Síntese
A 12ª Turma do TRF4 decidiu pela ausência de competência legislativa de município para legislar sobre isenções tarifárias aplicáveis a usuários de rodovias federais sob concessão. Afirmou ser de competência exclusiva do Poder Concedente – no caso a União Federal, por meio da ANTT – o estabelecimento de benefícios tarifários. Ressalvou ainda que a instituição de isenções deve ser acompanhada da previsão em lei da origem dos recursos ou do concomitante reequilíbrio da equação econômico-financeira.
Comentário
A 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, reconheceu a ausência de competência legislativa de município para editar lei prevendo isenções tarifárias aplicáveis à concessão federal de rodovias.
O acórdão recebeu a seguinte ementa:
DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ISENÇÃO TARIFÁRIA. LEI MUNICIPAL. CONTRATO DE CONCESSÃO. RODOVIA FEDERAL. INTERFERÊNCIA INDEVIDA.
1. A concessão de isenção de pedágio a determinados veículos afeta o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão de exploração de rodovia federal, criando imposição lesiva à concessionária que não existia à época da assinatura do contrato.
2. Hipótese de contrato de concessão celebrado com a União, a quem compete legislar sobre contratos de concessão administrativa, nos termos do art. 22, inc. XXVII, da Constituição Federal, sendo indevida interferência de município na política tarifária de serviço explorado pela União. (Agravo de Instrumento n.º 5012789-54.2024.4.04.0000/PR, Relator. Desembargador Federal João Pedro Gebran Neto, DJe 22.8.2024).
O caso concreto diz respeito à lei editada pelo Município de Porto Amazonas (PR) estabelecendo “a isenção do pagamento de tarifa de pedágio aos veículos registrados em nome de moradores do Município de Porto Amazonas, que possuem vínculo empregatício na cidade de Palmeira, Estado do Paraná, e em nome de moradores que são portadores de doenças graves e necessitam de tratamento em municípios contíguos e localizados após a praça de pedágio” (Lei n.º 1.269/2024). As concessionárias de rodovias estão sujeitas à multa diária no caso de descumprimento da lei.
Ocorre que o pedágio atualmente em operação no Município de Porto Amazonas está localizado em rodovia federal, que é objeto de concessão da ANTT. Ainda que a lei seja abrangente de modo a incluir todo e qualquer pedágio cobrado no Município, no momento a concessão que pode sofrer os seus efeitos é federal.
Para ter afastados de sua esfera jurídica os efeitos de tal lei, a concessionária de rodovias federais ajuizou ação de procedimento ordinário. Requereu liminarmente, entre outras providências, que fosse autorizada a cobrar tarifas de todos os usuários previstos no seu contrato de concessão, inclusive daqueles beneficiários da isenção instituída pela lei municipal. A liminar foi deferida, e contra essa decisão foi interposto agravo de instrumento pelo Município.
Após o indeferimento do pedido de atribuição de efeito suspensivo, o recurso foi desprovido por unanimidade pela 12ª Turma do TRF4, em julgamento retratado no acórdão acima mencionado.
Há vários pontos importantes a destacar em relação a esse acórdão.
O primeiro deles é que o TRF4 reforçou ser competência exclusiva do Poder Concedente dispor sobre a política tarifária e os benefícios tarifários que serão concedidos em cada concessão, por força do art. 175 da CF/88, regulamentado pela Lei n.º 8.987/95. No caso, em se tratando de concessão federal, cabe à União, por meio da ANTT, dispor sobre esses temas.
A competência em questão foi exercida ao se estabelecerem as regras específicas da concessão, que constam do respectivo contrato. E naquele instrumento não estão previstas isenções similares àquelas instituídas pela lei municipal questionada.
Depois, o acórdão reafirmou as condições legais para que sejam conferidos benefícios tarifários, previstas no art. 35 da Lei n.º 8.987/95. Apenas podem ser instituídos por comum acordo entre as partes contratantes ou unilateralmente pelo Poder Concedente – estando a validade desta modificação contratual sujeita “à previsão, em lei, da origem dos recursos ou da simultânea revisão da estrutura tarifária do concessionário ou permissionário, de forma a preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato” (art. 35 da Lei n.º 8.987/95).
Diante disso, concluiu o TRF4, o município não detém competência legislativa para dispor sobre isenções tarifárias em concessão federal.
O TRF4 reconheceu ainda que a lei municipal, ao instituir isenção sem prever sua fonte de custeio, violou a garantia constitucional de preservação do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos administrativos (CF/88, art. 37, XXI).
Cabe registrar que o entendimento da 12ª Turma do TRF4 está em consonância com o posicionamento do STF. Em sede de controle concentrado, a suprema corte assim já decidiu:
Constitucional. Ação Direta. Lei Estadual 14.824/2009 do Estado de Santa Catarina. Isenção da tarifa de pedágio em rodovias federais do Estado para veículos emplacados em Municípios determinados. Violação aos arts. 19, III, 37, XXI, e 175, parágrafo único, da Constituição Federal. Inconstitucionalidade reconhecida. (ADI 4382/SC, Rel. Ministro Alexandre de Moraes, DJe 30.10.2018).
Por fim, não se pode deixar de mencionar a força do precedente em relação a outros casos com as mesmas características. Outros municípios do Estado do Paraná editaram leis similares, estabelecendo isenções tarifárias procurando beneficiar usuários de concessões federais. Essas leis estão com os seus efeitos suspensos por força de liminares obtidas em ações da concessionária em trâmite na JFPR. Esse julgamento colegiado consolida o entendimento do TRF4 contrário à legitimidade de tais atos legislativos.
Espera-se que, com isso, sejam desestimuladas eventuais tentativas de outros municípios de editarem leis similares.