A nova Lei do Agronegócio

A “Lei do Agro” (Lei n.º 13.986/2020) inaugura um novo marco regulatório do agronegócio e relevante instrumento de incentivo ao financiamento da atividade rural
Bruno-Marzullo-Zaroni

Bruno Marzullo Zaroni

Head da área de contencioso e arbitragem

Compartilhe este conteúdo

Mesmo num ano de incomparável crise, o agronegócio tem passado incólume pelos efeitos deletérios da pandemia. O agronegócio, que já representava 21,4% do PIB brasileiro em 2019, apresenta prognóstico de crescimento em 2020, conforme dados da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

De modo a impulsionar ainda mais o crescimento do setor, foi promulgada a Lei do Agronegócio (Lei n.º 13.986/20). Dentre suas principais novidades, podem ser destacadas aqui aquelas destinadas ao financiamento do agrobusiness.  

A lei institui instrumentos que tornam mais célere e desburocratizam a obtenção de  financiamentos, diminuem os custos de transação para a concessão do crédito rural, outorgam maior proteção aos credores e, por conseguinte, criam um ambiente propício para a expansão da atividade agrícola.

Ponto fulcral desta lei consiste na criação do patrimônio rural em afetação. Tal instituto viabiliza a segregação do patrimônio do produtor rural para se estabelecer garantia em operações de crédito. Pelo referido instrumento, os bens integrantes do patrimônio rural em afetação não se comunicam com os demais bens, direitos e obrigações do produtor rural ou de outros bens em afetação por ele constituídos.

A lógica é permitir ao produtor rural a vinculação de todo ou apenas de fração de seus imóveis como garantia de operação de financiamento, nos limites da própria legislação (arts. 7o e 8o), mediante a emissão de Cédula de Produto Rural (CPR) ou de Cédula Imobiliária Rural (CIR).

A CIR representa título de crédito emitido por produtor rural proprietário de imóvel rural para obtenção de crédito. A ferramenta outorga segurança à operação creditícia, pois, caso o emitente deixe de honrar a obrigação, o agente financiador ou o portador do crédito poderá efetivar de imediato a transferência, para a sua titularidade, do imóvel dado em garantia (ainda que fração dele, mediante procedimento de desmembramento).

Já quanto à conhecida CPR (regulada pela Lei n.º 8.929/94), a inovação da Lei do Agronegócio consiste na ampliação dos legitimados para a sua emissão (não cabendo apenas ao produtor, mas às cooperativas e às associações de produtores).

Aspecto relevante é que a constituição do patrimônio de afetação deve ser anterior à emissão tais títulos. Ademais, a lei estabelece que nenhuma garantia real, exceto por emissão de CIR ou de CPR, poderá ser constituída sobre o patrimônio rural em afetação. Logo, não se autoriza a múltipla oneração do mesmo imóvel, tal como se dá com a hipoteca.

Em caso de inadimplemento pelo produtor rural, a nova lei traz maior segurança aos credores.  No caso da CIR, além da execução para obtenção da entrega do bem, o credor pode
valer-se das normas previstas no processo extrajudicial de consolidação de propriedade de imóvel alienado fiduciariamente (Lei da Alienação Fiduciária). Há, porém, aprimoramentos: o credor que promove o leilão – nos moldes da Lei n.º 9514/1997 – e não obtém lance igual ou superior ao valor da dívida, somado aos valores das despesas, dos prêmios de seguro e dos encargos legais, incluídos os tributos, poderá exigir, mediante processo de execução, o valor remanescente de seu crédito, sem que haja direito de retenção ou de indenização sobre o imóvel alienado.

Ainda sob o viés dos interesses do credor, vale registrar que o patrimônio em afetação, além de não ser atingido pelos efeitos da decretação de falência, insolvência civil ou recuperação judicial do proprietário de imóvel rural, não integra a massa concursal.

A nova Lei do Agronegócio ainda promove alterações nas legislações que regulam a aquisição de imóvel por pessoas físicas jurídicas estrangeiras (Leis n.ºs 5.709/71 e 6.634/79), excetuando que as restrições legais não se aplicam à constituição e execução de garantias sobre imóveis rurais, inclusive a transmissão da propriedade fiduciária em favor da pessoa jurídica estrangeira, nem aos casos de recebimento de imóvel em liquidação de transação com pessoa jurídica, nacional ou estrangeira, ou pessoa jurídica nacional da qual participem pessoas estrangeiras físicas ou jurídicas com a maioria do seu capital social e que residam ou tenham sede no exterior, por meio de realização de garantia real, de dação em pagamento ou de qualquer outra forma.

Portanto, o regime instituído pela legislação visa fomentar investimentos estrangeiros no agronegócio e, consequentemente, estimular a competitividade na oferta de crédito para o segmento.

Embora as mudanças propiciadas pela Lei do Agronegócio sejam muito mais amplas do que as aqui brevemente relatadas, denota-se que legislação chega em boa hora, estimulando o acesso ao crédito privado e o impulsionando o ainda tímido mercado de capitais relacionado ao agronegócio. Suas externalidades positivas são variadas e inegáveis: maior facilitação do crédito, estímulo ao agronegócio, aprimoramento da segurança jurídica nas operações de crédito e, em última análise, criação de um ambiente favorável ao desenvolvimento  econômico.

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.