TCU se posiciona sobre contratos built to suit em terrenos públicos na nova lei de licitações

Em consulta da Justiça Federal, TCU autoriza contratos de locação sob medida em terrenos públicos com cláusula de reversão ao Poder Público.
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Rick Daniel Pianaro da Silva

Advogado da área de infraestrutura e regulatório

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Síntese

Ao responder consulta sobre contratos de locação de imóveis sob medida na modalidade “built to suit” em terrenos da União, o tribunal afirmou que a modalidade é legal, mas exige a reversão do bem à Administração Pública ao final do contrato. Os contratos são considerados operações de crédito e devem seguir regras orçamentárias e de responsabilidade fiscal. O TCU alertou sobre os riscos das locações no modelo “built to suit” para a Administração Federal.

Comentário

O Tribunal de Contas da União (TCU), em consulta formulada pelo presidente do Conselho da Justiça Federal (CJF), firmou, no acórdão n.º 755/2023-Plenário, o entendimento de que é possível a celebração de contratos administrativos de locação sob medida (built to suit) em terrenos públicos com cláusula de reversão do bem ao Poder Público ao final, desde que avaliados os riscos da modalidade e justificada a sua escolha.

A consulta tratou, especificamente, da possibilidade de a Justiça Federal iniciar processo licitatório para contratar a construção sob medida de edifícios em terrenos pertencentes à União, com cláusula de reversão do bem ao Poder Público no término do prazo contratual. Desta forma, o acórdão do TCU tratou especificamente da legalidade na celebração de contratos na modalidade built to suit em imóveis públicos, bem como da natureza da operação executada.

A modalidade contratual típica de locação sob medida, prevista no art. 54-A Lei Federal
n.º 8.425/91, indica que um empreendedor deverá adquirir, construir ou reformar substancialmente o imóvel especificado pelo pretendente à locação. No âmbito do direito público, a Lei Federal
n.º 12.462/2011, do Regime Diferenciado de Contratação – RDC, em seu art. 47-A, permite à Administração a contratação no regime do built to suit. O referido dispositivo, entretanto, será revogado com a entrada em vigor da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal n.º 14.133/21), que não traz qualquer disposição sobre a possibilidade – ou impossibilidade – da celebração destes contratos.

O tema já foi objeto de uma série de decisões no âmbito do TCU acerca de sua legalidade no âmbito das contratações públicas (acórdãos n.º 1.301/2013-Plenário e nº 1.928/2021-Plenário). O primeiro deles tratou da possibilidade de dispensa de licitação para a locação sob medida e definiu que a regra da licitação só pode deixar de ser observada em casos excepcionais e devidamente justificados.  O segundo, por sua vez, estabeleceu, ao interpretar o art. 41-A, § 3º, da Lei do RDC, que o limite mensal do valor de locação de 1% do valor do bem não se aplica aos imóveis que serão revertidos à Administração ao final do contrato.

A decisão mais recente, no entanto, é inédita por se referir, no âmbito da Nova Lei de Licitações, à utilização da modalidade em imóveis que já pertencem ao Poder Público, de modo que a locação será utilizada para a construção de edifícios com pagamento mensal, como uma efetiva operação de crédito – comumente chamada de locação de ativos.

Esta operação se traduz na concessão do direito de superfície do terreno público ao empreendedor contratado, de maneira que este deverá construir ou reformar o edifício na forma especificada pelo Poder Público. A diferença com um contrato de obra comum é que, em regra, somente após a entrega da obra pronta ao Poder Público que este passa a fazer o pagamento mensal do valor da locação, remunerando de forma parcelada os investimentos realizados pelo empreendedor. Esta opção, no entanto, impõe uma justificação robusta em relação às vantagens observadas em detrimento das demais possibilidades de contratação pública, considerados os riscos inerentes à locação sob medida.

O TCU ressaltou que, em tal hipótese, a regra da licitação deve necessariamente ser observada, uma vez que, em sendo o terreno do próprio ente público, não será aplicável o inciso V do caput do art. 74 da Nova Lei de Licitações, que prevê a possibilidade de inexigibilidade de licitação em razão da localização e das instalações do edifício que será locado. Em razão de pertencer ao estado a prévia propriedade do terreno, o edifício construído ou substancialmente reformado deverá, necessariamente, ser revertido à Administração após o decurso do prazo contratual.

O acórdão ressaltou ainda que a Administração deverá elaborar, no mínimo, um pré-projeto, a fim de especificar as características mínimas do edifício, bem como deverá aprovar os projetos elaborados pelo empreendedor antes da execução das obras. Para além disso, por retratar uma operação de crédito, devem ser observadas rigorosamente as regras orçamentárias e de responsabilidade fiscal aplicáveis à hipótese.

A decisão, enfim, reafirma a jurisprudência do TCU para ratificar a licitude da locação de ativos, desde que precedida de autorização orçamentária, processo licitatório e previsão expressa de reversão do bem ao ente público. Trata-se, portanto, de decisão relevante para revestir de segurança jurídica os contratos built to suit na Administração brasileira, considerada a ausência de previsão expressa na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.

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