Escolha do árbitro e da Câmara nas arbitragens de saneamento

A escolha do árbitro e da Câmara nas disputas de saneamento deve observar as peculiaridades decorrentes da natureza pública dos contratos.
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Caio César Bueno Schinemann

Advogado da área de contencioso e arbitragem

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Abordou-se, em texto anterior, a natureza jurídica da “ação arbitral” instituída no âmbito da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico pelo novo Marco Legal do Saneamento (Lei n.º 14.026/2020). Demonstrou-se, na ocasião, que a “ação arbitral” em questão não é arbitragem propriamente dita. Trata-se, tão somente, de atividade da Agência que visa à prolação de decisões administrativas a dirimir conflitos que surjam no setor regulado. Há decisão administrativa e não jurisdicional como na arbitragem propriamente dita.

Na mesma ocasião ressalvou-se que, para além da “ação arbitral” (que não é arbitragem), o novo Marco Legal do Saneamento estabelece a possibilidade de submissão dos conflitos desse setor à arbitragem propriamente dita, nos termos do art. 10-A, § 1º, na Lei n.º 11.445/2007.

Justifica-se a utilização da arbitragem sobretudo diante de complexidade técnica e jurídica do litígio que decorre (ou pode decorrer) de determinada relação contratual. É o caso de diversos litígios que podem surgir no âmbito do setor de saneamento em suas disputas de cunho técnico, contratual e regulatório. Há pouca capacidade estrutural do Poder Judiciário em fornecer solução adjudicada adequada a controvérsias altamente especializadas.

A percepção de tal vantagem na arbitragem, por evidente, depende de fator elementar: a formação do painel arbitral. Os árbitros indicados devem ter especialização no setor de saneamento do ponto de vista técnico e jurídico. Essa especialização pode variar a depender do litígio instaurado. Quando a controvérsia é essencialmente técnica, é perfeitamente possível (e até mesmo usual) a indicação de engenheiros para atuar como árbitros. Não se exige que o árbitro tenha formação jurídica. A prática apenas recomenda que o Presidente do Tribunal Arbitral seja jurista com experiência em arbitragem, em razão dos aspectos procedimentais que devem ser observados a fim de possibilitar a prolação de uma sentença arbitral hígida.

O critério da Lei de Arbitragem para dispor acerca daquele que pode ser árbitro, além da capacidade civil, é essencialmente subjetiva: pode ser árbitro aquele que detém a confiança das partes. A confiança estabelecida como requisito diz respeito à compreensão acerca da capacidade do árbitro nomeado em proferir uma decisão que resolva adequadamente o litígio, observada a sua imparcialidade e todas as garantias do contraditório e da ampla defesa.

Todavia, não se pode descuidar que os contratos de saneamento são essencialmente públicos. Tal característica traz à tona alguns questionamentos acerca do processo de indicação dos árbitros pela Administração Pública.

A consideração de determinado sujeito como potencial árbitro a uma demanda envolve um exame essencialmente subjetivo. Trata-se de análise que recai sobre a reputação daquele profissional enquanto altamente especializado na área da disputa. Este grau de subjetividade torna a escolha do árbitro impassível de submissão à lógica de objetividade que é a regra de seleção nos contratos da Administração Pública.

No entanto, não significa absoluta discricionariedade nessa escolha. Estabelece o art. 154 da Lei n.º 14.133/2021 que “o processo de escolha dos árbitros, dos colegiados arbitrais e dos comitês de resolução de disputas observará critérios isonômicos, técnicos e transparentes”. A regra geral das contratações públicas é aplicável ao setor de saneamento.

A escolha do profissional indicado, portanto, deve ser justificada com clareza, apresentando as circunstâncias pertinentes a denotar a pertinência da formação acadêmica e experiência profissional com o tema do litígio instaurado.

Em igual medida ocorre em relação à escolha da Câmara Arbitral. A confiança depositada na instituição é o principal critério para escolher a Câmara de Arbitragem e Mediação, sendo tal aspecto permeado por requisitos subjetivos. É factível que se coloque mais de uma instituição em um mesmo patamar de confiança suficiente para que seja formulada escolha entre estas a partir do custo.

Em conclusão, nas arbitragens de saneamento, a escolha de árbitros e Câmaras de Arbitragem é em alguma medida discricionária, baseada em juízos subjetivos de qualificação, credibilidade e idoneidade dos escolhidos. Essa discricionariedade não pode ser controlada quanto ao conteúdo, mas as decisões devem ser motivadas pelo agente público, que deve indicar claramente os motivos que o levaram a indicar um árbitro ou escolher uma Câmara em detrimento de outra.

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