O processo ético-profissional no CRM: uma garantia à sociedade

A definição de como se dão os processos ético-profissionais buscam proteger o exercício da Medicina e toda a comunidade que recebe os serviços médicos.
Ana-Carolina-Martinez-Bazia

Ana Carolina Martinez

Advogada egressa

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Ao ser noticiada a eventual má conduta profissional de um médico, cabe ao seu Conselho de Classe avaliá-lo. Por óbvio, podem advir outras repercussões que perpassam as indenizações cíveis por responsabilidade médica ____ tema tratado na edição nº 32 do Argumento Físico, até acusações e condenações na esfera penal. Contudo, nesses casos, uma das esferas mais frequentemente enfrentadas é a esfera administrativa, a qual possui muitas peculiaridades e, em virtude disso, gera inúmeras dúvidas acerca do tema.

O primeiro diploma normativo que trata sobre este assunto é a Lei nº 3.268/57, que se destina a regulamentar os Conselhos de Medicina e, para tanto, atribui ao Conselho Regional o poder disciplinar, voltado a aplicar penas. Em seu artigo 21, esta lei determina que “para que este poder possa atuar, o profissional precisa estar inscrito no Conselho Regional de Medicina – CRM à época do fato investigado.” Tal exigência é complementada pelo artigo 2º da Resolução do Conselho Federal de Medicina – CFM nº 2.145/2016, que indica que o processamento se dará no CRM em que o médico estiver inscrito.

Verificadas essas condições, inicia-se uma sindicância que buscará realizar uma investigação prévia acerca dos fatos, podendo começar por iniciativa do próprio CRM ou através de denúncia. Contudo, vislumbra-se que não é possível sua instauração mediante denúncia anônima, ocasião em que ocorreria uma nulidade. Nesse momento, ainda não há obrigatoriedade de contraditório e seu encerramento se dá com o relatório conclusivo, que pode, inclusive, decidir por arquivar a denúncia.

Outra fase possível no Processo Ético-Profissional – PEP é a conciliação. Há, ainda, o Termo de Ajustamento de Conduta – TAC, que  decorre do reconhecimento explícito de conduta ofensiva ao interesse ético individual ou coletivo, em concomitância com o compromisso de eliminar a ofensa ou o risco, adequando seu comportamento às exigências legais e éticas. Sua assinatura terá caráter sigiloso e forma própria. Tanto a aplicação do PEP quanto do TAC ocorrem exclusivamente nos casos que não envolvam lesão corporal de natureza grave, assédio sexual ou óbito do paciente e mediante indicação no relatório conclusivo.

Não ocorrendo nem a conciliação, nem a aplicação do TAC nem o arquivamento, o relatório conclusivo da sindicância é encaminhado para dar início ao PEP propriamente dito. A partir dessa etapa, tudo ocorre mediante sigilo, a fim de proteger o médico denunciado, especialmente sua imagem e reputação profissional, e a própria intimidade do paciente eventualmente envolvido.

No PEP, é subsidiariamente aplicável o Código de Processo Penal – CPP e o Código de Processo Civil – CPC a fim de que, em consonância com a Constituição Federal, possa se garantir a presunção de inocência, o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Assim, o médico denunciado poderá oferecer defesa prévia e produzir provas, arrolando até cinco testemunhas. De eventual decisão cabe recurso, sendo seus efeitos suspensos até ulterior julgamento.

A Resolução CFM nº 2.145/2016 ainda prevê que o decorrer do processo deve ser pautado pela razoabilidade e pela observância dos prazos prescricionais. Isso porque se prevê a extinção da punibilidade após cinco  anos do conhecimento do fato pelo CRM e a impossibilidade de execução das penas após cinco anos da intimação do denunciado da decisão condenatória.

Quanto às penas, a Lei 3.268/57 prevê como hipóteses (i) a advertência e a censura confidenciais em aviso reservado; (ii) censura pública em publicação oficial; (iii) suspensão do exercício profissional até 30 dias e, por fim, a mais grave: (iv) a cassação do exercício profissional. Para esta última, é necessário o referendo do Conselho Federal de Medicina. A escolha da pena aplicável, por sua vez, dependerá da análise da gravidade da conduta do profissional.

Condenado, o médico, à exceção daquele cassado, poderá se reabilitar após oito anos do cumprimento de sua pena, cuja consequência será a retirada dos apontamentos referentes às condenações anteriores.

Para reavaliação de eventual condenação, pode ser acionado o Poder Judiciário. Inicialmente, cabe observar que as três esferas citadas (cível, penal e administrativa) são completamente independentes entre si, de modo que um resultado não interfere necessariamente no outro. Contudo, com base nos princípios supracitados, caberá recorrer ao Judiciário caso ocorra alguma ilegalidade durante o processo.

Vale ressaltar que, caso não seja observado o trâmite previsto, a decisão poderá ser anulada. Não heverá, porém, discussão acerca do mérito da decisão, isto é, o juiz não adentrará a adequabilidade da pena imposta se houve efetiva violação, etc.

Como se observa, o processo ético-profissional pode ser encarado de forma desmistificada, pois tem como cerne a proteção de toda a comunidade médica e não-médica, buscando evitar condutas ofensivas à ética. Não obstante, esse objetivo é perquirido através do respeito ao profissional, garantindo o sigilo e a proteção da sua imagem, além da possibilidade de efetiva participação e atuação em sua defesa.

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