As leis sobre insolvência e recuperação de empresas desempenham um papel fundamental na economia de qualquer país. Um regime legal de insolvência que funcione adequadamente representa uma ferramenta poderosa para promover o empreendedorismo, o acesso ao financiamento, a inovação e o crescimento econômico.
A capacidade de um regime de insolvência de fomentar o crescimento econômico dependerá de como os devedores e credores são tratados durante o processo de recuperação judicial ou falência. Para se criar um ambiente favorável ao empreendedorismo, é fundamental saber que, em caso de uma indesejada crise empresarial, instrumentos eficientes e dotados de segurança jurídica poderão ser acionados para preservar o valor da empresa e solucionar as dificuldades financeiras.
No cenário nacional, a legislação falimentar, embora cumpra esse papel, tem sido objeto de dissensos e controvérsias variadas. Prova disso é que, nos últimos anos, a Lei de Falências e Recuperação Judicial foi alvo de propostas de alteração legislativa. A primeira delas restou concretizada em 2020, dando origem à Lei n.º 14.112/2020. A segunda, embora ainda não aprovada, está em tramitação no Congresso, em regime de urgência (Projeto de Lei n.º 3/2024).
Pensando em uniformizar entendimentos dissonantes e ofertar solução efetiva às controvérsias cotidianas, no último mês, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), reuniu diversos estudiosos da matéria no 2º Congresso Nacional do Fórum de Recuperação Empresarial e Falências (FONAREF), para discutir os temas em maior destaque nos tribunais de todo o País.
Os debates realizados no âmbito do Congresso culminaram na edição de quatro importantes enunciados orientativos, todos editados com o intuito de estabelecer uniformidade na aplicação da lei falimentar e recuperacional.
Primeiramente, no que tange à discussão acerca da qualificação do bem de capital, definiu se a competência do juízo da recuperação judicial para reconhecer a essencialidade do bem de capital, mediante a análise das circunstâncias do caso concreto. A medida se justifica pelo fato de que o juízo recuperacional possui maiores condições de avaliar a necessidade de determinado bem para o efetivo soerguimento da empresa.
No evento, também se definiu que o crédito sujeito aos efeitos da recuperação judicial será novado e pago conforme o plano de recuperação judicial homologado, mesmo que o credor não tenha se habilitado e ainda que a recuperação judicial já se tenha encerrado. Com isso, tem-se por extirpada qualquer possibilidade de burla do credor sujeito ao procedimento.
Em observância ao dever de transparência e ainda com o intuito de ratificar os termos da Recomendação n.º 72/2020 do CNJ, o FONAREF orienta que o administrador judicial disponibilize, no respectivo sítio eletrônico, o Relatório da Fase Administrativa, o Relatório Mensal de Atividades e o Relatório dos Incidentes Processuais. A medida visa facilitar a compreensão da situação jurídico-processual da empresa em recuperação, fornecendo informações atualizadas e de modo facilitado a qualquer credor ou interessado.
Ademais, formou-se a orientação no sentido de que a procuração com poderes específicos para representação do credor em assembleia-geral de credores constitui requisito para o exercício do voto. Isso, notadamente, porque as discussões ocorridas nas assembleias de credores possuem naturezas diversas, podendo, inclusive, abranger a renúncia de direitos, o que coloca o credor desavisado em situação de notória vulnerabilidade.
Em linhas gerais, os enunciados editados no Fórum de Recuperação Empresarial e Falências (FONREF) sanam algumas das discussões mais frequentes no âmbito do Poder Judiciário e, em que pese não substituam as necessárias atualizações legislativas, comprovadamente representam importante ferramenta para efetivação das normas, promovendo, dessa forma, um ambiente juridicamente adequado para o desenvolvimento econômico.