O dano ao erário no crime de fraude ao caráter competitivo da licitação segundo a Súmula 645 do STJ

Compreenda de que forma o Superior Tribunal de Justiça (STJ) avalia o dano ao erário no crime de fraude ao caráter competitivo da licitação.
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Dante D’Aquino

Head da área penal empresarial

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Síntese

A fraude ao caráter competitivo do certame pode ou não causar prejuízo ao erário. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça sumulou o entendimento sobre a consumação do crime de frustração ao caráter competitivo, agora previsto no artigo 337-F do Código Penal. Veja de que modo a jurisprudência do STJ interpreta eventual vantagem ou prejuízo causado à Administração Pública.

Comentário

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça publicou a Súmula n.º 645. Infere-se, de seu enunciado, que a consumação do delito de fraude ao caráter competitivo da licitação prescinde de comprovação de prejuízo ou de obtenção de vantagem.

Atualmente, o crime de frustrar o caráter competitivo está previsto no artigo 337-F do Código Penal, com pena de 04 a 08 anos de reclusão. A pena, que foi agravada pela Lei n.º 14.133/2021 _ ao dobrar a pena mínima até então prevista na Lei n.º 8.666/93 _, recairá sobre aquele que frustrar ou fraudar, com o intuito de obter para si ou para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação, o caráter competitivo do processo licitatório.

Portanto, o Superior Tribunal de Justiça exauriu a controvérsia até então existente sobre a consumação do referido delito. Em resumo, a Corte definiu que o referido tipo penal é formal, espécie que não exige um resultado para sua consumação, bastando a prática da conduta ilícita.

Nas palavras do Ministro Joel Ilan Paciornik, “à luz da jurisprudência do STJ, o delito descrito no art. 90 da Lei n. 8.666/1993 é formal, bastando para se consumar a demonstração de que a competição foi frustrada, independentemente de demonstração de recebimento de vantagem indevida pelo agente e comprovação de dano ao erário.” (HC 341341 / MG, Quinta Turma).

Tal entendimento se encontra em plena consonância com a jurisprudência que vinha sendo firmada pela Corte. Inúmeros julgados já reconheciam que bastaria a frustração do caráter competitivo do procedimento licitatório por meio de ajuste, combinação ou qualquer outro expediente com finalidade específica de obter vantagem decorrente do objeto de adjudicação, sendo desnecessária a efetiva obtenção da vantagem, contratação ou prejuízo para a Administração Pública. (HC 373027 BA, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 20.02.2018, DJe 26.02.2018).

Por sua vez, com a nova redação do artigo dada pela Lei n.º 14.133/2021, sequer é necessário ajuste, combinação ou qualquer outro meio semelhante. Portanto, poderá responder pela fraude quem, mesmo sozinho, fraudar ou frustrar o caráter competitivo.

Desta feita, o prejuízo ao erário consiste apenas em mero exaurimento do crime, que poderá estar presente ou não. Isto quer dizer, de outro lado, que embora possa estar configurado o crime de fraude ao caráter competitivo, nem sempre haverá o dever de indenizar a Administração Pública.

Segundo o Ministro Rogério Schietti, ao contrário do que ocorre com o crime de dispensa irregular de licitação, a ideia de prejuízo à Administração Pública é irrelevante em julgamento quanto ao crime do artigo 337-F. Logo, poderá se consumar, inclusive, em eventual caso de benefício para a administração pública.

A síntese de seu raciocínio merece reprodução: Diversamente do que ocorre com o delito previsto no art. 89 da Lei n. 8.666/1993, o art. 90 desta lei não demanda a ocorrência de prejuízo econômico para o poder público, haja vista que o dano se revela pela simples quebra do caráter competitivo entre os licitantes interessados em contratar, ocasionada com a frustração ou com a fraude no procedimento licitatório. De fato, a ideia de vinculação de prejuízo à Administração Pública é irrelevante, na medida em que o crime pode se perfectibilizar mesmo que haja benefício financeiro da Administração Pública. (REsp n. 1.484.415/DF, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 22/2/2016).

Compreende-se, portanto, que o legislador buscou proteger por meio deste tipo penal o caráter competitivo entre os licitantes interessados em contratar, punindo aquele que frustrar ou fraudar tal característica essencial da licitação, independentemente do efeito patrimonial disso. Tal entendimento evidência o descolamento entre a efetiva prestação do serviço e a configuração do crime. Em outras palavras, prestar o serviço não afasta mais o processo criminal e eventual condenação pela fraude ao caráter competitivo da licitação.

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