Governo apresenta Projeto de Lei para tributação das Offshores

O Governo Federal enviou no dia 28 de agosto ao Congresso Nacional um projeto de Lei para tributar o capital de residentes brasileiros aplicados em paraísos fiscais (offshores e trusts), com alíquotas que chegam a 22,5%.
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Bruno Herzmann Cardoso

Advogado egresso

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Maitê Parrilha Strobel

Advogada da área de direito tributário

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Das equipes de direito tributário e estruturação de negócios do Vernalha Pereira

O Governo Federal enviou no dia 28 de agosto ao Congresso Nacional um projeto de Lei para tributar o capital de residentes brasileiros aplicados em paraísos fiscais (offshores e trusts), com alíquotas que chegam a 22,5%.

No Projeto de Lei, a proposta é uma tributação anual dos rendimentos de capital aplicado no exterior com alíquotas entre 0% a 22,5%. Atualmente esse capital apenas é tributado quando resgatado e remetido ao Brasil.

Em abril deste ano o tema já havia sido objeto de discussão com a publicação da MP 1.171/2023, que previa a mesma variação de alíquotas. Isto Porque, o Brasil já possui regras de tributação anual e automática de controladas estrangeiras de pessoas jurídicas, mas ainda não possuía um regramento específico para pessoas físicas.

Entretanto, após resistência na Câmara que a tornou sem eficácia, o Governo decidiu elaborar um projeto de lei enviado em caráter de urgência constitucional à Câmara.

Aplicações financeiras no exterior

Para os fins de tributação, serão consideradas “aplicações financeiras no exterior” todo tipo de conta e depósito bancário e de investimentos, criptoativos e carteiras digitais, participações societárias e cotas de fundos de investimento, títulos de renda fixa e variável, derivativos, instrumentos financeiros e operações de capitalização e de crédito, apólices de seguro, e até mesmo fundos de aposentadoria e pensão; exclui-se dessa definição qualquer hipótese enquadrada na lei como “entidade controlada no exterior”, conforme adiante definido. Contudo, é relevante notar que o rol de definições foi indicado no texto como “exemplificativo”, de forma que, a princípio, outros fenômenos não previstos expressamente poderão ser considerados objeto de tributação.

Por sua vez, os rendimentos que serão objeto da nova tributação proposta incluem todas as remunerações dessas aplicações financeiras no exterior, tais como juros, ágios e deságios, participações nos lucros, dividendos, valorização em mercado secundário, ganhos na venda de ações de entidades não controladas em bolsa de valores, e também variação cambial e até variação de criptomoeda em relação à moeda nacional.

Como se vê, o texto legal se preocupa em abranger todas as hipóteses de atividade econômica no exterior como fontes tributáveis. Em qualquer hipótese, é possível deduzir do IRPF o imposto de renda pago no país de origem dos rendimentos, desde que a compensação esteja prevista em acordo ou convenção internacional, ou que haja reciprocidade de tratamento em relação aos rendimentos produzidos no País.

Trust

O PL 4.173/2023 inova ao propor uma definição legal do “trust” para o Direito Brasileiro, considerado pelo projeto a “figura contratual regida por lei estrangeira que regula a relação entre o instituidor, o trustee e os beneficiários em relação aos bens e direitos mencionados na escritura do trust”. Por meio deste instituto, o instituidor (settlor), por meio de uma escritura de trust (trust deed) e, ocasionalmente, uma carta de desejos (letter of wishes), aloca bens e direitos em favor do trust e indicando determinadas pessoas beneficiárias para receber os bens e direitos e seus frutos, de acordo com as regras e condições por ele definidas. Os bens e direitos ficam sob a administração de uma pessoa indicada pelo instituidor (o trustee), que tem dever fiduciário e a responsabilidade de manter e administrar os ativos de acordo com as definições e requisitos definidos pelo instituidor.

A incidência dos impostos sobre os rendimentos e ganhos de capital sobre os bens e direitos de um trust incidirá sobre a pessoa física considerada titular. De acordo com o texto do projeto, todos os bens do trust serão considerados como sendo de titularidade do instituidor, e passarão à propriedade do beneficiário somente após o efetivo momento de distribuição ou falecimento do instituidor, o que acontecer antes. Por outro lado, a transferência de titularidade pode ser considerada realizada em momento anterior se, no ato de instituição do trust, o instituidor renuncie irrevogavelmente ao direito sobre determinada parcela do patrimônio. Em qualquer caso, a transmissão sempre será considerada a título gratuito do instituidor ao beneficiário, configurando uma hipótese de doação ou transmissão causa mortis, conforme o caso.

