Contencioso imobiliário em 2024: uma retrospectiva jurisprudencial

Compreenda os principais temas do contencioso imobiliário decididos pelo STJ.

A crescente judicialização de temas relativos ao setor imobiliário tem trazido desafios e insegurança jurídica. Esse movimento, por sua vez, tem exigido de nossos Tribunais a tomada de posicionamento, com o objetivo de pacificar entendimentos controversos ou de encarar problemas mais recentemente surgidos.

Particularmente no ano de 2024, relevantes decisões do STJ impactaram (ou estão por impactar) significativamente a indústria imobiliária. Alguns julgamentos destacaram-se pela potencialidade de redefinir questões controversas e, assim, outorgar previsibilidade às variadas relações jurídicas.

Litigância predatória (Tema 1.198)

Logo no início de 2024, o STJ deu início ao julgamento do Tema 1.198, que trata da litigância predatória no contexto das ações versando sobre vícios construtivos. A litigiosidade sobre tal tema tem sido motivo de preocupação do segmento imobiliário. O ajuizamento de demandas padronizadas, muitas vezes sem fundamento técnico consistente, sobrecarrega o Judiciário e traz insegurança para a atividade de construtoras e incorporadoras.

Nesse cenário, o STJ afetou o tema para julgamento sobre o rito dos julgamentos repetitivos e discute a tese de que o juiz pode exigir que a parte autora emende a petição inicial, apresentando documentos de identificação e provas mínimas que fundamentem a ação. Essa medida visa mitigar a litigância abusiva e assegurar que apenas demandas legítimas prossigam. O julgamento ainda não foi concluído e deve ser objeto de atenção do setor, pois seu resultado representará um fator relevante para a contenção de demandas frívolas. 

Lucros cessantes e a rescisão contratual por atraso na obra

Outro tema de grande repercussão para o segmento foi a decisão do STJ a respeito da indenização por lucros cessantes nas ações de resolução contratual por atraso na entrega da obra. 

A Corte consolidou o entendimento de que essa indenização não se presume. O entendimento baseia-se na lógica de que, se o adquirente optou pela rescisão do contrato, ele nunca terá o imóvel em seu patrimônio, o que torna incompatível a pretensão de ser indenizado por valores que hipoteticamente seriam obtidos com aluguel. Essa decisão representa importante precedente na contenção de pedidos de indenização infundados, equilibrando os interesses dos consumidores e das construtoras.

Impenhorabilidade do bem de família e pequena propriedade rural (Tema 1.234)

No que diz respeito à proteção patrimonial, o Tema 1.234 trouxe definição sobre a impenhorabilidade da pequena propriedade rural utilizada para subsistência familiar. O STJ firmou o entendimento de que cabe ao executado o ônus de comprovar que o imóvel é explorado diretamente pela família para que seja reconhecida sua impenhorabilidade.

A decisão reforça a necessidade de prova efetiva a respeito de uma alegada impenhorabilidade, evitando fraudes e a utilização indevida do benefício por devedores que, na prática, não se enquadram nos requisitos estabelecidos pela legislação.

Penhorabilidade de imóveis alienados fiduciariamente (Tema 1.266)

Uma das discussões mais polêmicas do ano surgiu da afetação do Tema 1.266, que examina se um imóvel alienado fiduciariamente pode ser penhorado para pagamento de dívida condominial.

O STJ objetiva responder à seguinte questão: “é possível penhorar o imóvel alienado fiduciariamente em decorrência de dívida condominial”?

Importante registrar que, por muito tempo, prevaleceu o entendimento de que bens alienados fiduciariamente não poderiam ser alcançados por outras dívidas do devedor, nem mesmo as propter rem – nas quais se enquadram as despesas condominiais. 

No entanto, decisões recentes das turmas do STJ desafiaram essa lógica ao permitir a penhora, colocando em risco a segurança em torno da alienação fiduciária em garantia.

A controvérsia gerou grande preocupação no mercado imobiliário, pois coloca em risco a própria natureza da alienação fiduciária em garantia, mecanismo amplamente utilizado para a concessão de crédito imobiliário. 

O julgamento do Tema 1.266, ainda não concluído pelo STJ, é essencial para a uniformização desse entendimento e para a preservação da utilidade da alienação fiduciária.

Intimação por edital na execução extrajudicial da alienação fiduciária

Ainda no campo da alienação fiduciária, o STJ proferiu decisão relevante sobre a execução extrajudicial. A Corte decidiu que a intimação por edital para purgação da mora não depende mais da comprovação do esgotamento das tentativas de intimação pessoal.

Agora, basta que o credor demonstre que tentou notificar pessoalmente o devedor no endereço fornecido como sua residência, ou que há uma certidão atestando que o devedor está em local incerto e não sabido. Com isso, inverte-se o ônus da prova: cabe ao devedor demonstrar eventual irregularidade para que a intimação por edital seja anulada.

Essa mudança busca conferir maior efetividade ao procedimento de execução extrajudicial, impedindo que o devedor utilize artifícios para retardar a execução da garantia.

Patrimônio de afetação e a quitação do financiamento

O STJ consolidou um entendimento relevante sobre a extinção do patrimônio de afetação nos empreendimentos imobiliários. A corte decidiu que a desconstituição desse regime protetivo somente pode ocorrer se houver a quitação integral do financiamento da obra junto à instituição financeira.

Essa decisão outorga segurança aos adquirentes e garante que os recursos destinados à conclusão dos empreendimentos permaneçam salvaguardados até que todas as obrigações financeiras do projeto sejam integralmente cumpridas.

Impenhorabilidade do bem de família e ônus da prova (Tema 1.261)

Por fim, duas questões foram afetadas para julgamento no âmbito do Tema 1.261, do STJ.

Em primeiro, o STJ examina a hipótese em que um imóvel residencial é oferecido como garantia real em favor de terceiros. A Corte busca definir se é necessário comprovar que o benefício obtido com essa garantia reverteu-se em favor da entidade familiar, para que se possa afastar a proteção de impenhorabilidade prevista na Lei n. 8.009/1990.

Como segunda questão, o STJ visa  definir o tema da distribuição do ônus da prova nas hipóteses de garantias prestadas em favor de sociedade na qual os proprietários do imóvel têm participação societária. O objetivo aqui é determinar quem deve comprovar se o crédito obtido pela sociedade beneficiou ou não a entidade familiar, quando o imóvel residencial dos sócios é dado em garantia. Vale dizer, se cabe ao credor ou ao devedor (proprietário do imóvel) comprovar que o proveito do crédito se reverteu ou não em favor da família.

Houve suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão no território nacional, até que o recurso repetitivo seja julgado.

Conclusão

Os temas tratados pelo STJ demonstram a importância de um sistema de solução de disputas que seja receptivo e atento às necessidades de um mercado em evolução. Ao atuar para garantir previsibilidade e segurança jurídica, a Corte propicia a estabilidade das relações contratuais, a redução da litigiosidade abusiva e o fortalecimento da confiança no mercado imobiliário, incentivando investimentos e assegurando a proteção dos direitos.

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