STF decide sobre alienação fiduciária por contrato particular

Em recente decisão, o STF confirmou a possibilidade de ser formalizada alienação fiduciária em garantia de bem imóvel por meio de contrato particular.
Diego-Ikeda

Diego Ikeda

Advogado

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Síntese

O CNJ restringiu a formalização da alienação fiduciária a entidades do Sistema Financeiro Imobiliário, exigindo escritura pública para operações fora desse sistema. Essa mudança aumentou os custos e dificultou o acesso ao crédito. Em resposta, o STF decidiu que a alienação fiduciária pode ser formalizada por contrato particular, respeitando as normas estaduais, o que desburocratiza o processo e favorece o mercado imobiliário e financeiro.

Comentário

A alienação fiduciária é uma garantia amplamente utilizada no mercado imobiliário, financeiro e de capitais, por meio da qual o bem do devedor é transferido para o credor como garantia real de pagamento. A garantia do credor, portanto, é a própria coisa, possibilitando que, na hipótese de inadimplemento do devedor, o domínio do bem se constitua automaticamente em seu favor.

Apesar de ser uma ferramenta bastante comum, sua formalização foi polemizada durante os últimos meses, uma vez que cada estado estabelecia regras distintas em seus Códigos de Normas.

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tratou inúmeras vezes sobre o tema. Recentemente, nos meses de junho e julho de 2024, publicou o Provimento 172/24 e, posteriormente, o Provimento 175/2024, que alteraram o Código de Normas, que passou a prever que a alienação fiduciária por contrato particular seria restrita às entidades vinculadas ao Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), englobando agentes fiduciários, cooperativas de crédito, companhias securitizadoras ou demais entes sujeitos à regulamentação da CVM ou do Banco Central.

A partir de então, tornou-se obrigatório o registro da alienação fiduciária por meio de escritura pública quando envolver operações fora do âmbito do SFI.

A medida foi surpreendente pelo fato de que a grande maioria dos estados aceitavam a formalização da alienação por meio de contrato particular. A norma publicada pelo CNJ restringiu o acesso ao crédito e aumentou o custo da operação (lavratura de escritura gira em torno de 2% a 3% sobre o valor do bem).

A União questionou os provimentos por meio de Pedido de Providências (0007122-54.2024.2.00.0000), ocasião na qual informou que compreendia que a exigência gerava custos adicionais aos adquirentes dos imóveis e àqueles que utilizam os imóveis como garantia (alienação fiduciária), sem contar a desvantagem competitiva entre as entidades não integrantes do SFI e SFH, prejudicando a concorrência no setor imobiliário.

Acolhendo o questionamento, o CNJ reconheceu o dano iminente e suspendeu liminarmente os efeitos do provimento até decisão do mérito sobre o tema.

Enquanto isso, em recente decisão (13/12/2024), por ocasião do julgamento do Mandado de Segurança 39.930/DF impetrado por uma incorporadora, o STF reconheceu a possibilidade de formalização de alienações fiduciárias por instrumento particular, sem excluir a formalização por escritura pública. A decisão constitui-se como verdadeira resposta aos provimentos publicados pelo CNJ.

Contrariando os provimentos, segundo o Relator, “não cabe ao oficial do Cartório de Registro de Imóveis, no exercício e nos limites de sua importante função, negar registro a contratos atípicos com pacto adjeto de alienação fiduciária firmados por particulares, quando a avença apresentar todos os requisitos previstos em lei para a sua validade”, visto que a legislação (Lei 9.514/97) e normas incidentes não preveem qualquer tipo de restrição para a formalização da operação sobre bens imóveis.

Além disso, o Ministro Gilmar Mendes considerou que as restrições normativas do CNJ contrariam a legislação, geram custos e comprometem o desenvolvimento econômico, as operações imobiliárias e o próprio mercado de crédito, visto que a alienação fiduciária pode ser utilizada como garantia em contratos alheios ao mercado imobiliário.

Em complemento, consignou-se na decisão que “por suas características, o negócio fiduciário é utilizado como meio de operacionalizar o compartilhamento de garantias e se baseia no prestígio da autonomia privada e da atipicidade dos contratos. Assim, é um instrumento estratégico para conferir segurança ao regime de garantias e permitir o incremento das operações comerciais pelo aumento da oferta de crédito no mercado”.

Determinou-se, portanto, que o CNJ comunicasse às Corregedorias dos Tribunais de Justiça sobre a decisão “para garantir […] a possibilidade de formalização, por instrumento particular com efeitos de escritura pública, de alienação fiduciária em garantia sobre bens imóveis e de atos conexos, em todas as suas operações, nos termos autorizados pela Lei 9.514/97”.

Portanto, é plenamente possível formalizar alienações fiduciárias por instrumento particular, desde que, naturalmente, sejam respeitadas as disposições contidas nos Códigos de Normas estaduais. A decisão do STF impacta favoravelmente no mercado imobiliário e financeiro, uma vez que simplifica as operações, desburocratiza a prática comercial e, consequentemente, fomenta o acesso ao crédito.

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