Entenda as novidades do Marco Regulatório Trabalhista Infralegal

O Decreto 10.854/2021, publicado em 11/11/2021, busca simplificar e desburocratizar as normas trabalhistas infralegais.
Heloísa Dias - Versão Site

Heloísa Dias Lapunka

Advogada egressa

Geovana-de-Carvalho

Geovana de Carvalho Filho

Advogada da área de direito do trabalho

Compartilhe este conteúdo

Da equipe de direito do trabalho do Vernalha Pereira

Em 11/11/2021, foi consolidado o Marco Regulatório Trabalhista Infralegal, por meio da publicação do Decreto 10.854/2021. Aproximadamente mais de mil atos – entre portarias, instruções normativas e decretos – foram revisados e consolidados, sendo que mais de 30 Decretos foram revogados. Além disso, o Decreto 10.854/2021 instituiu o Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas Infralegais no âmbito do Ministério do Trabalho e Previdência.

Com a instituição de tal Programa, as normas trabalhistas infralegais serão organizadas e compiladas em coletâneas, dividindo-se nos seguintes temas: a) legislação trabalhista, relações de trabalho e políticas públicas de trabalho; b) segurança e saúde no trabalho; c) inspeção do trabalho; d) procedimentos de multas e recursos de processos administrativos trabalhistas; e) convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho – OIT; f) profissões regulamentadas; e g) normas administrativas.

Dentre as mudanças trazidas pelo Decreto, é possível destacar algumas regras relativas ao registro eletrônico de jornada, ao vale-alimentação, ao vale-transporte e ao livro inspeção do trabalho, além de um reforço aos regramentos sobre terceirização.

No tocante ao registro eletrônico de controle de jornada, o Decreto foi expresso ao estabelecer que os equipamentos e sistemas de controle não poderão exigir prévia autorização para sobrejornada. Possibilitou, ainda, a pré-assinalação do período de intervalo e a utilização do ponto por exceção.

Quanto a esse último, cabe pontuar que a Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) já havia autorizado o seu emprego, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho (art. 74, §4º, da CLT). Na prática, uma vez adotado o controle de ponto por exceção, os colaboradores não precisam registrar todo o horário de trabalho, mas apenas as alterações na jornada normal, ou seja, as horas extras, por exemplo.

Destaca-se que, em que pese o ponto por exceção tenha sido autorizado pela Reforma Trabalhista, bem como sua utilização tenha sido reforçada pelo Decreto em comento, tal prática ainda encontra óbice na jurisprudência trabalhista. Desse modo, sua adoção deve ser feita com muita cautela e sempre observando os requisitos estabelecidos no art. 74, §4º, da CLT.

Voltando às mudanças trazidas pelo Marco Regulatório Trabalhista Infralegal, outro ponto que merece destaque é quanto ao vale-transporte. O Decreto estabeleceu, no parágrafo único do art. 108, que o benefício não pode ser utilizado nos serviços de transporte privado coletivo e transporte público individual. Já no artigo 110 ficou estabelecido que é vedado ao empregador “substituir o vale-transporte por antecipação em dinheiro ou qualquer outra forma de pagamento, exceto quanto ao empregador doméstico”, ressalvado no caso de “indisponibilidade operacional da empresa operadora e de falta ou insuficiência de estoque de vale-transporte necessário ao atendimento da demanda e ao funcionamento do sistema”, caso em que o beneficiário será ressarcido pelo empregador.

Dos artigos citados acima, subentende-se que o valor do vale-transporte não poderá ser utilizado para ressarcir o empregado de gastos com Uber e outros aplicativos, por exemplo, salvo no caso de indisponibilidade do sistema operacional ou insuficiência de vale-transporte. Nesses casos, de acordo com o parágrafo único do art. 110, o beneficiário será ressarcido pelo empregador na folha de pagamento imediata, quando tiver efetuado a despesa para o seu deslocamento por conta própria.

No Capítulo destinado ao vale-alimentação e ao Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), o Decreto reforça a necessidade de inscrição prévia da empresa no Ministério do Trabalho e Previdência para usufruir dos benefícios fiscais relacionados ao PAT. Na execução do Programa, o empregador poderá optar por manter serviço próprio de refeições, distribuir alimentos, ou, ainda, firmar contrato com entidades de alimentação coletiva, igualmente registradas.

