Alocação de riscos na nova lei de contratações públicas

Com a Lei n° 14.133/2021, o tema da alocação de riscos chega a todos os tipos de contratação, ampliando a atratividade dos contratos administrativos.
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Angélica Petian

Sócia-diretora

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A nova lei de contratações públicas ____ Lei n.º 14.133, de 01.04.2021 ____ trouxe para a disciplina dos contratos administrativos a figura da matriz de riscos.

A previsão de uma alocação ex ante dos riscos que podem acometer a execução contratual é pouco utilizada para a contratação de obras, serviços e aquisições em geral e mais conhecida e praticada no ambiente dos contratos de longo prazo (notadamente contratos de concessão comum e parceria público-privadas – PPPs). Na ampla maioria dos contratos regidos pela Lei Federal n.º 8.666/1993, a alocação dos riscos sujeita-se à disciplina da teoria das áleas, do art. 65, II, d.

Em termos simples, essa teoria aloca à responsabilidade do contratado os riscos ordinários, típicos do negócio, ao passo que riscos extraordinários ensejariam recomposição em favor do contratado, quando sua materialização impactar a equação econômico-financeira.

A maturação deste assunto se deu a partir da consolidação do regime concessório, em especial com a Lei das PPPs, e o tema passou a permear outras modalidades de contratação. Nesse sentido, a Lei do Regime Diferenciado de Contratações Públicas prevê expressamente a possibilidade de contemplar matriz de alocação de riscos (art. 9º, §5º). Também a Lei n.º 13.303/2016 (Lei das Estatais) avançou nessa direção e antecipou a obrigatoriedade de o contrato a ser celebrado pelas empresas estatais contemplar matriz de risco quando a contratação se der sob a forma integrada ou semi-integrada.

Com a edição da nova Lei Geral de Licitações e Contratos, a alocação de riscos passa a abranger todos os tipos de contratação, com a possibilidade de inserir no termo de contrato uma matriz que antecipe os riscos que podem se materializar durante a execução do ajuste e os aloque à parte que tem mais condições de impedir sua ocorrência ou de mitigar os seus efeitos com o menor custo.

Não obstante essa faculdade, estabelecida pelo art. 22 da Lei n.º 14.133/2021, a lei prescreve que nas contratações de obras e serviços de grande vulto (aquelas cujo valor estimado supera R$200.000.000,00) ou quando forem adotados os regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital obrigatoriamente deverá contemplar a matriz de alocação de riscos entre o contratante e o contratado.

Nos demais casos, como dito, o edital poderá contemplar matriz de alocação de riscos, hipótese em que o cálculo do valor estimado da contratação poderá considerar taxa de risco compatível com o objeto da licitação e com os riscos atribuídos ao contratado, de acordo com metodologia predefinida pelo ente federativo, ou seja, a ser futuramente estabelecida em âmbito infralegal.

A matriz deverá promover a alocação eficiente dos riscos de cada contrato e estabelecer a responsabilidade que caiba a cada parte contratante, bem como os mecanismos que afastem a ocorrência do sinistro e mitiguem os seus efeitos, com expressa determinação no sentido de que os riscos que tenham cobertura oferecida por seguradoras serão preferencialmente transferidos ao contratado.

A principal função da matriz de alocação de riscos é definir o ponto de equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato e permitir seu cotejo quando da materialização de eventos supervenientes que impactem a equação econômica.

A eficiente alocação de riscos reduz a insegurança jurídica e turbina a atratividade do contrato, permitindo que os potenciais interessados precifiquem desde já os riscos que terão que assumir e adotem providências tão eficientes quanto possível para reduzir sua probabilidade de ocorrência.

O assunto é novo para as contratações mais ordinárias do Poder Público e, portanto, estará submetido à curva de aprendizagem necessária, tanto em relação à elaboração da matriz de risco como, especialmente, em relação à sua execução e interpretação.

A fim de auxiliar o Poder Público, a Lei n° 14.133/2021 estabelece que poderão ser adotados métodos e padrões usualmente utilizados por entidades públicas e privadas, e os ministérios e secretarias supervisores dos órgãos e das entidades da Administração Pública poderão definir os parâmetros e o detalhamento dos procedimentos necessários à identificação dos riscos, sua alocação e quantificação financeira.

A nova lei representa um avanço à consolidação da alocação de riscos no âmbito das contratações públicas.

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