Medidas protetivas na Lei Maria da Penha

A adoção de medidas protetivas diretamente pela autoridade policial para vítimas de violência doméstica.
Larissa Caxambú

Larissa Almeida

Advogada egressa

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O combate à violência doméstica e familiar constitui-se em um primado assegurado expressamente pela Constituição Federal (art. 226 §8º). Tal proteção especial, entretanto, vem sendo reiteradamente trazida em voga frente ao crescente número de casos registrados em nossa sociedade, principalmente no tocante à violência contra a mulher.

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06) representa, por certo, um dos principais instrumentos para prevenção, punição e erradicação da violência doméstica e familiar. Trata-se de um marco histórico em proteção aos direitos femininos, enrijecendo de forma consubstancial as punições contra eventuais agressores.

Tendo em conta tal objetivo garantista, a fim de dar o devido cumprimento às medidas protetivas, recentemente foram sancionadas mudanças na referida lei, facilitando substancialmente a concessão das medidas de urgência para a proteção da mulher ou seus dependentes.

Para além da determinação de afastamento imediato do agressor do lar, domicílio ou local de convivência, quando existente risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da vítima ou dependentes, as recentes mudanças autorizam que tal medida possa ser implementada diretamente pela autoridade policial civil ou militar, quando não houver delegado disponível, e/ou delegado de polícia, quando o município não for sede de Comarca.

Em outras palavras, as recentes mudanças retiram a regra da concessão de medidas protetivas exclusivamente pela autoridade judiciária, que possuía o prazo de 48 horas após a remessa do expediente pela autoridade policial.

Nestas situações de concessão diretamente pela autoridade policial, o juiz deverá ser comunicado no prazo máximo de 24 horas, decidindo, em igual prazo, sobre a manutenção ou revogação da medida.

Destaca-se, também, dentre as alterações, a determinação de vinculação da medida de urgência em banco de dados mantido pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, viabilizando o acesso para o Ministério Público, Defensoria Pública e órgãos de segurança pública com vistas à melhor fiscalização das medidas.

Outro ponto positivo é a expressa vedação de concessão de liberdade provisória ao preso em casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, concedendo, assim, maior segurança à vítima da violência.

Não se pode esquecer, de igual modo, que o descumprimento das medidas protetivas passou a constituir crime autônomo desde abril de 2018, com pena de detenção de três meses a dois anos, permitindo, também, a prisão, em flagrante, daquele que descumprir as medidas impostas, desde que constatado o fato durante sua ocorrência.

Tais normas, sem sombra de dúvida, são vistas de bom grado frente as sistêmicas violações à proteção da violência contra a mulher no país no qual a morosidade na proteção da vítima é a regra.

Entretanto, pairam dúvidas acerca da constitucionalidade das recentes alterações. Para além das inovações não possuírem qualquer regulamentação mais detalhada acerca dos procedimentos que ampliaram a proteção, a desvinculação da competência para o deferimento das medidas para delegados e policiais poderiam ensejar ofensa direta ao princípio da separação dos poderes, já que concede funções aos membros do executivo despidos de função jurisdicional (delegados e policiais).

Fora a debilidade estrutural das delegacias de polícia, pontua-se desde já que, apesar da boa intenção, a possibilidade da concessão de medidas diretamente por policiais que não possuem necessariamente formação/experiência jurídica (diferentemente do delegado) pode gerar análises equivocadas acerca da necessidade da cautelaridade da medida, criando insegurança jurídica.

Em que pese a inexistência de consenso acerca da amplitude conferida pela nova redação sancionada (motivada precipuamente pela morosidade na proteção judicial), não se pode olvidar que, independentemente da forma, buscou-se garantir maior efetividade à incolumidade física e psicológica da vítima.

Ora, se por um lado não é possível concluir que a nova alteração tenha alcançado a proteção mínima desejável, também não se pode afirmar que tal medida é prejudicial à causa.

De todo modo, muito embora o Estado se baseie em um fetiche normativista, é imprescindível ter em mente que o combate à violência doméstica não pode se restringir a medidas legais, priorizando-se de igual modo medidas preventivas de conscientização, para apoio e atendimento psicológico às vítimas.

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