Síntese
STF reitera posicionamento de que deve ser observado pelos parlamentares, no âmbito de CPIs, quando da oitiva de investigados, o direito ao silêncio, o direito à assistência por advogado durante o ato, o direito de não ser submetido ao compromisso de dizer a verdade ou de subscrever termos com esse conteúdo e, também, de não sofrer constrangimentos físicos ou morais decorrentes do exercício dos direitos anteriores.
Comentário
Em meados de março, o Senado Federal aprovou a instalação da CPI de Brumadinho, onde pretende investigar as causas da tragédia e também identificar falhas de atuação de órgãos federais, estaduais e municipais incumbidos de licenciar e fiscalizar as barragens.
A principal finalidade é recomendar uma nova estrutura de fiscalização da atividade de mineração, bem como propor mudanças na legislação – estabelecendo critérios técnicos de segurança adequados e rígidas punições em caso de descumprimento, além de assegurar a reparação de danos causados aos cidadãos.
Especialmente no tocante à investigação das causas da tragédia, restou determinada a oitiva de diversos funcionários e terceirizados da Vale envolvidos com a operação e de funcionários das empresas que prestaram auditoria.
Destaca-se, dentre elas, a convocação dos signatários do laudo de estabilidade da barragem da Mina Córrego do Feijão – que inclusive chegaram a sofrer restrição da liberdade por esta razão – na especial condição de testemunha. Como amplamente difundido, tais fatos são apurados no âmbito de ações cíveis e criminais.
A defesa dos convocados, antecipadamente, impetrou habeas corpus visando assegurar durante a oitiva os direitos constitucionais que possuem na condição de investigados – qualidade que não se confunde com a de testemunha.
Em decisão liminar no HC nº 169595/DF, a Ministra Rosa Weber, do STF, deferiu o requerimento feito pela defesa dos pacientes, ao asseverar que deverá ser observado pelos parlamentares, no âmbito da CPI de Brumadinho, o direito ao silêncio, o direito à assistência por advogado durante o ato, o direito de não serem submetidos ao compromisso de dizer a verdade ou de subscreverem termos com esse conteúdo e, também, de não sofrerem constrangimentos físicos ou morais decorrentes do exercício dos direitos anteriores.
Destacou, principalmente, que o direito ao silêncio é ‘uma das vigas mestras do processo penal em um Estado Democrático de Direito’, garantido tanto pela Constituição Federal quanto pelo Código de Processo Penal, visando à prevenção de confissões involuntárias – ou, como poderiam ocorrer também, forçadas – estando ainda vinculado ao princípio da presunção de inocência, já que a incumbência de provar a responsabilidade criminal é do Estado (acusação) e não do acusado.
Outrossim, reconheceu que de igual importância é o direito do investigado à assistência de advogado. Incluído, em tal determinação constitucional, o direito de falar reservadamente com o defensor, preparar sua defesa dispondo do tempo e meios necessários e de estar acompanhado por advogado em qualquer fase, seja investigativa ou judicial.
Como observado, a convocação dos pacientes na condição de testemunha possibilitaria retirar-lhes tais direitos, pois, nesta situação, seriam compromissados a dizer a verdade, circunstância diametralmente inversa ao direito ao silêncio que lhes cabe se de fato são investigados (conclusão extraída do fato que foram citados em ação penal que apura os mesmos fatos e também por já terem sofrido segregação cautelar).
A acertada decisão da Ministra seguiu a mesma linha de decisões anteriores do STF, visto que as comissões parlamentares detêm poderes instrutórios que são equivalentes aos de autoridades judiciais. Portanto, devem submeter-se também aos direitos e garantias constitucionais, não podendo olvidar que o direito à não autoincriminação (do qual decorre o direito ao silêncio) encontra-se esculpido também na Convenção Interamericana de Direitos Humanos.
Eventual afronta ou inobservância de tais garantias deve, obrigatoriamente, levar à ilicitude da prova, porquanto seria obtida em violação à norma constitucional – cabendo mencionar que constitui flagrante desrespeito ao devido processo legal.
Embora o STF esteja ratificando os pedidos defensivos em tal sentido, o desejável é que de pronto os parlamentares observassem o procedimento correto, e não somente eles, mas toda a autoridade administrativa ou judiciária que venha a praticar atos semelhantes.
Como visto, a acusação, ou terceiros que pratiquem atos inerentes a esta, não pode se utilizar de ‘manobras’ de cunho duvidoso – tal como arrolar na qualidade de testemunha réu ou provável investigado – a fim de tolher ilicitamente seus direitos constitucionalmente assegurados.
Frise-se, por fim, que é em tais circunstâncias que o Judiciário exerce seu principal papel, controlando a legalidade dos atos e assegurando as garantias devidas.