As empresas podem ser contratadas pela Administração Pública mesmo quando a margem de lucro é zero?

A margem de lucro zero não configura inexequibilidade de preços, trata-se de estratégia empresarial licita a luz do entendimento do TCU.
Helen

Helen Esteves Marcante

Advogada egressa

Compartilhe este conteúdo

Síntese

O TCU assentou o entendimento acerca da legalidade da apresentação de proposta com lucro zero. Nos termos da recente decisão, a margem de lucro mínima ou ausência dela não caracteriza a inexequibilidade da proposta, já que isso depende da estratégia comercial de cada empresa, devendo a Administração diligenciar junto à licitante, para a comprovação da exequibilidade da proposta.

Comentário

A inexequibilidade da proposta é definida pelo art. 48 da Lei nº 8.666/1993, bem como dispõe que os critérios de desclassificação devem estar obrigatoriamente especificados no edital de licitação.

O Tribunal de Contas da União – TCU, por meio do Acordão nº 839/2020 – Primeira Câmara, discutiu a legalidade da desclassificação de empresa licitante sob a justificativa de inexequibilidade da proposta apresentada constar a margem de lucro zero.

É preciso lembrar que o item “lucro” que compõe a proposta comercial insere-se na margem de discricionariedade dos licitantes. Nem poderia ser diferente, uma vez que a liberdade na apresentação das propostas constitui característica essencial do exercício da livre iniciativa, consagrado no  art. 170 da Constituição Federal.

Como o lucro deve ser definido pelo licitante, em consonância com a sua realidade, não há determinação normativa que indique qual deve ser a forma de composição do percentual relativo a esse item.

No caso analisado pelo TCU, a empresa licitante apresentou um saldo final descoberto, isto é, com lucro negativo. A partir dessa alegação, o pregoeiro entendeu pela inexequibilidade da proposta.

No entanto, conforme decidiu o TCU, não basta essa simples análise para constatação de inexequibilidade. Conforme aduziu o voto do Ministro-Substituto Weder de Oliveria, a aferição da inexequibilidade não deve se pautar exclusivamente pela diferença entre o preço ofertado e custos estimados, tomando por parâmetro decisório a existência de lucro zero ou prejuízos. Tanto é assim que esse critério sequer consta do inciso II do artigo 48 da Lei 8.666/1993.

A relevância de se avaliar a exequibilidade da proposta está em inferir a existência de elevado risco de ocorrência de inexecução do contrato, o qual deve ser averiguado por meio de diligências, visando a comprovação da capacidade econômica da licitante.

Para fins de cálculo de inexequibilidade da proposta comercial, os critérios estabelecidos na Lei nº 8.666/1993 não são absolutos, devendo a instituição pública contratante adotar providências para aferição da viabilidade dos valores ofertados antes da desclassificação da proponente.

É cristalino, portanto, que devem ser definidos critérios objetivos e claros de aceitabilidade de preços unitários e globais, não cabendo à comissão de licitação ou pregoeiro declarar a inexequibilidade da proposta da licitante sem antes facultar aos participantes do certame a possibilidade de comprovar a viabilidade de suas propostas.

A comprovação deve ser oportunizada à licitante mediante diligência realizada pela Administração para aferir a legalidade e exequibilidade da proposta. Importa frisar que a ocorrência de lucro zero ou prejuízo de pequena monta não leva, inexoravelmente, à conclusão de inexequibilidade, nem a lei assim determina. A esse respeito, a proposta somente seria considerada inexequível no caso de o licitante não conseguir comprovar que possui ou possuirá recursos suficientes para executar o objeto do certame, por ser o lance insuficiente para a cobertura dos custos da contratação.

Saliente-se que a Administração tem o dever de cuidar da coisa pública, não dispendendo, ao seu talante, recursos desnecessários. Isso significa dizer que deve ser utilizada a solução mais oportuna, eficiente e mais econômica de forma a prevaler a melhor gestão dos recursos públicos.

Nesse contexto, o TCU determinou a anulação do ato de desclassificação da proposta, entendendo que a boa execução do contrato depende de diligente atuação da fiscalização e do cumprimento das obrigações contratuais a cargo da entidade licitante.

Por fim, conclui-se que não há impedimento legal para que as empresas contratadas pela Administração Pública atuem sem margem de lucro ou com margem de lucro mínima, pois tal fato depende de estratégia empresarial/comercial da empresa e não conduz, necessariamente, à inexequibilidade da proposta.

Gostou do conteúdo?

Cadastre-se no mailing a seguir e receba novos artigos e vídeos sobre o tema

Quero fazer parte do mailing exclusivo

Prometemos preservar seus dados pessoais e não enviar spam
Recomendamos a leitura da nossa Política de Privacidade.