Da mesma maneira, destacado expressamente o dever das empresas beneficiárias de dispor de programas destinados a promover e monitorar a saúde, além de aprimorar a segurança alimentar/nutricional de seus empregados.

Também relevante o disposto no art. 178 do Decreto, cuja redação deixa claro que a alimentação fornecida in natura pela pessoa jurídica beneficiária do PAT não tem natureza salarial, não se incorpora à remuneração – e, com isso, não gera reflexos em outras verbas trabalhistas -, bem como não constitui base de incidência do FGTS.

Em regra, os recursos repassados ao trabalhador em conta de pagamentos para utilização no âmbito do PAT não podem ser sacados, salvo quando da rescisão do contrato de trabalho, oportunidade em que poderão ser integralmente utilizados, na forma do inciso III do art. 174.

Quanto ao Livro de Inspeção do Trabalho, a novidade está na substituição do documento impresso por aquele disponibilizado em meio eletrônico. O eLIT, como passou a ser chamado o instrumento digital de comunicação com a inspeção do trabalho, se tornará obrigatório a todas as empresas que tenham ou não empregados, a partir de data a ser estabelecida por Ato do Ministro de Estado do Trabalho e Previdência. Aplica-se também aos profissionais liberais e às instituições sem fins lucrativos que admitirem trabalhadores como empregados. As microempresas e empresas de pequeno porte, por sua vez, poderão aderir ao eLIT por meio de cadastro.

Dentre os objetivos do Livro de Inspeção eletrônico estão: simplificar os procedimentos de pagamento de multas administrativas e obrigações trabalhistas, registrar os atos de fiscalização e o lançamento dos seus resultados, possibilitando a rápida consulta, assinalar prazos para o cumprimento de exigências, viabilizar o envio de documentos eletrônicos, permitir a apresentação de defesas e recursos nos processos administrativos, etc.

O uso dos canais eletrônicos também é mencionado no Capítulo que trata da fiscalização das normas de proteção ao trabalho e de saúde e segurança, uma vez que as denúncias sobre irregularidades e os pedidos de fiscalização trabalhista poderão ser veiculados por esse meio, garantida a confidencialidade.

Finalmente, cabe salientar que o ato administrativo presidencial regulamenta disposições relativas às empresas prestadoras de serviços a terceiros, reforçando a inexistência de vínculo empregatício entre os trabalhadores ou sócios dessas empresas e a empresa contratante, independentemente do ramo de suas atividades. A questão da terceirização de atividades-fim e meio já havia sido enfrentada pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2018, e voltou a ser apreciada pela Corte em 2020, tendo sido reconhecida a ampla possibilidade de terceirização de serviços de qualquer espécie, ante a declaração da constitucionalidade da Lei 13.429/2017.

Pode-se afirmar que os requisitos fixados pelo Decreto para a configuração do vínculo de emprego com o tomador dos serviços (empresa contratante), são mais numerosos e, portanto, mais rígidos do que aqueles estabelecidos pela Súmula n. 331, III, do TST. Pela redação do verbete sumular, bastava a comprovação da pessoalidade e da subordinação direta do trabalhador para com o tomador para o reconhecimento do vínculo entre as partes. O Decreto, no entanto, menciona ser imprescindível a caracterização de todos os elementos tradicionais da relação empregatícia: não eventualidade, subordinação jurídica, onerosidade e pessoalidade. A finalidade, evidentemente, é conferir maior proteção às empresas contratantes de serviços terceirizados e impulsioná-las a essas contratações.

Por fim, também na data de ontem (11/10/2021), foram publicados outros atos normativos que integram o Marco Regulatório Trabalhista Infralegal. No entanto, em sua maioria, tratam-se de Portarias e instruções Normativas mais relacionadas à atuação do Ministério do Trabalho e Previdência, merecendo maior destaque as Portarias nº 671 e 672, que dispõem sobre registro de trabalhadores e segurança do trabalho, as quais podem vir a ser objeto de outros Insights.

A área de direito do trabalho permanece à disposição para esclarecer sobre este e outros temas de interesse de seus clientes e parceiros institucionais.

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.