Por fim, é importante ressaltar que, caso o trust seja controlador de uma empresa no exterior, esta será considerada detida pelo titular (instituidor ou beneficiário), aplicando-se as regras de tributação de investimentos previstas no PL.

O PL estabelece ainda que, em caso de trust cujo instituidor estiver vivo, ou os beneficiários, se tiverem conhecimento do trust, têm um prazo de até cento e oitenta dias a partir da data da publicação da Lei para realizar alterações na escritura de trust ou na carta de desejos, incluindo uma cláusula que obriga o administrador a cumprir de maneira irrevogável e irretratável as regras tributárias e fiscais contidas na Lei. Caso o instituidor já tenha falecido (ou perdido os poderes sobre o trust), os beneficiários deverão encaminhar uma comunicação formal ao administrador informando-o acerca da necessidade de observação das regras tributárias, bem como para a disponibilização de informações e recursos financeiros para o pagamento dos impostos.

Offshores, ou Entidades Controladas no Exterior

O PL estabelece a tributação sobre os lucros apurados por entidades controladas no exterior em favor de pessoas físicas residentes no Brasil, pago anualmente. O conceito de “entidade controlada no exterior”, por sua vez, engloba todas as sociedades e entidades, personificadas ou não, incluindo fundos de investimento e fundações, desde que a pessoa física detenha, isolada ou conjuntamente com pessoas vinculadas (cônjuge/companheiro e parentes até 3º grau), mais de 50% (cinquenta por cento) de participação no capital social ou de participação nos lucros, ou ainda outros direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações sociais ou a eleição e destituição da maioria dos administradores.

Todavia, somente se sujeitam ao novo regime tributário previsto as controladas, diretas ou indiretas, que se enquadrarem em pelo menos uma das seguintes hipóteses:

  • localizadas em “paraísos fiscais”, ou tributação favorecida ou regime fiscal privilegiado (conforme lista na Lei nº 9.430/96), ou;
  • que apurem renda ativa própria inferior a 60% (sessenta por cento) da renda total.

o conceito de “renda ativa própria” se assemelha à receita operacional, e inclui todas as receitas obtidas diretamente pela entidade em razão da atividade econômica própria (dividendos, royalties, juros, participações, alugueis, ganhos de capital, aplicações financeiras, etc.); e “renda total” é o somatório de todas as receitas, incluindo as não operacionais.

Dessa forma, a incidência ou não do tributo sobre a pessoa física no caso concreto depende da análise sequencial de todos os requisitos acima.

Efeitos do PL

O PL 4.173/23 estabelece que pessoas físicas com empresas controladas no exterior estabelecidas em paraíso fiscal ou com renda própria inferior a 60% submeterão os lucros auferidos no exterior a uma tributação anual automática no final do exercício financeiro de cada ano.

Segundo o PL, o contribuinte que optar por atualizar o valor de seus bens e direitos no exterior para o valor de mercado em 31 de dezembro de 2023 e tributar o ganho de capital, terá um desconto na alíquota, de 15% para 10%.

Com a mudança, um questionamento que se levanta é que, no Brasil, a renda da pessoa física é tributada em regime de caixa, isto é, do recebimento efetivo do recurso. E o projeto de Lei cria uma regra de tributação anual de valores antes do efetivo recebimento.

Embora ainda definitiva, a iniciativa legislativa amplia as alternativas de arrecadação do Governo e aproxima os fundos exclusivos dos fundos abertos, suprindo lacunas quanto a tributação de pessoas físicas com controladas no exterior.

Tributação hojeCom o PLCom o PLCom o PLDesconto Com o PL
-----------------------Renda no exterior de até R$ 6 mil por anoEntre R$ 6 mil e R$ 50 mil por anoSuperior a 50 milRenda Atualizada até 31 de dezembro de 2023
Apenas no momento do resgate0%15%22,5%10%

As áreas de Direito Tributário e Estruturação de Negócios permanecem à disposição para esclarecer sobre este e outros temas de interesse de seus clientes e parceiros institucionais.

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