Do conflito familiar ao processo judicial: riscos de um planejamento sucessório mal-executado

Caso recente expõe as consequências de um planejamento sucessório que não leva em consideração as regras do direito de família e sucessório.
Bruno-Herzmann-Cardoso

Bruno Herzmann Cardoso

Advogado egresso

Ana-Luisa-Lopes-Gomes

Ana Luisa Lopes Gomes

Advogada da área de estruturação de negócios

Compartilhe este conteúdo

Da equipe de estruturação de negócios do Vernalha Pereira

O Tribunal de Justiça do Mato Grosso foi recentemente chamado a resolver um conflito familiar delicado: um proeminente produtor de soja do país, detentor de um vasto patrimônio, foi acusado de tentar contornar a lei de sucessões ao transferir seus bens aos herdeiros em vida, sem incluir na divisão um filho concebido fora do casamento. O herdeiro alegadamente prejudicado buscou a justiça para exigir que seu pai prestasse contas de todos os bens doados, visando verificar se seus irmãos de fato receberam uma parcela maior do que a que lhes caberia.

O adiantamento de herança em vida tem se tornado uma prática comum entre os empresários brasileiros. Através do planejamento sucessório, um conjunto de estratégias jurídicas é empregado para estabelecer critérios de divisão e partilha do patrimônio entre os herdeiros, antecipando a resolução de questões sucessórias que surgiriam apenas com a abertura do inventário após o falecimento, evitando principalmente a judicialização da herança.

As estratégias adotadas podem abranger a criação de holdings patrimoniais para consolidar e centralizar a propriedade de diversos ativos, como imóveis, veículos e investimentos, ou a constituição de holdings com participação em empresas, cujas quotas/ações são posteriormente doadas aos herdeiros, com usufruto reservado ao patriarca ou matriarca e outras proteções de controle. Dependendo das circunstâncias, outros instrumentos podem ser empregados, incluindo testamentos, fundos de investimentos e até mesmo a criação de estruturas offshore ou trusts no exterior.

Entretanto, ao planejar o patrimônio, é crucial considerar os aspectos do direito de família, tais como os regimes matrimoniais e as regras de filiação e participação dos filhos na herança. No caso mencionado na introdução, ainda que todos os atos do planejamento sucessório tenham sido praticados regularmente sob o ponto de vista formal, o Tribunal deu razão ao filho concebido fora do casamento e determinou a prestação de contas, o que pode ter impactos significativos não só para o patriarca, mas para todos os demais herdeiro. Embora o caso ainda esteja em trâmite e admita alterações no futuro, serve como lição de que, mesmo que o planejamento seja sólido do ponto de vista empresarial, contratual e societário, as questões familiares podem ter um impacto direto e podem levar à anulação dos atos realizados na reorganização do patrimônio.

Além disso, a Reforma Tributária aprovada recentemente prevê a possibilidade de aumento gradual do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre grandes patrimônios, o que configura uma janela de oportunidade para a implementação de estratégias de planejamento sucessório antes que essas mudanças entrem em vigor.

Assim, é certo que o planejamento sucessório deve ser feito por uma equipe jurídica multidisciplinar, capaz de compreender a realidade da família e os desdobramentos jurídicos, societários, tributários, contratuais e familiares dessa realidade nos atos de reorganização patrimonial.

A área de Estruturação de Negócios permanece à disposição para esclarecer sobre este e outros temas de interesse de seus clientes e parceiros institucionais.

Gostou do conteúdo?

Faça seu cadastro e receba novos artigos e vídeos sobre o tema
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.