Síntese
A legislação e a jurisprudência têm construído a possibilidade de responsabilizar os sócios, diretores ou administradores de pessoas jurídicas por crimes ambientais mesmo quando eles não praticaram os ilícitos diretamente. A compreensão do tema é necessária para identificar estratégias preventivas que podem ser implementadas mediante instituição de programas de compliance interno ou outros meios de organização societária.
Comentário
A atividade empresarial é essencial para o desenvolvimento social. No mundo globalizado e complexo que vivemos, sua importância aumenta. A complexidade de serviços e bens demanda a união e colaboração de pessoas, o que é praticamente inviável sem uma estrutura societária organizada.
Consequentemente, temos distintos tipos de sociedades empresariais. Algumas, com um único sócio e estrutura bastante simples. Outras, com diversos sócios e estrutura estratificada e complexa como, por exemplo, as sociedades anônimas. De qualquer modo, de todas elas se esperam boas práticas, internas ou externas.
Neste sentido, ganha cada vez mais espaço o termo ESG (environmental, social and corporate governance). Significa, resumidamente, respeito ao meio ambiente, boas relações com os clientes, funcionários e sociedade, além de boas práticas de administração. Não se tolera mais que uma empresa forneça um bom produto, mas, em contrapartida, prejudique a sociedade de modo geral.
Partindo desta premissa, merece atenção, também, a análise do modo pelo qual se configura a responsabilidade da pessoa jurídica, seus sócios e administradores por conta de eventuais crimes ambientais.
Segundo o artigo 2º da Lei n.º 9.605/98, incorrem nas penas cominadas aos crimes previstos na referida lei quem, de qualquer forma, concorrer para a sua prática (ainda que na medida da sua culpabilidade – sempre subjetiva). Podem vir a ser responsabilizados por delitos ambientais praticados pela sociedade ou em favor dela os diretores, administradores, membros de conselho ou órgão técnico, auditores, gerentes, inclusive mandatários da pessoa jurídica que, sabendo da conduta criminosa de outrem, deixem de impedir sua prática quando podiam agir para evitá-la.
Ainda, a própria pessoa jurídica também pode ser responsabilizada, seja administrativamente, civilmente ou na via criminal. Pode soar estranho falar em responsabilidade penal da pessoa jurídica, mas ela poderá ser punida na esfera criminal nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Nestas situações, a lei não exige que a pessoa a ser responsabilizada tenha, necessariamente, praticado a conduta. E este entendimento é reconhecido e aplicado pelo STJ. Conforme trecho do acórdão do HC n.º 388.874/BA, de relatoria do Ministro Rogerio Schietti Cruz: “Consoante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça “não sendo o caso de grande pessoa jurídica, onde variados agentes poderiam praticar a conduta criminosa em favor da empresa, mas sim de pessoa jurídica de pequeno porte, onde as decisões são unificadas no gestor e vem o crime da pessoa jurídica em seu favor, pode então admitir-se o nexo causal entre o resultado da conduta constatado pela atividade da empresa e a responsabilidade pessoal, por culpa subjetiva, de seu gestor” (RHC n. 71.019/PA, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, 6ª T., DJe 26/8/2016).
A exceção, como visto no trecho do precedente acima reproduzido, seria no caso de ‘grande pessoa jurídica’. A circunstância excepcional ocorre pelo raciocínio de que, via de regra, grandes empresas contam com complexidade organizacional elevada. Ao serem constituídas por diversos departamentos e órgãos internos, muitas vezes independentes, com autonomia em suas respectivas áreas, é comum que diversos atos ou decisões não cheguem ao conhecimento de diretores e administradores. Assim, é possível cogitar a exclusão da responsabilidade destes por eventuais crimes ambientais praticados. No entanto, a legislação e a jurisprudência têm se consolidado em sentido diverso, o que, em nossa interpretação, configura-se hipótese de responsabilidade objetiva.
Em conclusão, verifica-se que, atualmente, o risco de que um diretor, administrador ou sócio venha a responder pelos atos de terceiro dentro de sua empresa é elevado. Ciente deste risco, é de grande valor a implementação de programas de prevenção (compliance) e também a manutenção da organização interna da empresa, a fim de evitar punições nas diversas esferas, sem deixar de observar o respeito ao meio ambiente.