Tributação de jogos eletrônicos: mídias físicas x mídias digitais

Reflexos tributários decorrentes da mudança no modo de acesso aos jogos eletrônicos.
Erick

Erick Fernnando da Silva Preisler

Acadêmico de direito egresso

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O mercado de videogames se atualiza de maneira constante e acelerada. Essas atualizações não se limitam ao campo tecnológico, estendendo-se, inclusive, às formas de aquisição. Jogadores não precisam mais se dirigir às lojas físicas, já que do conforto de seus lares é possível ter acesso aos jogos de mídia física, ao acessar uma plataforma de digital distribution, tais como a Steam, Origin, Playstation Store e Microsoft Store.

O acesso aos jogos por meio de mídias virtuais apresenta diversas vantagens. Nestas plataformas o jogador não compra o jogo efetivamente, mas adquire a licença para efetuar o download e para utilizá-lo. Ao contrário das mídias físicas, os games adquiridos nessas plataformas não podem ser danificados ou perdidos, podendo ser reinstalados a qualquer momento, além de apresentarem preços mais atraentes por não terem os custos de armazenamento e distribuição que oneram as mídias físicas.

Estes e outros fatores fizeram esse tipo de venda aumentar exponencialmente nos últimos anos. De acordo com o levantamento feito pela PwC, até 2020 a venda de jogos em mídias físicas de Xbox One, PS4 e PC terá uma queda de cerca de US$ 18 bilhões, e o número de jogos comercializados por suas respectivas plataformas virtuais terá um aumento de 57% no mesmo período, chegando a impressionantes US$ 13 bilhões. Ainda, de acordo com o relatório elaborado pela Reuters, a indústria de videogames movimentou cerca de US$ 116 bilhões em 2017, valor que supera a soma das indústrias de música e cinema.

Ante os expressivos números apresentados por essa indústria, a discussão sobre os aspectos tributários decorrentes da mudança do modo de acesso aos jogos eletrônicos é fundamental.

Em um passado não muito distante, quando inexistiam as plataformas de digital distribution, a única forma de ter acesso a um jogo digital era se dirigir a uma loja e comprar a mídia física do jogo. Essa operação se tratava de compra de “software de prateleira”, isto é, compra de um software padronizado, revendido pelo comerciante ao consumidor final. Sobre essa operação, não restavam dúvidas quanto à incidência do ICMS, pois se trata de uma mercadoria.

Acontece que a tecnologia se desenvolve a passos muito mais rápidos que as políticas de tributação, o que acaba por ocasionar a obsolescência de práticas recentes. Esse fato é claramente visível quando se trata de operações com jogos eletrônicos e/ou softwares em geral. Atualmente existem inúmeras formas de se ter acesso a um software sem que se precise comprar a mídia física para realização da sua instalação.

Neste contexto surgem inúmeras dúvidas em relação à tributação dessas operações. Deve incidir o ICMS mesmo inexistindo mídia física? Na negativa, como se deve tributar essa operação?

Visando dar um norte a essa discussão e, principalmente, buscando afastar a possibilidade de os municípios tributarem as operações, foi publicado pelo CONFAZ o Convênio ICMS 106/2017. Este convênio teve como objetivo central a viabilização da cobrança do ICMS sobre bens e mercadorias digitais.

O convênio definiu os bens digitais que estariam sujeitos à sua aplicação. Além de mencionar os softwares em sentido amplo, trouxe expressamente que também se aplica aos jogos eletrônicos, desde que estes sejam padronizados (ainda que possam ser adaptados) e comercializados por meio de transferência eletrônica.

Da análise do convênio é possível concluir que seria devida a sua aplicação às plataformas de digital distribution. Além da aplicação aos jogos eletrônicos, o convênio estipulou que o sujeito passivo pode ser a pessoa jurídica detentora de plataforma digital que disponibilize bens e mercadorias digitais mediante transferência eletrônica de dados. Por fim, estabeleceu que é aplicável ainda que o pagamento se dê de forma periódica, o que é muito comum para as plataformas de digital distribution que permitem o download de determinada quantidade de jogos mensalmente.

Descontentes com a posição dos Estados, o conteúdo do Convênio e a competência do CONFAZ para legislar sobre a matéria têm sido questionados. A discussão é capitaneada pelos Municípios e pelas indústrias, que ajuizaram Ação Direta de Inconstitucionalidade perante o STF (ADI 5958/DF).

Portanto, além de o convênio não ter resolvido o problema da tributação dos jogos eletrônicos, acirrou ainda mais a guerra fiscal entre os municípios e os estados.

A insegurança jurídica causada pela guerra fiscal afasta investimentos e os empreendedores do segmento, desestimulados diante da possibilidade de dupla-tributação. Diante do promissor cenário da indústria de games, é imprescindível o desenvolvimento de um ambiente jurídico favorável à produção e circulação de riquezas.

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