Dos males, o menor: recuperação judicial de empresas em tempos de crise econômica

A opção pela Recuperação Judicial (RJ), além de unificar a renegociação das obrigações, permitirá um olhar mais atento às urgências da empresa por parte do Judiciário.
Tayane-Priscila-Tanello

Tayane Tanello

Advogada egressa

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Gradativamente, os impactos da pandemia do COVID-19 vão deixando o plano das especulações e se materializando em indicativos concretos. Segundo pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 70% das empresas em funcionamento até o fim do primeiro semestre de 2020 foram impactadas negativamente e mais de 73% enfrentaram dificuldades para realizar pagamentos de rotina. Como consequência, um dado previsível: três em cada cinco empresas que findaram suas atividades no período analisado indicaram como motivo de encerramento os impactos da pandemia do COVID-19.

Diante do cenário econômico desfavorável, as empresas enfrentam problemas que variam desde a escassez de matéria-prima disponível até a falta de caixa para pagamento de fornecedores, folha de pagamento, gastos ordinários e, até mesmo, impostos. Como consequência, há reações em cadeia que transcendem a empresa, afetando consumidores, fornecedores, funcionários e até a própria estabilidade do mercado.

É preciso considerar que o inadimplemento de obrigações pode culminar no ajuizamento massivo de ações judiciais visando a cobrança daquilo que não foi cumprido. Por outro lado, caso a empresa devedora opte por exercer o direito de revisão de seus contratos, baseando-se na ocorrência de caso fortuito ou força maior, serão outras centenas de milhares de ações desta natureza ajuizadas. Nenhuma das duas opções, porém, é suficiente para garantir o adimplemento do crédito ou a manutenção da empresa em funcionamento.

Neste contexto, é importante que o empresário saiba que pode contar com a tutela do Poder Judiciário para viabilizar, de uma única vez, a superação da situação de crise econômico-financeira. Dessa forma, garante-se a manutenção da fonte produtora, dos empregos e também dos interesses dos credores. Tudo em consonância com o objetivo de preservação da empresa, bem como da sua função social, e de estimular a atividade econômica.

A Recuperação Judicial, tal como a Falência, é regida pela Lei nº 11.101/05, mas se diferencia dela porque pretende possibilitar a retomada da solvência de uma empresa que enfrenta dificuldades superáveis, enquanto a segunda visa minimizar os danos de uma empresa com problemas irreversíveis. Ao contrário da Falência, só a própria empresa devedora pode requerer a RJ, e desde que preencha determinadas exigências estabelecidas na referida lei.

Nos termos da legislação, uma vez autorizado o processamento da recuperação judicial por parte do juízo competente, a empresa passa a usufruir de um período para organização interna. Durante 180 dias (stay period), são suspensas todas as ações e execuções de dívidas líquidas movidas contra a devedora. Neste período, há também uma fase negocial com credores, a partir do que se estabelecerá um “plano” para estipular prazos e formas de pagamento das dívidas arroladas. Satisfeitos os requisitos legais, o Plano de Recuperação é homologado e a empresa poderá, então, iniciar o cumprimento das obrigações na forma acordada.

Não se ignora que, ainda que optar pela Recuperação Judicial resolva parcialmente os problemas, o futuro segue sendo extremamente imprevisível.

Por isso, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou uma série de recomendações quanto à condução dos processos de Recuperação Judicial durante a pandemia, que viabiliza a flexibilização das regras de acordo com as necessidades da empresa devedora.

Dentre as novidades ____ que já estão sendo cumpridas em decisões judiciais ____ está a possibilidade de prorrogação do prazo de stay period, autorização de interrupção parcial ou total dos pagamentos por prazo a ser determinado, modificação do plano de recuperação original em razão da diminuição da capacidade de cumprimento das obrigações, ponderacão, com maior cautela, relativamente aos pedidos de medidas de urgência (como despejos ou constrições patrimoniais) requeridas contra o devedor, dentre outras. Mas não é só.

O Poder Judiciário tem se adaptado para auxiliar o empresário também na fase pré-processual. No Paraná, a criação de um Centro Judiciário de Solução de Conflitos (CEJUSC) voltado exclusivamente à Recuperação Empresarial é iniciativa pioneira no país e promete aproximar (ainda que virtualmente) credores e devedores para viabilizar a negociação das obrigações que virão a ser objeto do Plano de Recuperação. Iniciativas como esta vêm sendo cogitadas em outros Estados.

A Recuperação Judicial é viável e tal opção deve ser cogitada pela empresa que se encontra em profunda dificuldade financeira, mas com possibilidade (e desejo) de se restabelecer. Além de viabilizar e unificar as negociações, a medida possibilitará que a empresa encontre balizas mais flexíveis no Poder Judiciário, o que é imprescindível neste momento permeado por inúmeras incertezas.

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