É válido o acordo coletivo que estende a jornada de ferroviários além da sexta hora diária?

Em decisão recente, o TST entendeu que há validade na jornada de oito horas diárias em caso de revezamento de turnos ininterruptos.
Vinícius Zanon Rodrigues

Vinícius Zanon Rodrigues

Advogado da área de direito do trabalho

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Síntese

Ao julgar o Agravo de Instrumento em Recurso de Revista apresentado por um ex-empregado de empresa ramo ferroviário, os ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) acataram a tese empresarial e mantiveram a improcedência do pedido de pagamento de hora extra ao ex-funcionário que fora enquadrado na alínea “b” do artigo 237 da CLT, mas por força de acordo coletivo para o elastecimento da jornada de trabalho, sua jornada foi estabelecida em oito horas diárias.

Comentário

O correto enquadramento do trabalhador ferroviário nas categorias previstas nas alíneas “b” e “c” do artigo 237 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) gera muita controvérsia, visto que, dentre outras regras, há a previsão da jornada especial de seis horas diárias.

Na reclamação trabalhista objeto da decisão em análise, o autor alegou que as suas jornadas de trabalho se constituíam em escalas de revezamento e em turnos ininterruptos, alterando diuturnamente seus horários e dias de trabalho. Consta, ainda, que o trabalhador está enquadrado na alínea “b” do artigo 237 da CLT, ou seja, “pessoal que trabalhe em lugares ou trechos determinados e cujas tarefas requeiram atenção constante; pessoal de escritório, turmas de conservação e construção da via permanente, oficinas e estações principais, inclusive os respectivos telegrafistas; pessoal de tração, lastro e revistadores.”.  Em razão disso, o autor entende ser merecedor do pagamento de horas extras, a contar da sexta hora trabalhada na jornada diária, observando, para tanto, que é beneficiário da jornada reduzida de seis horas, prevista no inciso XIV do artigo 7º da Constituição Federal.

Por outro lado, a empresa alega que, como o ex-empregado se enquadrava na alínea “c” do artigo 237 da CLT, ou seja, “equipagens de trens em geral”, a sua jornada é de oito horas e o turno cumprido tão somente trata-se de escalas. Sustenta, ainda, que houve negociação coletiva com o sindicato da categoria e foi aprovada a extensão da jornada para oito horas diárias.

A discussão nos autos margeia o tema de correto enquadramento funcional e a decorrência das horas extras acima da sexta hora diária.

Antes de adentrar na análise da decisão, é importante destacar o conceito de turno e ininterrupto. Por ininterrupto entende-se o sistema contínuo, habitual, seguido, de trabalho de turnos. Trabalho por turno, por sua vez, significa um modo de organização da atividade em virtude da qual grupos e equipes de trabalho se sucedem na mesma empresa, na utilização do mesmo equipamento, em forma de revezamento, em virtude do chamado ritmo circadiano e em trabalho executado de forma ininterrupta.

Superado o conceito acima, importante destacar que o artigo 7º, XIV da Constituição Federal estabelece a jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva.

Podemos observar que o legislador fez expressa referência à possibilidade de negociação da jornada de trabalho de turnos ininterruptos de revezamento com carga horária superior a seis horas diárias.

E, se há referida autorização legal, não há como o Judiciário simplesmente ignorar a norma, devendo ter validade, neste particular, a norma convencional que prevê a duração de oito horas de jornada de trabalho para turnos ininterruptos de revezamento.

A argumentação acima foi base para o juiz de primeira instância negar o pedido do trabalhador, visto que, em que pese o trabalhador estar incluído no artigo 237, “b” da CLT, a sua jornada normal deverá ser aquela prevista convencionalmente, ou seja, de oito horas diárias. A referida decisão foi mantida em segunda instância sob a mesma fundamentação.

Em recente decisão, o Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao recurso do ex-empregado e manteve a improcedência do pedido de horas extras. Os ministros da Corte fundamentaram a decisão no acordo coletivo que autorizou a jornada de oito horas diárias, bem como na previsão da Súmula 423, também do Tribunal Superior do Trabalho, onde consta que “estabelecida jornada superior a seis horas e limitada a oito horas por meio de regular negociação coletiva, os empregados submetidos a turnos ininterruptos de revezamento não têm direito ao pagamento da 7ª e 8ª horas como extras.”.

Tal julgamento vem reforçar que as empresas devem estar atentas ao correto enquadramento de seus funcionários, bem como observar e acompanhar de perto as negociações coletivas com o sindicato da categoria. Trata-se de um importante trabalho de prevenção que pode mitigar riscos e impactar diretamente nos resultados.

A área de Direito do Trabalho do Vernalha Pereira vem auxiliando empresas com a consultoria preventiva e está à disposição para esclarecer as dúvidas e aprofundar mais sobre temas trabalhistas do setor de infraestrutura e ferrovias, bem como demais setores e assuntos de interesse de seus clientes e parceiros institucionais.

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