Horas de passe e de prontidão são devidas aos ferroviários quando há negociação coletiva?

Quando negociado que as horas de passe e de prontidão não serão computadas na jornada de trabalho, é indevido o seu pagamento aos ferroviários.
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Ruy Barbosa

Head da área de direito do trabalho

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Assim como em outros setores da Economia, o setor ferroviário tem particularidades quando se trata de legislação trabalhista. Prova disso é a existência de uma seção própria na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que contém mais de 10 artigos trazendo as especificidades da categoria.

Nos seus artigos 236 a 247, a CLT traz os preceitos que devem ser seguidos pelo setor e esclarece que o serviço ferroviário é todo aquele que trata de transporte em estradas de ferro abertas ao tráfego público, incluindo os serviços envolvendo a administração, construção, conservação e remoção das vias férreas e seus edifícios, obras de arte, material rodante, instalações complementares e acessórias, bem como o serviço de tráfego, de telegrafia, telefonia e funcionamento de todas as instalações ferroviárias.

Contudo, mesmo com tais artigos específicos, há muita celeuma sobre alguns pontos, em especial envolvendo a jornada de trabalho dos ferroviários. Um dos pedidos mais recorrentes nas ações trabalhistas que tramitam no Judiciário é sobre horas de passe, prontidão e sobreaviso, mesmo sendo estes tópicos objeto de negociação explícita entre sindicatos que representam a categoria dos trabalhadores ferroviários e as empresas do setor.

Tal debate chegou nos Tribunais Regionais e Superiores e vinculou-se ao Tema 1046 do STF, mais especificamente quando se travou o debate sobre se o acordado poderia se sobrepor ao legislado.

No julgamento da ARE 1121633, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que os acordos e as convenções coletivas que pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas são válidos, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que as normas convencionadas respeitem os direitos do trabalhador protegidos constitucionalmente, os denominados “absolutamente indisponíveis”.

A tese firmada traz uma importante diretriz para a jurisprudência trabalhista, bem como para os steakholders nas relações de trabalho, haja vista que, a partir da decisão do Tema 1046 de Repercussão geral do STF, o negociado em convenções ou acordos coletivos pode sobrepor-se ao estabelecido em lei.

Assim, o empregador e o funcionário podem debater sobre direitos e obrigações legalmente previstas, sem que o acordado seja, posteriormente, invalidado em Juízo, sob o fundamento de que as normas convencionais não podem sobrepor-se àquelas oriundas de fontes legais.

Destarte, a decisão impõe aos tribunais o dever de respeitar a vontade das partes quando não se verificar afronta aos direitos absolutamente indisponíveis do trabalhador, ainda que essa vontade seja contrária ao disposto em lei, trazendo, dessa forma, maior segurança jurídica às empresas.

No que concerne o setor ferroviário, a tese do STF derruba o entendimento majoritário anterior, o qual determinava a condenação das empresas ao pagamento de horas de passe, prontidão e sobreaviso, ainda que houvesse expressa previsão em acordo coletivo de que as referidas horas não seriam computadas na jornada efetivamente trabalhada.

Essa condenação era justificada com base no disposto no art. 238 da CLT, o qual determina que todo o período em que os trabalhadores se encontram na estrada de ferro deve ser considerado como trabalho efetivo, devendo ser esse tempo contabilizado na jornada de trabalho.

Ou seja, ainda que as empresas tivessem negociado com os Sindicatos dos Trabalhadores, o que comumente ocorria, os tribunais entendiam ser nulas as normas convencionais que previam que as referidas horas não seriam computadas na jornada de trabalho sob o fundamento de que as cláusulas acordadas representavam uma afronta ao dispositivo legal.

No entanto, com o novo entendimento do STF, os acordos coletivos que estabelecem que “viagens/horas de passe” e “horas de prontidão” não devem ser computadas na jornada de trabalho são reputados como válidos. Ou seja, se houver negociação coletiva neste sentido, os trabalhadores não têm direito a essas horas mesmo argumentando que deveria ser seguido o previsto no artigo 238 e seus parágrafos da CLT.

Portanto, desde que observados os direitos “absolutamente indisponíveis” dos empregados ferroviários, o Poder Judiciário deverá reconhecer a validade das convenções e acordos coletivos, inclusive quando resta pactuada cláusula que limite ou afaste direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias.

Desta feita, percebe-se uma sensação de segurança ao setor, em especial às empresas que possuem as negociações coletivas, diminuindo assim, sensivelmente, os riscos de condenação em demandas judicias trabalhistas.

A área de Direito do Trabalho do Vernalha Pereira está à disposição para participar ativamente de negociações coletivas, auxiliar na elaboração e revisão das cláusulas em negociação, bem como esclarecer as dúvidas sobre temas trabalhistas do setor das ferrovias e demais assuntos de interesse de seus clientes e parceiros institucionais.

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