a adoção de medidas adequadas para o manejo, acondicionamento, transporte, tratamento e disposição final dos resíduos sólidos. Tais regras, dispersas em legislações federais, estaduais e municipais, visam o cumprimento das normas e diretrizes atinentes à gestão adequada dos resíduos e, em última análise, a redução dos impactos negativos ao meio ambiente e à saúde pública.

Feita essa breve conceituação, interessa aqui identificar, num nível panorâmico, os questionamentos levados à discussão em âmbito judicial envolvendo grandes geradores de resíduos sólidos. A partir da amostragem jurisprudencial, é possível isolar os conflitos de maior recorrência, conforme delineado abaixo:

  • Processos tratando da cobrança e isenção de taxa de coleta, remoção e destinação de resíduos sólidos domiciliares (TRSD);
  • Processos em que se discute o enquadramento de determinada pessoa jurídica como grande geradora de resíduos sólidos para tratar das consequências daí decorrentes, tais como infrações, incidência de tributos e a responsabilidade pelo tratamento dos resíduos sólidos;
  • Processos discutindo a interdição por descumprimento de normas de tratamento de resíduos sólidos;
  • Processos em que se discute o dever de ressarcir o Poder Público pela realização de coleta e destinação de resíduos sólidos decorrentes do exercício de atividade econômica desenvolvida por gerador de resíduos de grande porte;
  • Processos versando sobre a legalidade ou constitucionalidade de lei que disciplina os geradores de resíduo sólido de grande porte;
  • Processos em que se debate o método de quantificação do volume de lixo produzido.

Do universo analisado, é possível perceber que parcela representativa dos litígios versa sobre a divergência a respeito do enquadramento de determinada pessoa jurídica como grande geradora de resíduos sólidos e as suas consequências. A inclusão em tal categoria atrai inúmeros deveres legais (tal como o de elaborar um plano de gerenciamento e dar tratamento aos resíduos produzidos) que, caso descumpridos, podem dar ensejo a sanções diversas.

Do ponto de vista preventivo, a maioria destas disputas judiciais poderia ser evitada ou, quanto menos, redundar em resultados favoráveis pela adoção de precauções simples, tal como a aferição técnica e documentação do quantitativo de resíduos gerados. Como discussões judiciais sobre o enquadramento comumente exigem instrução probatória, a conservação preventiva de provas (laudos de aferições, registros e imagens) tem função crucial.

Outro significativo conjunto de processos diz respeito à incidência ou não da TRSD. De regra, a legislação confere isenção da taxa aos grandes geradores de resíduos sólidos desde que cumpram certas exigências. Além de promover o cadastro perante o órgão público competente, devem assumir a responsabilidade pela coleta, transporte, tratamento e destinação dos respectivos resíduos sólidos.

A análise processual revela, no entanto, que a negligência quanto a obrigações acessórias singelas (o cadastramento e suas respectivas renovações) resulta em autuações e execuções fiscais. Isso significa que o mero planejamento e gestão quanto a tais obrigações eliminaria grande parcela das discussões judiciais.

Dessa breve exposição, denota-se que os assuntos levados à discussão em âmbito judicial norteiam pontos recorrentes relacionados tanto a questões fiscais quanto ao enquadramento do porte das entidades geradoras de resíduos. Esses conflitos, no entanto, não repercutem apenas no plano jurídico. As externalidades são variadas e tocam temas sensíveis para as empresas, como a responsabilidade ambiental e a adequação a boas práticas de ESG.

Embora os casos mencionados não abranjam a integralidade dos potenciais conflitos, fornecem uma chave para a compreensão de seus traços essenciais. A partir disso, as empresas podem mapear e avaliar adequadamente sua matriz de riscos, adotando medidas preventivas e estratégias para mitigar potenciais litígios relacionados à gestão de resíduos sólidos.

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Legal disputes involving large solid waste generators.

Law 12.305/2010 instituted the National Solid Waste Policy (PNRS) in Brazil, encompassing guidelines, principles, objectives, and instruments for managing and properly handling solid waste. The PNRS is part of the National Environmental Policy and is related to the National Environmental Education Policy and the Federal Basic Sanitation Policy.

