STJ altera limite do valor para reconhecimento da insignificância no crime de descaminho

Em atenção a portarias do Ministério da Fazenda, STJ eleva de R$ 10.000,00 para R$ 20.000,00 o limite do valor para aplicação do princípio da insignificância.
Henrique-Dumsch-Plocharski

Henrique Plocharski

Advogado da área penal empresarial

Compartilhe este conteúdo

Síntese

A Terceira Seção do STJ, por maioria, modificou o entendimento de que o patamar máximo para aplicação do princípio da insignificância no crime de descaminho seria de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Conforme o voto do Relator Min. Sebastião Reis Junior, o teto para aplicação do princípio passa a ser de R$ 20.000,00, consoante as Portarias 75 e 130 do Ministério da Fazenda.

Comentário

O crime de descaminho, em síntese, previsto no art. 334 do Código Penal, com pena de reclusão de 1 a 4 anos, visa proteger o erário público, bem jurídico atingido pela ausência de pagamento de imposto quando da entrada ou saída de mercadoria do país.

Em 2009, o STJ, atendendo orientação do STF, em Recurso Especial sob relatoria do Ministro Félix Fischer, havia fixado o patamar máximo para aplicação do princípio da insignificância nestes delitos em R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Para a época, já era um grande avanço, visto que havia decisões que reconheciam a possibilidade de considerar a conduta atípica somente quando o valor não ultrapassasse R$ 100,00 (cem reais). Em tal momento, havia ainda discussões se o valor para análise da tipicidade do delito deveria ser auferido com base no art. 20 ou art. 18, §1º, ambos da Lei 10.522/2002 (que tratam do ajuizamento de ação de execução ou arquivamento e extinção do débito fiscal, respectivamente).

Dirimida a controvérsia, ainda que em contrariedade da opinião do então Relator, com o consequente estabelecimento do valor disposto no art. 20 da Lei 10.522/2002, restou fixado o montante superior, permitindo o reconhecimento da atipicidade em diversos casos, havendo ainda, obviamente, outras condições a serem cumpridas para a devida incidência da bagatela, já que a reincidência impede o reconhecimento desta.

Entretanto, nestes quase 10 anos desde a formulação do Tema nº 157, sobrevieram duas resoluções do Ministério da Fazenda, sob nº 75 e nº 130. A primeira, datada de 2012, orienta pelo não ajuizamento de execuções fiscais de débitos com a fazenda nacional, cujo valor consolidado seja igual ou inferior a R$ 20.000,00 (vinte mil reais).  A segunda, em igual sentido, determina que o Procurador deverá requerer o arquivamento das execuções fiscais de débitos com a Fazenda Nacional cujo valor seja inferior a R$ 20.000,00.

Por esta razão, levando também em conta o entendimento diverso do STF, o STJ foi novamente provocado, revisando agora em 2018, em benefícios dos réus, o entendimento anterior.

 Ao julgar o REsp nº 1.688.878, por maioria de votos, o e. STJ reconheceu a possibilidade de incidência do princípio da insignificância – que exclui a tipicidade – aos crimes tributários federais e de descaminho, quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do art. 20 da Lei 10.522/2002, levando em consideração as portarias anteriormente mencionadas.

O órgão ministerial, em suas razões, havia aduzido a impossibilidade de utilização do parâmetro estabelecido em portaria para alterar Lei em sentido formal. Entretanto, o STF, ao acatar a orientação do Ministério da Fazenda no HC nº 136.834, reconheceu que até mesmo delitos anteriores à edição da portaria poderiam ser abrangidos, em decorrência da retroação de norma posterior mais benéfica em favor do acusado.

A principal crítica desta decisão reside no sentido de que o valor estabelecido, de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), é extremamente distante do patamar utilizado para verificar a insignificância em outros delitos, como nos patrimoniais. No caso de furto, por exemplo, que incide majoritariamente sobre classes sociais mais baixas, o valor máximo para reconhecimento da bagatela é infinitamente inferior.

Obviamente, tal circunstância deve ser proporcional à “lesividade do resultado”, que se observará no caso concreto e de acordo com as particularidades da vítima, seja o Estado ou ente privado.

Por fim, embora alguns comentários sobre esta decisão tenham mencionado possível tendência que levaria à impunidade, deve-se recordar que entre os requisitos para o reconhecimento da atipicidade está a reincidência. Assim, o Tribunal poderá reconhecer o crime caso o agente já tenha sido condenado anteriormente ou quando por outras circunstâncias se reconheça a lesividade da conduta, não havendo o que se falar em proteção deficiente da norma penal.

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.