Uso e ocupação da faixa de domínio de rodovias concedidas: há limites para contraprestação?

Para além dos debates judiciais, a cobrança de tarifas pelo uso e ocupação da faixa de domínio é assegurada legalmente às concessionárias de rodovias.
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Stephanie Pereira Ribeiro

Advogada da área de infraestrutura e regulatório

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Síntese

Em que pese o tratamento já atribuído ao tema pelo ordenamento jurídico, a jurisprudência salienta a importância de previsão contratual para legitimar a cobrança, pelas concessionárias, pelo uso e ocupação da faixa de domínio de malhas rodoviárias concedidas.

Comentário

Ao regulamentar o artigo 175, caput, da Constituição Federal, a Lei de Concessões (Lei Federal n.º 8.987/1995) consagrou em seu artigo 6º, § 1º, o princípio da modicidade tarifária dentre aqueles que regem a prestação de um serviço público adequado aos usuários.

Por outro lado, tal lei também assegurou aos concessionários e permissionários, especialmente em seu artigo 11, a possibilidade de auferirem, nos termos dos respectivos editais de licitação, fontes provenientes de “receitas alternativas, complementares, acessórias ou de projetos associados, com ou sem exclusividade”, a fim de favorecer a modicidade das tarifas e lhe garantir a justa remuneração pelos serviços prestados.

Apesar de se tratar de garantia assegurada pelo ordenamento jurídico, a fruição destas receitas encontra certas limitações, especialmente quando envolve contraprestação pelo uso e ocupação da faixa de domínio de malhas rodoviárias concedidas.

Em recente Acórdão proferido nos autos n.º 1000284-03.2022.8.26.0072, a 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo reafirmou a jurisprudência daquela Corte e do Superior Tribunal de Justiça quanto à legitimidade da cobrança de tarifas pelas concessionárias nestas hipóteses, desde que tal medida possua respaldo contratual.

Na oportunidade, avaliou-se ação movida por concessionária de serviço público rodoviário em face de sociedade de economia mista responsável pelo fornecimento de água, coleta e tratamento de esgotos de municípios do Estado de São Paulo, tendo por objeto a cobrança de valores decorrentes de contrato oneroso celebrado entre ambas para ocupação/uso da faixa de domínio.

Em primeiro grau, reconheceu-se que a situação possuía respaldo não apenas constitucional e legal, mas também contratual, seja no Regulamento da Concessão e no Contrato celebrado junto ao Poder Concedente, seja no específico contrato ajustado entre as concessionárias.

Na ocasião, inclusive, afastou-se a aplicação ao caso da Tese Vinculante firmada no Incidente de Assunção de Competência n.º 8 do Superior Tribunal de Justiça, segundo o qual “É indevida a cobrança promovida por concessionária de rodovia, em face de autarquia prestadora de serviços de saneamento básico, pelo uso da faixa de domínio da via pública concedida”, uma vez que a requerida não se tratava de autarquia, mas de sociedade de economia mista, com natureza jurídica, portanto, diversa.

Com isso, foi acolhida a pretensão de condenação da demandada ao pagamento de tarifa pelo uso/ocupação da faixa de domínio em relação ao período em que restou inadimplente.

Em grau recursal, este entendimento foi confirmado pelo Tribunal, que também diferenciou a situação analisada da discussão afeta ao Tema 261 do Supremo Tribunal Federal, fruto do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 581.947, dotado de repercussão geral. Segundo os Desembargadores, enquanto o Tema 261 envolve o pagamento de “taxas” ____ consignando ser inconstitucional a cobrança “pelo uso de espaços públicos dos municípios por concessionárias prestadoras do serviço público de fornecimento de energia elétrica” ____, a controvérsia submetida à apreciação do Tribunal de Justiça Paulista envolvia o pagamento de “tarifa”, isto é, contraprestação administrativa de natureza jurídica distinta.

Houve, contudo, divergência em relação às parcelas vincendas: em primeiro grau, rejeitou-se o pedido de condenação da requerida a tal pagamento ____ especialmente porque, segundo o magistrado, a par do contrato e termo de concessão celebrados, a tarifa pelo uso da faixa de domínio seria exigível anualmente. Já em segundo grau, recorreu-se ao tratamento atribuído pelo artigo 323 do Código de Processo Civil às prestações periódicas, argumentando-se que as parcelas vincendas estão incluídas no requerimento de pagamento ainda que implicitamente.

Como se nota, o assunto rende debates. Aparenta fugir de discussões, no entanto, a necessidade de previsão contratual para legitimar a cobrança pelo uso e ocupação da faixa de domínio de malhas rodoviárias concedidas, já respaldada pelo ordenamento jurídico vigente.

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