It also establishes goals and actions to be implemented by the Federal Government, either independently or in cooperation with states, the Federal District, municipalities, or private entities, to achieve integrated waste management and environmentally sound waste disposal.

The federal legislation makes it mandatory to develop municipal and state plans for solid waste management, establishes standards for reverse logistics and determines economic instruments to promote waste management services. Compliance with the law is mandatory for individuals or legal entities, both public and private, who are directly or indirectly responsible for generating solid waste or engaged in integrated waste management or disposal activities.

Large waste generators are included in this legal framework of shared responsibility. Here, they are understood as entities that produce significant solid waste in their daily operations. This concept generally comprises industries, shopping establishments, healthcare institutions, educational establishments, airports, transport terminals, and large hotel establishments.

The classification as a large waste generator, regulated by municipal legislation, considers the quantity and nature of the waste they produce (industrial, construction and demolition, healthcare, electronic). As an illustrative example, the Municipal Law of São Paulo (Law 13.478/2002) consider commercial establishments with waste production above 200 liters per day as large generators, as well as non-residential or mixed-use condominiums whose total solid waste generated by individual units reaches an average daily volume equal to or greater than 1,000 liters.

Due to the quantity and diversity of the waste produced, large waste generators are subject to rules that impose the adoption of appropriate measures for waste handling, storage, transportation, treatment, and final disposal. These rules, dispersed throughout federal, state, and municipal legislation, aim to reduce negative impacts on the environment and public health.

Based on this brief overview, it is essential to identify, from a panoramic perspective, the issues brought to judicial discussion involving large waste generators. By analyzing case law, it is possible to insulate the most recurring conflicts, as outlined below:

  • Cases dealing with the collection fee and exemption for household solid waste collection, removal, and disposal (TRSD).
  • Cases discussing the classification of a particular legal entity as a large quantity generator, addressing consequences such as violations, tax liability, and responsibility for waste treatment.
  • Cases discussing the closure due to non-compliance with solid waste treatment regulations.
  • Cases debating the duty to reimburse the government for waste collection and disposal resulting from economic activities carried out by a large waste generator.
  • Cases concerning the legality or constitutionality of laws regulating large waste generators.
  • Cases discussing the method of quantifying the volume of waste produced.

Based on the set of cases analyzed, it can be concluded that a significant portion of the disputes revolves around the disagreement regarding the classification of a legal entity as a large quantity generator and its consequences. Inclusion in this category entails various legal obligations, such as developing a waste management plan and properly treating the waste produced. Failure to comply with these obligations can lead to various sanctions.

From a preventive standpoint, most of these legal disputes could be avoided or, at the very least, result in favorable outcomes by adopting simple safeguards, such as technical measurement and documentation of the quantity of waste generated. Since legal discussions regarding classification of a particular legal entity as a large quantity generator commonly require evidence, the active preservation of evidence (measurement reports, records, and images) plays a crucial role.

Another significant set of cases relates to the TRSD (tax) incidence. As a rule, the legislation grants exemption from the tax to large waste generators, provided specific requirements are met. In addition to registering with the competent public authority, they must assume responsibility for collecting, transporting, treating, and disposing of their respective solid waste.

However, case law analysis reveals that negligence regarding minor ancillary obligations (registration and its respective renewals) results in fines and tax executions. This indicates that mere planning and management of these obligations would eliminate many legal disputes.

This brief exposition shows that the subjects brought to judicial discussion focus on recurring points related to fiscal issues and the classification of waste-generating entities. However, these conflicts have repercussions beyond the legal realm. The externalities are varied and touch on sensitive topics for companies, such as environmental responsibility and adherence to good ESG practices.

Although the mentioned cases do not cover the potential conflicts, they provide the key to understanding their essential traits. Based on this, companies can adequately map and assess their risk matrix, adopting preventive measures and strategies to mitigate potential litigation related to solid waste management.

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