A prorrogação contratual como mecanismo de reequilíbrio econômico-financeiro de concessões

A prorrogação corretora em concessões é alternativa eficiente e menos onerosa para a recomposição econômico-financeiro em contratos de longo prazo.
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Leonardo Catto Menin

Advogado egresso

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Diferentemente dos contratos públicos comuns realizados nos termos da Lei Federal n.º 8.666/93 (agora Lei Federal n.º 14.133/21) _ que são ajustados, em regra, por prazos de até um exercício financeiro, prorrogáveis pelo prazo máximo de até cinco anos _ , as concessões públicas regidas pela Lei Federal n.º 8.987/95 não possuem prazo máximo estabelecido legislativamente, devendo este ser estipulado no edital licitatório, a depender da estrutura econômico-financeira planejada para a concessão.

Assim ocorre, pois, que as concessões possuem uma lógica econômico-financeira muito diferente daquela observada nas contratações públicas em geral. Nas contratações simples, há o fornecimento imediato de bens e serviços pelo particular ao Estado mediante a contraprestação pecuniária correspondente: deve haver equilíbrio entre preço pago e produto ou serviço fornecido. Já as concessões envolvem investimentos iniciais significativos por parte do concessionário, que assume riscos contratualmente estabelecidos mediante a expectativa de retorno do valor investido com a prestação de serviços a longo prazo. Trata-se de arranjo oportuno para todas as partes: ao Estado, que se desincumbe do dever de realizar vultuosos investimentos e de executar serviços custosos em uma conjuntura de redução de receitas; aos usuários, que passam a ter disponível serviço de melhor qualidade, mediante tarifas módicas controladas pelo Estado; e ao concessionário, que tem a oportunidade de realizar investimentos em um contexto seguro, com riscos conhecidos previamente.

A alocação dos riscos nos contratos de concessão é elemento chave para se compreender a lógica envolvida na operação e, consequentemente, sua equação econômico-financeira. Tratando-se de serviços de titularidade do Estado, este, anteriormente à concessão, arca inteiramente com os riscos de sua prestação. Uma vez concedidos os serviços, ao concessionário são transmitidos aqueles riscos estabelecidos em contrato (precificados), permanecendo para o Estado os riscos não transferidos ao particular.

Uma vez realizados os riscos não alocados ao particular mediante contrato (riscos extraordinários), caso estes interfiram na equação econômico-financeiro da concessão, em prejuízo ao concessionário, este passa a ter o direito de ter reequilibrado o contrato, devendo o Ente concedente acordar mecanismos de restabelecimento.

Para se restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, há diversos mecanismos disponíveis aos contratantes, sendo os mais comuns o reajuste tarifário e o efetivo pagamento, pelo Poder Público, de valores ao concessionário. Entretanto, ambas as hipóteses podem trazer consequências indesejáveis: oneram excessivamente os usuários, com o aumento da tarifa, ou o Estado, já em grave crise financeira, com o pagamento direto ao concessionário. Para além desses mecanismos, mais comuns, chama a atenção a possibilidade da prorrogação corretora.

Prorrogação corretora, assim chamada pelo jurista português Lino Torgal, consiste na prorrogação do prazo do contrato de concessão para corrigir desequilíbrios desfavoráveis ao concessionário. Assim, aumenta-se o prazo do contrato para que o concessionário possa reaver, mediante a prestação remunerada de serviços por maior prazo, os valores que pagou ou deixou de ganhar indevidamente. Veja-se que, nestes casos, não há prejuízo para nenhuma das partes: os usuários continuarão a arcar com as mesmas tarifas pelo mesmo serviço e o Estado não será compelido a gastar verbas que não possui.

Dessa forma, mediante a prorrogação corretora, Estado e concessionário administram riscos extraordinários na prestação do serviço público sem que isso implique redução na qualidade dos serviços prestados ou aumento de gastos governamentais e dos usuários finais. Ademais, estará sendo prorrogado contrato que foi submetido a prévio e devido processo licitatório, com a concessionária vencedora do pleito _ de modo que é prorrogada a prestação do serviço constante da melhor proposta à época da licitação. Assim, a rigor, não se trata de burla ou exceção indevida à vinculação ao instrumento convocatório, mas de possibilidade contemplada pela própria concorrência que o originou.

A prorrogação corretora foi reconhecida pelo Tribunal de Contas da União como legítima no Acórdão n.º 774/2016, do Tribunal Pleno que, diante de particularidades do caso concreto, concluiu pela sua possibilidade, desde que demonstrada a ocorrência de risco extraordinário, a necessidade de recomposição do equilíbrio econômico-financeiro e a inviabilidade de outros mecanismos de correção. Entretanto, em outros casos, inclusive posteriormente, a mesma Corte concluiu pela ilegalidade da prorrogação corretora, sem avaliar exceções.

Diante da legalidade da prorrogação corretora, bem como das vantagens que podem ser geradas aos envolvidos em projetos concessionários, espera-se que o entendimento dos órgãos de controle evolua no sentido de, definitivamente, fixar a legitimidade desta prática, colaborando para um ambiente mais favorável a contratos públicos mais eficientes e alinhados aos objetivos de todos os interessados ___ Estado, particulares e, em especial, os próprios usuários.

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